Inocente para além de qualquer dúvida Neste livro, o leitor encontra a prova irrefutável do que sempre afirmei: estive, estou e estarei sempre inocente! De forma documentada e sustentada. Com dados a que nunca teve acesso ou que lhe foram dados a conhecer quase sempre de forma deturpada ou manipulada. Conheça a investigação e os seus procedimentos. Confirme o que dizem testemunhas, juizes, procuradores, assistentes e jornalistas. |
As Outras Vitimas - Relatos Inéditos das Vidas Atingidas pelo Processo Casa Pia A Marta reuniu depoimentos do sofrimento vivido, ao longo destes quase nove anos, pelas pessoas ligadas a Carlos Cruz, um dos principais arguidos do processo Casa Pia, pelo simples facto de fazerem parte da sua vida e de nunca terem deixado de acreditar na sua inocência. Marluce, Raquel, Maria João Fialho Gouveia, Ricardo Sá Fernandes entre outros, deixam neste livro o seu testemunho destes conturbados anos. |
Carlos Cruz - As Grades do Sofrimento A primeira parte deste livro, escrita pelo jornalista Carlos Tomás relata o historial do escândalo da Casa Pia desde a sua divulgação até às primeiras diligências instrutórias. A segunda parte, escrita pela Marluce revela o drama, muitas vezes ignorado, da família de Carlos Cruz. Os sentimentos, as angústias, as emoções e também a esperança das pessoas mais próximas, perante a tragédia que, de repente, atingiu as suas vidas. |
Sozinha - O Conto de Fadas que se Tornou num Pesadelo A Raquel escreve sobre a sua vida e a sua história com Carlos Cruz e tudo o que se sucedeu após ter rebentado o escândalo. Em primeira mão relata tudo o que sentiu desde o casamento até ao desespero que foi ver-se associada a esta história e ainda por cima com uma filha recém nascida para criar. |
Carlos Cruz - Preso 374 Carlos Cruz dá-nos a ler pedaços de um farto diário que foi escrevendo ao longo de 458 dias de prisão preventiva. Revela-nos a solidão da cela onde vivia os seus diálogos interiores, fala-nos de sentimentos, pensamentos e emoções. Mas também o mundo mais vasto da prisão, do sistema prisional, dos guardas e dos mais variados tipos de reclusos e de crimes. Cita leituras e fragmentos de autores que o inspiraram para reflectir sobre a sua situação, a vida, a justiça e as injustiças. Carlos Cruz relacionando as várias fases do processo com os dias que ia vivendo, revela ainda conteúdos dos autos que nunca vieram a público e que, segundo a expressão do autor "foram sistematicamente escondidos por aquela Comunicação Social que escolheu a barricada da acusação." |
Sabão Azul e Branco - A Maior Fraude Judicial de Sempre No âmbito do designado Processo Casa Pia, os portugueses só sabem o que lhes foi dado a conhecer pela comunicação social e isso terá bastado para ajuizarem de facto e até de direito sobre pessoas, procedimentos e factos. Hugo Marçal revela os bastidores e contornos do escândalo provavelmente desconhecidos pela grande maioria dos leitores. |
Casa Pia - A construção de uma caça às bruxas moderna Este livro de Richard Webster trata do maior e mais duradouro pânico sobre uma rede de pedofilia que até hoje aconteceu, e o que talvez tenha causado maiores danos às instituições do país onde teve lugar - Portugal. O escândalo envolveu alegações de que políticos importantes de esquerda, além de um advogado, um médico, um embaixador e o apresentador de televisão mais famoso de Portugal, Carlos Cruz, eram membros de uma conspiração secreta de pedófilos. Esta rede de pedofilia supostamente abusava de menores ao cuidado do Estado. |
A Mais Cruel Das Tiranias Prémio Pulitzer 2001, esta obra reflecte o trabalho de investigação desempenhado por uma das mais conceituadas jornalistas norte-americanas, para o qual ouviu centenas de testemunhas e especialistas acerca dos perigos criados pelos falsos testemunhos e acusações não fundamentadas. O resultado dessa investigação acabou por servir de base a toda a imprensa norte-americana. |
Eu Menti "Chamo-me Virginie Madeira. Tenho vinte e um anos. Sou estudante Quando tinha catorze anos, disse a uma colega de turma que o meu pai tinha «abusado» de mim. Não era verdade. Escrevo este livro para contar como, na escola, no Comissariado da Polícia, no Palácio da Justiça, no lar de infância, na minha família de acolhimento, ninguém pensou que tudo não passava de uma mentira. O meu pai foi condenado a doze anos de prisão. Hoje, gostaria que toda a gente saiba a verdade" |
.
