Pericias > Pericias Psicologicas 8 - Uma pericia escandalosa e confrangedora

A história que se segue merece uma grande compaixão e consideração por este rapaz. O Pedro C. é daqueles rapazes de quem se fica com pena, com vontade de ajudar.

 

Tem o nome da minha filha Marta tatuado no corpo, diz que efectuou a tatuagem já no estabelecimento prisional, porque gosta muito dela. Diz que conheceu a Marta quando ela tinha 18/19 anos: "ela na altura era solteira, eu tinha o telemóvel dela. Eu gostei muito dela e fiquei apaixonado por ela." (O que é obviamente mentira!)

 

Enviou para o Tribunal, várias cartas para a Dr.ª Ana Peres, para o Sr. Procurador, para mim, para a Raquel (minha ex-mulher), para o Dr. Ricardo Sá Fernandes e até para a mulher deste. Toda a gente recebeu cartas.

 

Cartas completamente fantasiosas mas com uma preocupação: restabelecer a verdade sobre a casa de Elvas, e ajudar uma pessoa que não estava lá em Elvas, que era eu. Todos os outros estavam, e mais alguns, mas eu não estava em Elvas.

 

Para perceber, tem de ver os desenhos do Pedro C. Note-se que a fachada da casa de Elvas não é mais do que a cópia da fotografia que o Correio da Manhã publicou com o título de "A Casa das Orgias".

 

 

Quanto aos personagens na casa de Elvas, é assim que Pedro C. As descreve e identifica:


 

O Dr. Ricardo Sá Fernandes fez, nas alegações finais, um retrato bem claro:

 

"Ele mete todas as pessoas neste filme: a Dr.ª Catalina, o Pedro Namora, o Sr. Embaixador, Ana Paula Valente, o Hugo Marçal, o Herman José, o Tubarão, que ele diz que é o doutor Ferreira Diniz, o Francisco Alves, o arqueólogo submarino, o Manuel Abrantes, a D .Gertrudes, o Chalana, o Carlos Manuel, a Fernanda Teresa, o Paulo Pedroso, o Sá Leão, o Joel, que como se sabe um nome fictício e muitos outros.

 

As pessoas que aparecem na televisão, fazem parte da história que este rapaz construiu - peço desculpa pelo texto que se segue mas acho importante terem uma noção do que aqui se fala:

 

"(..,) lembro-me de uma monitora, a Ana Paula Valente, trazia a uma coisa tipo algemas e outra para tapar os olhos, algemavam e depois começavam a abusar de nós. O Sá Leão só filmava, depois entregava as cassetes ao Abrantes que era  o Provedor. A Ana Paula, pedia para lhe enfiarem o respectivo objecto onde calhava, era no rabo na boca, punha iogurte lambia depois pedia para que a gente a masturbasse. Às vezes apareciam pessoas que não conhecia, um Senhor com um sinal na cara, não me lembro do nome, ele veste-se de policia é actor aparece na televisão, um Senhor de bigode, eles davam nomes sem ser verdadeiros, o Senhor de bigode seria o Chalana, o adjunto do Benfica. Lembro-me bem onde fica a vivenda é na rua Domingos Lavadinho N.º 24, lembro-me bem da rua da saída, eles paravam nas bombas, o Bibi telefonava do Ericsson dizia que a gente estava a chegar, depois aparecia o tio Rito, que era o nome de código dele, até me deu um fato todo preto, uma camisa azul da Quebramar e uma gravata, sapatos pretos, e aparecia o Ferrari, a alcunha dele era o tubarão por ser forte. A D. Gertrudes também mexia no nosso sexo, ele pedia para a lamber a D. Gertrudes, dizia olha que pilinha tão pequenina e tão engraçada depois a Ana Paula fazia o resto, começava a mexer, chamava o Bibi (...)" etc., etc., etc., etc.

 

Enfim, é um cenário destes por várias páginas, isto desenrola-se por umas 6 páginas, onde naturalmente acaba por me envolver também."

 

Pedro C. foi submetido a perícias psicológicas.

 

Volto a citar Ricardo Sá Fernandes nas suas alegações finais ao referir-se a este episódio:

 

"Sr.ª Doutora esta é uma, é uma história muito, enfim, muito compungente e que merece uma grande compaixão e consideração por este rapaz.

