> Pedro Lemos denuncia Procurador

Foi o espanto total naquele dia na sala de audiências. A testemunha Pedro Lemos, talvez por ingenuidade mas seguramente de forma inadvertida, revelou  que, entre o depoimento prestado na Policia Judiciária e aquele dia no Tribunal, se tinha encontrado no Algarve com o Procurador João Aibéo, aquando das férias deste e a pedido do mesmo.

Agora Pedro Lemos, em entrevista ao jornalista Carlos Tomás conta a história desse encontro e o conteúdo dessa conversa. Ao ouvi-lo hoje, o espanto é ainda maior, perante a gravidade do que ele afirma sobre a conduta do procurador João Aibéo.

   

A testemunha Pedro Lemos aparece neste Processo através de um depoimento que prestou na Policia Judiciária a 2 de Outubro de 2003.

Nesse depoimento diz que foi vítima de múltiplos abusos enquanto estudava na Casa Pia de Lisboa mas por parte de funcionários da própria Casa Pia. Não há a mínima referência ao meu nome ou à minha pessoa.

Pedro Lemos também já tinha feito uma denúncia na PSP de Tavira onde também não há a mínima referência à minha pessoa.

Foi, por isso, com espanto que em 2006 - quase três anos mais tarde - em pleno Tribunal oiço Pedro Lemos falar no meu nome:

Procurador - Sr. Pedro Lemos dessas quatro vezes que foi levado à casa de Colares, quem foi, ou que foram as pessoas que abusaram de si?

Pedro Lemos - Sr. Carlos Silvino, Sr. Jorge Rito e Sr. Carlos Cruz

Procurador - De todas as vezes, e pense bem, de todas as vezes que foi a essa casa, estavam lá sempre essas três pessoas?

Pedro Lemos - O Sr. Jorge Rito e o Sr. Carlos Cruz sim. E o Carlos Silvino também.

Procurador - Portanto estavam lá sempre.

Pedro Lemos - Sim, sim não sei se uma combinação qualquer

Procurador - Não sabe se

Pedro Lemos - Se era já propositado, se não sei

Procurador - Quando o Sr. lá chegava, as pessoas já lá estavam, ou só chegavam depois?

Pedro Lemos - Chegavam depois

Procurador - O Sr. quando ia para lá, esqueça isso, o que é que acontecia exactamente, quando o Sr. diz que era abusado, isso quer dizer exactamente o quê?

Pedro Lemos - Era muitos miminhos, digamos assim, vou tratar disso por outras palavras, da parte deles, muitos miminhos, muitos carinhos, muitas ofertas, como por exemplo camisolas do Benfica, como roupas, dinheiro

Procurador - Quem é que lhe oferecia?

Pedro Lemos - O Sr. Jorge Rito, o Sr. Carlos Cruz

Procurador - Quem é que lhe ofereceu as camisolas do Benfica?

Pedro Lemos - Fez-me a oferta o Sr. Carlos Cruz

Procurador - (....) o Sr. sabia que eram o Sr. Jorge Rito e o Sr. Carlos Cruz?

Pedro Lemos - O Sr. Jorge Rito, sinceramente não conhecia nem por nome, nem que era uma figura social aí, e o Sr. Carlos Cruz conhecia aí da televisão, basicamente

Procurador - Mas não sabia o nome

Pedro Lemos - Era tão novo, isso não posso responder, em princípio, sabia que era uma figura pública, era só

Procurador - Portanto olhou para aquela cara e conheceu aquela cara como sendo alguém da televisão. É isso?

Pedro Lemos - Sim. Porque é normal por coincidência o meu pai também via o um, dois, três, na altura e deu logo para identificar essa pessoa

Procurador - Então quando é que o Sr. pôs um nome naquele rosto? Ou seja, quando é que o Sr. soube que aquela pessoa que estava em Colares, e que o Sr. diz ter reconhecido como uma pessoa que apareceu, que aparecia na televisão, quando é que soube que essa pessoa se chamava Carlos Cruz?

Pedro Lemos - Por conversas, das pessoas lá dentro, na casa, foi assim

Procurador - Lá dentro, ainda, da casa?

Pedro Lemos - Sim, sim, sim

(...)

Juíza - Sr. Pedro Lemos continua advertido do dever de falar com verdade está sob juramento portanto o dever se falar com verdade a tudo o que lhe for perguntado. Compreende?

Pedro Lemos - Sim sim

Juíza - O Sr. referiu no dia de ontem que tinha que falou com o Sr. Procurador. O Sr. Procurador que estava aqui presente, diz que falou na altura que falou com o Sr. Procurador. Quando é que falou com o Sr. Procurador, onde falou e sobre o que falou? E que Procurador, exacto, que se estava a referir embora ontem já tenha identificado.