Abaixo encontrará informações sobre as Actualizações do site.
"O GRANDE INIMIGO DA VERDADE É MUITAS VEZES NÃO A MENTIRA - DELIBERADA, ORGANIZADA E DESONESTA - MAS SIM O MITO, PERSISTENTE, PERSUASIVO E IRREALISTA. ACREDITAR EM MITOS PERMITE O CONFORTO DE TER OPINIÃO SEM O DESCONFORTO DE TER QUE PENSAR."
Jonh F. Kennedy
TOTAL AUSÊNCIA DE PROVA.
Castelo de cartas judicial
Em Fevereiro de 2001, a França acordava horrorizada para um caso de pedofilia que iria conduzir à detenção de 260 pessoas implicadas nos crimes de abuso e agressão sexual a menores e ao maior fiasco da justiça francesa que culminou a 24 de Abril de 2009 com a aplicação de uma "reprimenda" ao juiz que instruiu o caso.
O epicentro do escândalo situava-se, no norte de França, numa pequena cidade chamada Outreau, que no espaço de poucos meses foi varrida por um autêntico terramoto, naquele que ficou conhecido como o «caso Outreau».
A memória do caso de pedofilia, que colocou a vizinha Bélgica em comoção e que resultou na condenação a prisão perpétua do pedófilo e assassino Marc Dutroux, serviu de rastilho para dar amplitude ao processo francês, que começou com as denúncias dos três filhos de um casal do bairro popular Tour de Renard (em português, Torre do Zorro).
Myriam e Thierry Delay foram detidos depois de terem sido denunciados pelos filhos por alegados abusos sexuais cometidos durante cinco anos. Ao longo das inquirições, novos nomes foram agregados à lista de suspeitos - muitos pertenciam à mesma família das supostas vítimas - num efeito bola de neve que levou a imprensa a noticiar a implosão de uma grande quadrilha de pedófilos.
Ávida por fazer render o peixe, a imprensa agarrou-se ao processo, que o jornalista francês Gilles Balbastre classificou como "Chernobyl judiciário", e descreveu com insistência e abundância de pormenores os contornos da rede.
Um repórter da France 2, numa das muitas descrições dos factos, afirmou a 15 de Novembro de 2002 que "as quatro crianças foram violadas pelo pai, primeiramente, depois por pessoas próximas, alguns comerciantes do bairro. Os pais pagavam, desse modo, as suas dívidas".
O insuspeito Le Fígaro mencionou, sem hesitação, as profissões de alguns dos culpados, numa notícia publicada a 21 de Novembro de 2001, conforme elenca Gilles Balbastre: "São citados os nomes de um oficial de justiça e a sua esposa, de uma enfermeira escolar, de um padre operário, de um motorista de táxi que conduzia as pequenas vítimas a uma fazenda na Bélgica, próxima a Yprés, onde ocorriam noitadas especiais, gravadas por dois proprietários de uma sex shop de Ostende".
Nas dezenas de reportagens que diariamente alimentaram um caudal informativo dedicado ao caso de Outreau, os jornalistas chegam a estabelecer ligações com a rede de pedofilia do caso belga Dutroux, indo além das meras afinidades fonéticas.
Surgem testemunhas a credibilizar os factos, advogados a fazer confidências sobre crianças maltratadas e fontes, muitas fontes, umas identificadas, outras anónimas. Nos ecrãs de televisão aparecem os locais da tragédia: a fazenda frequentada por pedófilos belgas, onde as crianças "teriam sido violentadas e filmadas", com planos do proprietário, "um comerciante de animais que não mora no local", que gesticula apontando com o dedo o local da saída, numa atitude que os repórteres interpretam como suspeita e incriminatória; a sex shop, que nunca existiu, e o táxi que conduzia as crianças abusadas até à Bélgica.
