> Acórdão da Relação

O acórdão do Tribunal da Relação é constituído por 3374 páginas das quais cerca de 1700 são a sentença da primeira Instância, as restantes respondem a diversos recursos dos arguidos. No que se refere a mim ocupa apenas 13 páginas.

A fls. 3211 e 3212 invoca uma razão de natureza processual para se negar a apreciar o recurso limitando-se a confirmar a pena relativa aos crimes supostamente cometidos na Avenida das Forças Armadas.

 Pode aceder ao Acórdão na íntegra clicando aqui.

 Pode aceder às páginas que me dizem respeito clicando aqui.

 Pode aceder a mais informação sobre a Av. das Forças Armadas clicando aqui.

No que diz respeito a crimes alegadamente praticados em Elvas, o Acórdão considerou o julgamento nulo e mandou repeti-lo.

O argumento processual utilizado para não apreciar o meu recurso consiste em afirmar que o mesmo se trata de uma apreciação genérica da matéria de facto e não "ponto por ponto". O colectivo diz que as alegações e recursos do Ricardo Sa Fernandes são vagas. Confirme abaixo.

 Pode aceder às alegações do Ricardo Sá Fernandes clicando aqui.

É evidente que a apreciação do meu recurso poderia colocar em causa a decisão de 1ª instância e a "credibilidade" da "justiça". A bem da Paz Social foi o argumento utilizado pelo Ministério Publico e também pelo Presidente do Tribunal da Relação.

Fui condenado porque os juizes dizem terem encontrado uma "Ressonância da Verdade" nas versões de testemunhos que os próprios juízes reconhecem completamente contraditórios.

O Tribunal da Relação sanciona a utilização da "Ressonância da Verdade" dizendo que: "é certo que, nunca encontrámos a expressão "ressonância de verdade" usada na jurisprudência" mas "é perfeitamente entendível e mais do que isso, adequado".

Ou seja: em Portugal ser inocente não basta, por mais provas que apresente a seu favor, os juízes, irresponsáveis, podem simplesmente invocar uma "ressonância" para condenar quem quer que seja do que quer que seja.

Pode recorrer para onde quiser, que perde tempo, dinheiro e fé.

Recorde-se que fui detido, interrogado (onze questões a que respondi), preso, não sendo informado do quê, quando, onde e quem, proibido de me defender publicamente por uma ministra. Além de tudo isto, o Juiz de Instrução (não natural) não me quis ouvir.

Foram ocultados cruzamentos telefónicos, manuscritos de Francisco Guerra, testemunhos e relatórios.

Foram ignoradas contradições insanáveis e inúmeras imprecisões, foram ditas muitas mentiras e nada se investigou!

Quando o mesmo Juiz de Instrução foi finalmente obrigado a ouvir-me:

- apresentei milhares documentos oficiais;

- em Tribunal e em público, sempre respondi a todas as questões de juízes, advogados, jornalistas e público em geral;

- não conhecia nenhum dos arguidos, ninguém me viu com algum deles;

- não conhecia nenhum dos assistentes, ninguém me viu com eles;

- nunca estive em nenhum dos locais onde me acusam, nunca ninguém lá me viu;

- provo que estava noutros locais. Os documentos que entreguei ao processo comprovam-no;

- chamei toda a gente que pudesse ajudar à descoberta da verdade: colegas, vizinhos, comerciantes, policias, etc;

- depois de 4 anos e meio de julgamento, depois das alegações e terem sido apresentadas provas, o Ministério Público pediu 43 alterações à acusação (datas, lugares, circunstâncias), sem qualquer fundamentação.

Mesmo reconhecendo contradições graves, hiatos e imprecisões, condenam-me porque dizem ter encontrado uma Ressonância da Verdade?! 

 Pode aceder ao Acórdão da 1ª Instância e sua análise clicando aqui.

O Tribunal da Relação decide negar os pedidos de Carlos Silvino, Ilídio Marques e Ricardo Oliveira para serem ouvidos depois de terem dado entrevistas em que não só negavam os seus depoimentos prestados em Tribunal como colocavam em cheque toda a investigação.

 Pode aceder à entrevista de Carlos Silvino clicando aqui.

 Pode aceder à entrevista de Ilídio Marques clicando aqui.

 Pode aceder à entrevista de Ricardo Oliveira clicando aqui.

Pode aceder à entrevista de Pedro Lemos clicando aqui.

Em Portugal estar inocente não é defesa.