Pedro Lemos - Onde falei foi nas Cabanas, o que falei sobre o processo que está a ser falado neste tribunal, e

Juíza - E quando é falou?

Pedro Lemos - Foi em Agosto, salvo erro, Agosto ou em Setembro ou em Julho não sei, foi no verão já

(...)

Juíza - Foi a primeira vez que falou desses factos do Sr. Carlos Silvino, do Sr. Jorge Leitão Ritto e do Sr. Carlos Pereira Cruz?

Pedro Lemos - Se foi a primeira vez que eu falei?

Juíza - Sim

Pedro Lemos - Sim sim foi a primeira vez com o Sr. Procurador sim

Juíza - Foi a primeira vez que falou ao Sr. Procurador. E tirando a Policia Judiciaria falou com mais alguém?

Pedro Lemos - Não não falei a mais ninguém

Juíza - E porque é que falou ao Sr. Procurador?

Pedro Lemos - Porque ...porque não contei tudo aos Srs. Agentes da Policia Judiciaria porque eu na altura estava-me a sentir um bocado não é surpreso, um bocado desconfiado com a situação e era uma situação um bocado complicada e eu não contei não contei realmente o que se passou aos agentes da policia judiciaria

Juíza - Eu estou a falar do Sr. Procurador. Porque é que decidiu contar ao Sr. Procurador

Pedro Lemos - Transmitiu-me confiança, segurança, não sei, foi esse sentimento que eu tive

Juiz - De quem é que partiu a iniciativa dessa conversa?

Pedro Lemos - De quem partiu a iniciativa? Foi minha

Juiz - Foi sua?

Pedro Lemos - A iniciativa desta conversa foi minha

Juiz - Da conversa com o Sr. Procurador

Pedro Lemos - Foi minha foi minha. Pronto o Sr. Procurador contactou-me

Juiz - Contactou como?

Pedro Lemos - Por telefone

Juiz - Sim

Pedro Lemos - Por telefone e a gente combinou nas Pedras da Rainha onde a gente estava e aí conversamos e eu contei tudo o que se passou comigo

Juiz - Sim. O Sr. Procurador telefonou-lhe e disse que queria falar consigo por alguma coisa

Pedro Lemos - Para contar tudo o que se passou comigo

Juiz - Para

Pedro Lemos - Foi contar tudo o que se passou comigo

Juiz - Contar tudo ao Sr. Procurador ou no Tribunal?

Pedro Lemos - Ao Sr. Procurador e agora no Tribunal

(...)

Juiz - O Sr. já tinha sido convocado para vir a Tribunal

Pedro Lemos - Quando eu falhei sim Sra.

Juíza - E o que é que aconteceu dessa vez?

Pedro Lemos - Dessa vez? Não tive cabeça, psicologicamente não estava bem.

(...)

Mª João Costa - Se o Sr. se essa conversa teve lugar antes ou depois da notificação para esta data de audiência?

Pedro Lemos - Ora se fui notificado para o dia 19 de Julho não é?

Juíza - Não não para hoje para o dia de ontem

Pedro Lemos - Ah se eu falei com alguém?

Juíza - Não não se essa conversa que teve com o Sr. Procurador se foi antes do Sr. saber que vinha outra vez a Tribunal, que lhe tinha sido marcada outra data, ou se foi depois. É isso Sr.ª Dr.ª?

Pedro Lemos - Foi muito antes que eu depois falhei à primeira audiência foi muito antes

Juíza - Não. Quando é que o Sr. soube que tinha que vir ao Tribunal no dia de ontem?

Pedro Lemos - Fui comunicado pelo Sr. Carlos

Juíza - E lembra-se quando é que foi isso?

Pedro Lemos - Foi antes de ontem, antes de ontem que tinha de vir hoje sim

Mª João Costa - Então só mais esta pergunta: quem é o Sr. Carlos?

Juíza - Já disse ontem. É da provedoria

Pedro Lemos - O Sr. Carlos é da Provedoria é o motorista que me foi levar

Mª João Costa - está a referir-se ao motorista da Dr.ª Catalina?

Juíza - Sabe se é motorista da Sr.ª Dr.ª Catalina?

Pedro Lemos - Sim. Ele é que me foi buscar.

(...)

Juiz - Nessa altura também foi alguém algum motorista da Casa Pia buscá-lo ou

Pedro Lemos - Não não não fui eu que vim de transportes para Lisboa

Juiz - O Sr. veio de transportes?

Pedro Lemos - Exactamente

Juiz - Então veio para Lisboa e não veio ao Tribunal?