Analistas debatem as razões do escândalo sem precedentes. Evocam o desemprego endémico em Nord-Pas-de Calais, uma das regiões mais pobres de França, com os maiores índices de mortalidade infantil, analfabetismo e alcoolismo, e tudo se conjuga para um rumo que acaba por ser, abruptamente, invertido com as declarações de Myriam Badaoui, mãe das três crianças e um dos pilares da acusação. A mulher declara ter mentido - "Eu sou uma doente e uma mentirosa. Menti sobre tudo" - e inocenta as primeiras 13 pessoas incriminadas pela justiça. Outras quatro, nas quais se incluem as principais testemunhas de acusação, são mais tarde inocentadas. Dois dias mais tarde, volta a acusá-las. E, a seguir, volta a inocentá-las num ziguezaguear que compromete irremediavelmente todo o processo e que não deixa outra alternativa ao juiz de instrução, Patrice Burgaud, que não seja a absolvição de todos os arguidos, à excepção de quatro (os que provocaram o escândalo).
A França voltava a ser sacudida, desta vez, pelo espanto que a monumental mentira provocava e que pôs em causa a justiça e os tribunais. O Presidente da República Nicolas Sarkozy recebeu os absolvidos e pediu desculpa em nome da França; o presidente da Assembleia Nacional, um antigo juiz de instrução, criou uma comissão parlamentar de inquérito e o país iniciou um debate sobre qual a magistratura que deseja.
A decisão do Conselho Superior da Magistratura de França, que no dia 24 de Abril de 2009 aplicou uma repreensão ao juiz por ter mandado para a prisão várias pessoas (uma delas suicidou-se na cadeia) com base em testemunhos falsos, causou nova polémica, com a opinião pública a considerar a sanção demasiado leve.
A imprensa afinou pelo mesmo diapasão, esquecendo-se da sua responsabilidade no caso ao servir diariamente mentiras dadas como verdade, factos não escrutinados que alimentaram uma opinião pública sedenta de justiça e pressionando, desta forma, um jovem juiz - que veio criticar quando o processo desmoronou - por não ter maturidade suficiente.
O processo Casa Pia assemelha-se cada vez mais ao caso Outreau. Várias testemunhas deram o dito por não dito e vieram afirmar, mais tarde, que mentiram. Em Fevereiro de 2011, Ilídio Marques, jovem vítima de abusos, deu uma entrevista ao Expresso, onde do seu testemunho inicial mantém apenas que foi vítima de abusos cometidos pelo "padrasto, por uma educadora da Casa Pia e por pessoas exteriores à instituição".
"Qualquer pessoa que leia o acórdão e o processo, e esse foi um dos motivos que me levaram a falar, vai reparar que 80% do que lá está é mentira", afirmou há um ano aquele que foi uma das testemunhas chave do processo e que numa entrevista ao semanário Expresso tenta "remediar" uma coisa que fez em miúdo: "Entrámos todos no mundo do vamos lá ver o que isto dá ou não dá. Somos putos não nos acontece nada...".
As vítimas da Casa Pia, segundo o testemunho do jovem, foram atirando nomes - os que "já tinham passado na televisão" - montando um circo judicial com a ajuda das televisões e dos jornais, perante o entusiasmo de uma multidão sedenta de espetáculo.
O Tribunal da Relação de Lisboa vem agora decretar a nulidade do acórdão na parte que diz respeito aos abusos cometidos na casa de Elvas, obrigando a que os crimes ali praticados tenham de ser julgados de novo em primeira instância, e, consequentemente, diminuiu a pena de alguns dos condenados.
O caso Outreau ruiu quando as cartas começaram a ser tiradas. O processo Casa Pia está cada vez mais instável. Entre um e outro há apenas uma diferença: O caso português partiu da existência de abusos, mas é hoje difícil distinguir o que é real neste castelo de cartas judicial.
Isabel Costa Bordalo,
Jornalista
3 de Fevereiro de 2012
1 - Não é porque Carlos Cruz proclama a sua inocência que o leitor deve pôr em causa a sentença que o condenou. No país da falta de vergonha há por aí muitos mentirosos contumazes. Convido, pois, o leitor a fazer por si o escrutínio dessa decisão.
2 - Peço ao leitor que se coloque no lugar do Carlos Cruz ou que, no lugar dele
ponha o pai, o marido, o irmão ou o amigo dilecto. Veja um homem de 61 anos,
com mulher e filhos, carreira profissional brilhante, reconhecimento social e
vida financeira desafogada. E veja o que dez anos de uma mentira fizeram dele:
um morto-vivo, a quem só não roubaram a dignidade porque não puderam.