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 Rui Rangel, Juiz Desembargador

A justiça tem estado, pelas piores razões, no centro das discussões públicas. O que se discute não é a justiça enquanto virtude moral, enquanto sistema pacificador e ordenador do conflito social. Discute-se a caricatura de justiça que vamos tendo. Hoje é motivo de anedotas, muito por culpa dos casos mediáticos mal resolvidos.

Nota: o sublinhado é de minha autoria

A investigação criminal feita pelo MP e pelas polícias, nos casos que envolve gente poderosa, tem arrastado a justiça para a maior crise de credibilidade e de prestígio de que há memória. É preciso separar as águas. Quando se fala de justiça, o que está em causa é o tribunal e o juiz. O MP é um auxiliar da justiça, como são as polícias e os advogados. Por isso o MP nem sequer devia estar fisicamente no tribunal, partilhando gabinetes ao lado do juiz. Devia vir a tribunal como vem o advogado. E é esta confusão que paira na cabeça das pessoas, misturando tudo, que faz com que ninguém já acredite na justiça e na busca da verdade.

O grande problema está no modelo de investigação criminal que existe e num MP que não foi capaz de se organizar e de assumir em pleno as suas competências. E está também, muitas vezes, na falta de vontade e de firmeza de quem dirige as investigações. Não sei se há pressões políticas ou hierárquicas. O que sei é que as coisas falham sempre, demora-se muito tempo a investigar e a montanha pare sempre o mesmo rato. Se o rato não desconfia, desconfiam os portugueses. Diz o Povo que há promiscuidade política na actividade investigatória do MP e na sua cadeia hierárquica, que gosta de ter poder só para manter gente poderosa em sentido, mas sem resultados. Tenho para mim que o MP vive a maior crise de credibilidade de sempre. E não é por causa da sua falta de autonomia, mas por razões da sua organização interna, das suas capelinhas e das partilhas de poder no seu funcionamento.

É sempre bom manter a investigação por muitos anos, em lume brando, porque o homem vive de aparências e dá a impressão de que se está a trabalhar e a investigar a sério. Pura ilusão! Uns querem mais resultados e mais eficácia, mas não podem porque não têm poder, outros têm poder mas não querem incomodar os poderosos. É o próprio MP que pode estar a matar a sua autonomia e a dar motivos para que o poder político cavalgue sobre o seu estatuto orgânico, politizando a sua função. Sempre fui adepto de um outro modelo de investigação assente na figura do juiz de instrução criminal. Mas não foi este o caminho escolhido pelo legislador. Os resultados estão à vista.

Com a autonomia que existe, das mais perfeitas na Europa, o MP tinha a obrigação de produzir outros resultados. E não adianta pedir mais autonomia e outra disciplina na cadeia hierárquica, tendo sob tutela casos mediáticos com uma investigação que envergonha Portugal. Mais autonomia e mais poder hierárquico só fazem sentido para servir melhor a justiça e os cidadãos. Por causa das trapalhadas do MP, não é justo que a justiça, incluindo os juízes, pague a factura, só porque tudo se chama justiça.

 

 

 Maria de Fátima Mata-Mouros - Juiz de direito - artigo de opinião no DN

"Há coincidências incríveis. Estava eu absorvida na leitura de uma interessante conferência intitulada A Reforma do Processo Penal, quando me anunciaram a apresentação do anteprojecto de revisão de mais este código. É claro que parei a leitura e fui ler o projecto.

Li-o e voltei à conferência que encontrei na compilação referente ao II Congresso de Processo Penal. A tal, cuja leitura me despertara a atenção porque continha um diagnóstico particularmente certeiro sobre a doença de que enferma o nosso procedimento criminal: o "dominó punitivo", como o autor da conferência lhe chamou. A sua origem detecta-se no uso e abuso da delegação genérica de poderes do Ministério Público à Polícia para a realização dos inquéritos, o que transforma esta última no seu efectivo titular. Resultado: os procuradores tendem a concordar com os meios de obtenção de prova e as medidas de coacção propostas pelos investigadores policiais; o juiz, igualmente alheado do inquérito, defere o que lhe é requerido, mesmo que o requerido seja uma prisão preventiva; o Ministério Público, encorajado pela prisão decretada pelo juiz, deduz acusação; o juiz de instrução é "convidado" a pronunciar o arguido, por só esta decisão instrutória ser irrecorrível e, finalmente, ciente dos vários despachos anteriores a reconhecer indícios fortes nos autos, o juiz de julgamento esquece a presunção de inocência. "No essencial, a crise do processo penal português é uma crise de identidade dos sujeitos" e a lei, apesar de "boa" - continuo a ater-me ao pensamento do mesmo autor -, "carece de revisão e mesmo de reforma. (...)"