Pedro Lemos - Fui a Lisboa, fiquei em casa do meu pai, e no outro dia era para vir a Tribunal , não sei se era de manhã, era para vir a Tribunal de manhã salvo erro, da parte da manhã e andei aí por Lisboa e depois fui-me embora, nem vim
Juiz - Então o Sr. veio do Algarve a Lisboa para vir ao Tribunal e depois acabou por não vir. Mas porquê? Alguém lhe disse para não vir?

Pedro Lemos - Não não ninguém me disse nada. Eu não me estava sentir bem psicologicamente e não vim. Andei por aí por Lisboa. Apanhei o autocarro e fui-me embora.

(...)

J. Maria Martins - Sr. Pedro Lemos diga-me lá o sr. tinha o número de telefone do Sr. Procurador?

Pedro Lemos - Eu não. Não tinha

J. Maria Martins - Não conhecia o Sr. Procurador?

Pedro Lemos - Não não

J. Maria Martins - O Sr. Procurador Aibéo é aquele Sr. que está ali que falou consigo?

Pedro Lemos - Sim

J. Maria Martins - Foi o Sr. Procurador que lhe ligou?

Pedro Lemos - Correcto

J. Maria Martins - Ele quando lhe ligou disse o quê?

Pedro Lemos - Que era uma testemunha do Ministério Público, e pronto foi uma conversa e depois combinamos o encontro como o Sr. Procurador ia lá para

J. Maria Martins - Foi o Sr. Procurador que lhe disse que queria falar consigo? Uma vez que foi ele que lhe ligou ou foi o sr. que disse que queria falar com o Sr. Procurador?

Pedro Lemos - A gente...não me recordo bem, não quero estar aqui a dizer que eu disse uma coisa e não disse, é assim o Sr. Procurador telefonou-me, marcou-se uma conversa e como o Sr. Procurador ia passar férias lá em baixo, marcou-se um encontro ali na zona onde eu moro e trabalho, para se conversar um bocado

J. Maria Martins - Portanto a iniciativa para você falar com o Sr. Procurador foi dele. Foi ele que lhe ligou a si. Não foi

Pedro Lemos - Ahn digamos que não foi por iniciativa nem nada

J. Maria Martins - Escute quem é que fez o telefonema? Não foi o Sr. Procurador para si?

Pedro Lemos - Sim sim

J. Maria Martins - Pronto. E então combinou encontrar-se consigo lá em baixo no Algarve. É isso?

Pedro Lemos - Exacto

(...)

Juiz - Oh Sr. Pedro Lemos vamos lá a ver. Quando alguém nos telefona e concordamos em falar com a pessoa, há-de haver um assunto para falar. Ao telefone o que é que o Sr. Procurador lhe disse que iam falar? Lembra-se?

Pedro Lemos - Não não me recordo

Juiz - Não se recorda? Então depois de decorrida toda a conversa qual foi o sentido que o Sr. ficou da intenção do Sr. Procurador? Porque é que foi falar consigo? Qual era a razão mesmo razão para falar consigo? Tem de haver uma razão para falar consigo

Pedro Lemos - Acho que a razão

Juiz - Era o quê a razão?

Pedro Lemos - Não lhe consigo explicar bem a essa pergunta.

Juiz - A razão era para o Sr. lhe contar o que se tinha passado?

Pedro Lemos - Não, era eu é que contei, eu é que contei

Juiz - A razão não era para o Sr. contar ou era para contar?

Pedro Lemos - Não lhe posso responder a essa pergunta não consigo responder a essa pergunta

(...)

J. Maria Martins - Sr. Pedro Lemos o Sr. Procurador, que é para nós não ficarmos aqui, o Sr. Procurador quando lá chegou entregou-lhe alguma notificação e disse assim: o Sr. tem de que ir ao Tribunal no dia 21 de Setembro?

Pedro Lemos - Não não

J. Maria Martins - Ele não foi lá para o notificar para o Sr. vir aqui ao Tribunal pois não?

Pedro Lemos - Não, não, a data ainda não tinha sido marcada

J. Maria Martins - Pronto então a conversa foi sobre o processo. É isto que o Sr. já disse há pouco, que já referiu varias vezes

Pedro Lemos - Exacto

J. Maria Martins - Tinha dito na polícia judiciária o que disse depois. Foi isto

Procurador - Oponho-me a esta maneira de fazer perguntas. Isto é por na boca da testemunha pergunta a respostas

Juíza - Já está gravado o que o Sr. disse o que falou e mesmo a questão da policia judiciaria

J. Maria Martins - Srª. Drª. ninguém me vai convencer que o Sr. Procurador foi lá a baixo para notificar a testemunha e é a ideia que querem passar ...em causa aqui que isto vai para o Tribunal Europeu ...não aceito ... ser espezinhado

O leitor julgará. Eu limito-me a perguntar se é ou não legítimo supor que outras acções destas poderão ter ocorrido ao longo de todo o Processo.