Compreenda
então que a pedofilia é o mais horrendo dos crimes, mas uma falsa acusação de
pedofilia é a mais sinistra das calúnias.
3 - Avalie com os seus próprios olhos as peças fundamentais do processo:
I) Ouvidas cerca de 900 pessoas (1/3 delas arroladas pela acusação), ninguém viu ou suspeitou de qualquer ligação entre Carlos cruz e as vitimas, o angariador, os outros arguidos ou os locais dos abusos; cruzados milhões de registos telefónicos entre os agentes da suposta rede e vasculhados milhares de documentos, não se apurou qualquer conexão entre Carlos Cruz e aquelas pessoas;
II) Relativamente a Elvas, Cruz começou a ser acusado de um abuso num sábado de 1999, o que se provou ser impossível; seguiu-se nova acusação, agora reportada a um dia da semana (no período das aulas), demonstrado que nesse período - e durante mais de doze anos -, a dona da casa, como ama da Segurança Social, recebia bebés (e as famílias) no espaço onde se disse que o abuso teria ocorrido, Cruz foi absolvido; mas houve quem continuasse a dizer que teria praticado o crime noutro dia (não se sabe qual, nem como);
III) Relativamente à Av. Das Forças Armadas, os crimes teriam sido cometidos na casa de uma enfermeira, entrando os jovens pela porta de acesso a uma empresa comercial; ouvida a enfermeira, os donos e os empregados da empresa, a porteira e os habitantes e utentes do prédio, ninguém viu ou suspeitou de nada, não se apurando qualquer contacto entre Cruz, as vitimas, o angariador e as pessoas de tal prédio;
IV) Sobrando (para o Tribunal) a "ressonância da veracidade" (seja lá o que isso for) dos depoimentos de três jovens, ignoraram-se contradições que só se explicam se tais pessoas mentiram ou efabularam; durante o julgamento as inconsistências foram ao extremo de, numa sessão, um jovem assegurar que Cruz não abusou dele para, uns dias depois, vir dizer que, afinal, foi por ele abusado;
V) Mais grave é que toda a "tramóia" da fantasia mentirosa, construída em intenso convívio com polícias e jornalistas, pode ser provada pela sequência das declarações prestadas em inquérito, que foram sendo ajustadas até justificarem a acusação, as quais, porém, não puderam ser utilizadas pela defesa dos arguidos, porque a lei portuguesa (com a bênção do Tribunal Constitucional) só o admite se os autores do perjúrio o autorizarem.
4 - Depois conclua por si e respeite que Carlos Cruz e os seus advogados não podem desistir da luta que acreditam que vão vencer.
Ricardo Sá Fernandes
Expresso de 06-04-2013
No passado dia 21 de Agosto apresentei no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem uma queixa contra o Estado poorrtuguês pelos vários atropelos cometidos em todo o Processo Casa Pia. Devido à regulamentação dos prazos do TEDH só agora foi possível apresentar este documento. Aqui fica na íntegra a queixa. Os documentos de suporte apresentados naquele Tribunal (e que estão referenciadis na queixa) somam 1400 folhas.
Depis de apresentado recurso para o Tribunal Constitucional, contendo a denúncia de 5 situações de inconstitucionalidade, aquele aceitou analisar 4 das cinco.
Em função disso a minha defesa teve que apresentar as respectivas alegações. É esse documento que aqui fica ao seu dispor, não me dispensado eu de manifestar o meu comentário de que se trata de um notável (mais um) documento jurídico elaborado pelo Dr. Ricardo Sá Fernades.
Para abrir o documento:
Daniel Estulin é um dos maiores jornalistas de investigação do mundo. Da sua vasta obra destaca-se "Toda a Verdade sobre o Clube de Bilderbergue" com mais de 3,5 milhões de exemplares vendidos em todo o mundo.
Veja aqui o Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa.
COMUNICADO
1. Sei que vai ser repetido o julgamento relativo a Elvas mas que foi confirmada a minha condenação por crimes na Av. das Forças Armadas onde nunca estive.
2. Não sei como é que é possível dissociar estas duas situações.
3. No meu julgamento sobre Elvas continuarei a demonstrar que este processo é um embuste e que o conjunto de acusações contra mim formuladas não passa de uma invenção.
4. Não vou ceder um milímetro em relação à luta pela defesa da minha inocência. Faço-o por mim, e também por todos os portugueses que não merecem viver com uma justiça que actua assim.