 

Mas este rapaz que disse o que disse, ao Instituto de Medicina Legal, o Instituto de Medicina Legal concluiu da seguinte maneira: as descrições efectuadas sobre a vivência de várias situações de natureza sexualmente abusiva enquanto permaneceu institucionalizado na Casa Pia, preenchem vários critérios clínicos a serem tidos me consideração pelo tribunal, aquando da avaliação da credibilidade nomeadamente estrutura lógica, elaboração não estruturada, quantidade de detalhes, contextualização, descrição das interacções, reprodução das conversações detalhes inusuais, detalhes supérfluos, correcções espontâneas e admissão de falhas de memórias. Salienta-se ainda a autenticidade das emoções que acompanham os relatos, e lhe conferem uma dimensão de experiências vivenciadas. Considera que tem capacidades cognitivas para testemunhar em tribunal, compreende aquilo que lhe é perguntado, e consegue elaborar uma resposta coerente. Sr.ª Doutora fica-se muito assustado quando se lê este relatório do Instituto de Medicina Legal, ainda por cima porque este é um relatório da perita Rute Agulhas e é também um relatório do psiquiatra que também diz a mesma coisa, mais ou menos. O examinado apresenta um quadro de atraso mental de grau ligeiro, existe um funcionamento intelectual nos limites inferiores do normal, mas com dificuldades de funcionamento adaptativo esta problemática mais do que resultante de anomalia biológica surge compreensível no contexto da sua história pessoal. Não se apura presença de sintomatologia psiquiátrica grave ou aguda, não se apura presença de sintomas psicóticos como delírios ou alucinações. O examinado refere algum receio com a sua segurança, o que se admite em conformidade no contexto situacional em que se encontra fase ao processo em causa com contornos mediáticos, sendo que mantém vontade de depor.

 

Que em 2007, Instituto de Medicina Legal, o psiquiatra e psicóloga tenham dito, tenham tido o atrevimento de escrever sobre este rapaz o que aqui está, aparentemente à luz dos melhores critérios porque, Sr.ª Doutora, ele diz muitos pormenores muitas coisas, mas nada disso... quer dizer qualquer pessoa para fazer uma perícia sobre este rapaz, que viria depor neste processo tinha que estar minimamente integrado no que é este processo, perceber, de uma forma óbvia, a completa fantasia inconsciente, esta sim, deste rapaz. O enorme sofrimento que este rapaz tem, a enorme compaixão que ele merece, a enorme ajuda de que ele carece. Pois o que estes dois Senhores disseram, é que não senhora, ele tem uns problemas, tem um pequeno atraso, mas que preenche os requisitos todos e tal, os relatos são coerentes e, fica-se estupefacto e fica-se muito avisado quanto ao que são perícias, muito avisado. E fica-se também, muito consciente da necessidade que em Portugal existe de rapidamente o Estado fazer uma intervenção na medicina forense porque isto é ofensivo para as pessoas, é ofensivo para a dignidade das instituições, e é perigoso para a saúde e para a liberdade das pessoas."

 

***

 

Uma nota final:

O Procurador João Aibéo, teve um almoço com este rapaz antes dele depor.. Ouviu-lhe a história mas não sei o que lhe terá dito. Sei que o Dr. Aibéo insistiu em levar este rapaz a Tribunal numa atitude para a qual só encontro uma definição: "Tudo o que vem à rede é peixe". Talvez contasse que em Tribunal, Pedro C. acabasse por me incriminar. Não foi o que aconteceu. No final da audiência, Pedro C. Fez questão de entregar ao Tribunal um documento: era um retrato que ele desenhou de mim, com o pedido par que o Tribunal mo entregasse.

E na audiência de Julgamento, só o Dr. Aibéo interrogou Pedro C. A seguir a ele, o Dr. José António Barreiros, na altura mais um dos vários advogados que a Casa Pia foi tendo, depois de uma ou duas perguntas, teve pena do rapaz e solicitou a interrupção da audição, requerendo que Pedro C. fosse sujeito a uma perícia. Todos os Advogados de defesa concordaram. Era demasiado penoso assistir àquele depoimento.

Prevaleceu o bom senso dos Advogados que não entraram no jogo do Ministério Público.

Fez-se a perícia, analisada acima. Pedro C. Nunca mais voltou a Tribunal como testemunha.

Apareceu muitas vezes a assistir ao Julgamento. Sempre que conseguiu chegar à fala comigo só me dizia: "Sr Carlos Cruz: fui chamado à Judiciária pelo Inspector (cada dia era um nome diferente) que quer que eu acuse o sr Carlos Cruz. Eu disse que não o fazia".

Pois é esta mente que os psicólogos-peritos do IML consideraram credível!!!