5. Não aceito uma justiça que funciona com base numa mera ressonância, coisa que ninguém sabe o que é, e que condena sem qualquer prova.
Alcabideche, 23-02-2012
Carlos Cruz
Para ler o texto integral da alegações do Dr. Ricardo Sá fernades na sessão de 9 de Fevereiro de 2012 no Tribunal da Relação de Lisboa:
Cerca de 300 pessoas, entre caras conhecidas e anónimos, marcaram presença no Teatro Villaret no dia do lançamento de Inocente para além de qualquer dúvida.
As palavras do Dr. Manuel Pedro Magalhães são brilhantes, atingem em cheio o centro da questão. Corajosas e muito lúcidas. Insuspeitas. Cirúrgicas. Mesmo com pouca qualidade, aqui estão, com o meu mais profundo OBRIGADO.
Algumas fotografias do evento:
Abaixo deixo ainda as minhas palavras neste dia:
"Em primeiro lugar quero agradecer a presença de todos os que aqui se encontram qualquer que seja o estado de espírito ou a convicção de cada um.
Entre todos, um agradecimento especial para a Raquel, que foi minha companheira durante quase 14 anos. A sua presença aqui, para além da evidente prova pública (mais uma) de solidariedade que significa, é também uma resposta a todas as provocações que têm sido feitas em tentativas patéticas de atribuir a nossa separação conjugal a uma mudança das certezas que a Raquel sempre proclamou da minha inocência. Muitas são as separações que acontecem diariamente pelos mais variados motivos e que dão muito colorido ao cor-de-rosa de certas publicações. A nossa, por muito que seja difícil de engolir, foi um acto mútuo de respeito e solidariedade.
Sejam todos bem-vindos.
Gostaria de referir alguns pontos que para mim são relevantes-
E começo pela razão da escolha deste Teatro para fazer a apresentação deste meu livro:
-Entre Março e Dezembro de 1969, no Teatro Villaret, eu e dois companheiros e grandes amigos (Zé Fialho Gouveia e Raul Solnado) vivemos dias muito intensos. Graças a um programa de televisão, chamado Zip-Zip, tivemos o privilégio mas também a tristeza de tomar conhecimento de que existia um país pleno de injustiças da mais variada natureza com relevo para as abissais desigualdades sociais e para a total incapacidade, imposta pelo sistema, de muitos portugueses humildes e maltratados poderem fazer ouvir sua voz. Quisemos, com alguma ingenuidade, ser essa possibilidade. Com as limitações da época e numa luta semanal com a censura (representada nas gravações por um senhor que no final nos dava a lista do que tínhamos de cortar) nós três ainda conseguimos mostrar ou pelo menos dar a entender aos portugueses alguma dessa realidade. E só desistimos quando o poder começou a cortar a torto e a direito, sem qualquer critério, a não ser o do primitivismo intelectual como, por exemplo, sermos proibidos de perguntar aos entrevistados quanto é que ganhavam por mês para não mostrarmos os salários de fome.
-No dia 24 de Março de 2003, estava eu preso, muitos amigos meus encheram este Teatro para uma festa de música e palavras sob o título de "Um Abraço para Carlos Cruz". Foi o meu presente de aniversário que guardo religiosamente em formato CD. A amizade do Zé Fialho, o amor da família, a solidariedade de tantos e tantos artistas e a capacidade e amizade do Carlos Pedrosa Cruz (o outro Carlos Cruz ou CC2) concretizaram um espectáculo a que não assisti mas que guardo na memória e, acima de tudo, no coração)
Tenho portanto do teatro Villaret duas emoções. E se a do dia 24 de Março é uma lição de amizade, e afirmação da convicção da minha inocência por parte de tanta gente que aqui esteve presente como espectador ou como actuante, a recordação do Zip-Zip tem um valor muito mais abrangente porque toca a defesa dos valores com que cresci e que afinal estavam a ser espezinhados no meu próprio país. Falámos, eu o Zé Fialho e o Raul, muito disso. Entre nós e com amigos/cúmplices do que estávamos a tentar fazer: a denúncia da injustiça, a revelação da Verdade. Recordo Jaime Mourão Ferreira e principalmente Fernando O'Neto, primo do Raul, várias vezes preso pela PIDE e sujeito também várias vezes à tortura do sono a que ele resistia, segundo nos contava com uma extraordinária força interior, pensando, nesses momentos, em filmes de cowboys com o John Wayne.
Esse período da minha vida reforçou em mim o repúdio pela injustiça e o amor pela Verdade, valores que meu pai já me tinha transmitido. Desse período eu saí mais triste mas muito mais consciente: a mentira, a propaganda, a manipulação eram uma realidade no meu país. A sua denúncia corria o risco de ser severamente punida: prisão, tortura, desterro.
Por tudo isto, por me recordar cada vez mais, por analogia, desse período, achei que não havia espaço mais simbólico para apresentar o meu livro do que este. Porque o meu livro está na linha coerente do nosso projecto do Zip Zip: denunciar a mentira, lutar pela verdade e pela justiça.
Escrevi-o muitas vezes movido pelos mesmos sentimentos que me assaltavam quando criávamos mais um programa ZIP. E se desta vez falo de mim, o que está em causa não é apenas o indivíduo ou o cidadão Carlos Cruz mas sim o que permite que o cidadão Carlos Cruz, ou qualquer outro, seja vítima de uma enorme mentira, de uma terrível injustiça. E portanto aquilo que permite admitir que possam existir ou que possam vir a acontecer casos como os do cidadão Carlos Cruz. Citando Kafka:
Alguém deve ter difamado Joseph K., porque sem ter feito nada de errado foi preso numa bela manhã.
Só que em 1969 era sob a tutela e vigilância de um Estado autoritário. Desta vez é mais grave: tudo se passa à sombra de um Estado chamado de democrático. E, se não há estado democrático sem Justiça, então há que estar atento e lembrar Martin Luther King como faço no meu livro:
Uma injustiça em qualquer lado é uma ameaça à justiça em todo o lado.
Ao Vasco Morgado, o meu obrigado pela cedência deste espaço.
****
Prestado este esclarecimento, quero agora registar o meu profundo agradecimento ao Dr. Manuel Pedro Magalhães.
A sua forma de ser cidadão, o seu estatuto profissional, a sua craveira intelectual conferem à sua presença aqui um valor acrescentado que jamais esquecerei. Estar aqui, para mim, também tem a leitura de um acto de coragem e de exercício da sua própria liberdade.
Há quem diga que o coração comanda muito as emoções e os sentimentos. Mas julgo poder afirmar que é o cérebro a grande fonte do pensamento. E não há cérebro sem um coração a bater. E por muito que este não tenha a ver com o nosso mundo racional, o coração é a fonte indispensável para todo o milagre chamado Vida.
Não me lembro de alguma vez ter tido o coração ao pé da boca. Mas lembro-me muito bem que o Dr. Manuel Pedro Magalhães teve o meu coração nas mãos, literalmente. Parou-o e ressuscitou-o depois de me costurar 4 bypasses que ainda duram. Não tivesse sido ele e hoje, possivelmente, eu não estaria aqui. Não sei se lhe fez mais alguma coisa mas é o mesmo coração que teve nas mãos. Ainda bate e fornece a necessária energia ao cérebro onde, então sim, nasce o pensamento. Não lhe atribuo, doutor, a responsabilidade pelos meus pensamentos, mas o senhor é responsável por contribuir para que o meu pensar sobreviva. E porque me orgulho do que penso, agradeço-lhe por me ter salvo o coração. Há 18 anos.
E agradeço-lhe, ainda mais e muito sensibilizado, o facto de com a sua presença reconhecer algum valor ao que penso.
****
Olho para esta sala e sinto-me reconfortado. Entre rostos conhecidos e de amigos vejo rostos para mim anónimos que quiseram assistir a este pequeno evento. E renovando o meu obrigado pela vossa presença, faço um agradecimento muito especial aos muitos que aqui não se encontram mas que quiseram justificar a sua ausência enviando-me mensagens de conforto, apoio e dizendo-me de onde estão a esta hora e afazer o quê.
Entre apresentações de filmes de um canal de televisão, espectáculos onde intervêm em localidades longe de Lisboa e compromissos profissionais até em funções docentes, as faltas estão mais do que justificadas. Não tinham que o fazer. Mas sensibilizou-me porque é outra forma de marcar presença. Amigos e colegas, desde o teatro à música, desde a rádio à televisão, fui encontrá-los espalhados pelo mundo, de Londres a Madrid, da Suiça a Miami, do Porto ao Algarve, do Rio de Janeiro a Luanda.
E de Luanda chegaram-me duas mensagens da mesma pessoa, que leio com a necessária autorização e com as quais simbolizo todas as outras.
-De Luanda com muita amizade um abração. Contigo sempre.
Um dia depois, segundo SMS
-Espero que tenhas muitos amigos. Sei que a minha irmã Paula é, como eu, uma fervorosa defensora da tua inocência. Regresso 5ª feira. Senão estava aí contigo
Assinado: Rui Veloso
Obrigado Rui. Obrigado a todos.
****
Uma palavra para a minha editora Vogais. Também de gratidão. Pela forma com que aceitou o projecto e muito pela forma como o tem tratado: Para o Manuel, a Ana, Guilherme e Joana; para toda a força de vendas; para o paginador Ilídio Vasco que fez um trabalho de enorme qualidade, muito obrigado.
****
Sei também que estão aqui várias pessoas que contactam comigo através do Facebook. Já reconheci algumas caras pelas fotografias que têm no seu perfil e outras estarão que ainda não identifiquei ou que terei mais dificuldade em detectar. Sejam bem-vindos todos e obrigado pelo vosso apoio praticamente diário.
O Facebook, uma estrutura híbrida a que chamam rede social tem sido uma odisseia que me chega a lembrar o Big Brother: fecharam a minha página individual por três vezes. Já estava com 6200 amigos. Não contendo discurso racial, não incitando à violência, não tendo conteúdos pornográficos custa-me a entender a política do Facebook que nem dá qualquer justificação pelo fecho. A Censura nos anos 60, por vezes ainda tentava explicar: por exemplo, quando tive um programa chamado Discorama em 1963 fui proibido pela máquina censória (eufemisticamente baptizada por Marcelo Caetano de exame prévio) de mostrar fotografias dos Beatles. E porquê? Porque tinham o cabelo muito comprido. É estúpido mas é uma razão que me foi comunicada oficialmente. No Facebook não. Fecha-se e acabou-se. Porquê? Não dizem. Tenho então agora uma página de figura pública que tem algumas limitações em relação a um perfil pessoal como se sabe. Pois, enquanto vive, contava às 16:30 com 1239 aderentes mas com forte tendência para crescer. Até quando? Não sei. A quem incomodam as minhas páginas e os meus amigos na Net? Não sei. Mas tenho o direito de suspeitar.
E falando em Net: como sabem abri, no dia da sentença, um site na internet www.processocarloscruz.com. Tem até hoje cerca de um milhão e duzentas mil visitas. Continuava, ao fim deste tempo todo, com uma média entre as 100 e as 300 visitas diárias. Pois agora que as pessoas sabem que têm este livro como fonte de informação e esclarecimento, comecei a notar um aumento de visitas ao site. Isso significa que as pessoas querem mesmo ser informadas procurando no site informação complementar do que se encontra no livro. Possivelmente para não se sentirem cúmplices, por omissão ou por opinião não fundamentada, dum erro judicial cruel.
Ontem, até à meia noite, o site teve 678 visitantes. Depois da meia noite e apenas até às 16:30 já ia em 790. Desde o dia 12 foram vistas, pelos leitores, 17.388 páginas.
Um cidadão bem informado pode ser mais justo e será sempre mais livre.
***
Finalmente só mais dois pontos que me dão especial satisfação:
Ontem à tarde, um dos mais conceituados jornalistas internacionais de investigação publicou no seu site oficial uma entrevista comigo antecedida de um pequeno artigo a que deu o título "Carlos Cruz é inocente!"
Tomar conhecimento desta afirmação, escrita por este jornalista é razão para me sentir ainda mais acompanhado na minha missão. O seu livro sobre o Grupo de Bilderberg já vendeu mais de três milhões e quinhentos mil exemplares. Pelo seu trabalho de denúncia de injustiças, complots e organizações altamente suspeitas de grandes conspirações, já sofreu três atentados à sua vida.
Em Portugal estão publicados dois livros de sua autoria: "Toda a Verdade sobre o Club Bilderberg" e " Os Senhores da Sombra". Recomendo a sua leitura para uma melhor compreensão da crise que Portugal e a Europa estão a atravessar.
Chama-se Daniel Estulin e o seu site é www.danielestulin.com. Tem artigos em inglês e espanhol (as suas duas línguas) mas tem tradutor automático razoável. no próprio site.
Finalmente um último ponto:
Chegou ao meu conhecimento que em Julho e Setembro do ano passado uma empresa realizou uma sondagem, com um inquérito a 1500 pessoas numa amostragem a nível nacional.
Tive acesso ao resultado desses estudos e, não estando autorizado a revelar o nome da empresa, tenho o seu acordo para referir os resultados.
Assim, feita a média ponderada dos dois trabalhos, o resultado é:
18,7% -Considera-me culpado
31,3% -Tem dúvidas
40% -Considera-me Inocente
10% -Não sabe ou não responde
Dos 90% que responderam:
79% não acredita na Justiça
21% acha que está cumprindo o seu papel
Estes resultados dizem-me que, afinal, não é a maioria dos portugueses quem me considera culpado. Apenas 18,7 %.
E acredito que essa percentagem diminuirá muito, à medida que este livro for sendo lido, comentado e discutido; à medida que os portugueses perceberem que é possível condenar sem provas.
Na sequência do que acabo de dizer, lembro a interrogação que está escrita na capa: E se um dia o acusarem a si, o que vai fazer?
Termino citando Miguel Esteves Cardoso no prefácio: "Leia este livro por favor. Esqueça quem é o autor e ponha-se no lugar dele. Apanhará um grande susto. Porque poderia muito bem ser você. Todos somos renitentes a desarrumar as ideias já arrumadas e a aprofundar relatos que apenas conhecemos de forma superficial e jornalística. Leia este livro. Para poder respirar fundo. E por uma questão de Justiça"
Muito obrigado!"
Pode saber e ver mais sobre o lançamento deste livro através do blog da editora Vogais.
Leia a Introdução e o primeiro capitulo do meu livro "Inocente para além de qualquer dúvida" acedendo aqui.
O livro já se encontra à venda em formato e-book na www.amazon.co.uk
Basta fazer a busca em books, escrevendo o título.
Aqui fica o texto da entrevista que concedi ao jornal Público e que foi publicada no passado dia 9 na sua revista "Pública"
Ricardo Oliveira ficou conhecido no Processo Casa Pia como João A. Foi o nome fictício que a comunicação social lhe atribuiu. E muitos se lembrarão dele pelo facto de ater aparecido na TVI, entrevistado por Manuela Moura Guedes, ostentando uma máscara branca idêntica à da peça musical e do filme "O Fantasma da Ópera".
Ricardo Oliveira resolveu finalmente contar a verdade: confessa que ele e os seus colegas MENTIRAM à PJ e no Tribunal. Numa entrevista concedida ao jornalista Carlos Tomás, Ricardo põe a nu aquilo que já sabíamos: mentira, enganaram a PJ, os Peritos e os Juízes.
Mas não fica por aí e revela que Pedro Namora estava disposto a fornecer-lhe armas para matar os arguidos! E Catalina Pestana lhe dava dinheiro para ele se drogar! E que os agentes da PSP responsáveis pela sua segurança pessoal chegavam, eles próprios, a ir comprara droga para ele consumir.
E Ricardo confessa ainda que o procurador João Aibéo foi à esquadra de Rio de Mouro, juntamente com o seu psiquiatra Dr. Álvaro de Carvalho, para que ele fosse libertado de pois de ter sido preso por vários assaltos na zona de Sintra (o que ele confitam ter executado).
Sabemos que este vídeo, juntamente com uma entrevista de outro casapiano ligado ao processo, Pedro Lemos, se encontra na mãos de todos os órgãos de comunicação social. Com excepção do Diários de notícias do dia 8 de Setembro, todos eles ficaram mudos e quedos.
Aqui estão os quatro segmentos que baixámos do YouTube.
Video 1 Video 2
Video 3 Video 4
João A., aliás Ricardo Oliveira, foi uma das principais personagens na construção de todo, o processo e da acusação. Como o procurador João Aibéo lhe terá dito, era "a testemunha mais fiável". Era-o para João Aibéo como foi, aparentemente, para a comunicação social. A sua entrevista a Manuela Moura Guedes fica como uma marca. Guedes chorou e João A. também. Mas, como agora diz: "chorar era fácil". E só no Correio da Manhã, João A. foi notícia pelo mesmos 55 vezes
10-12-2002 | MAIS UM ALEGADO CASO DE PEDOFILIA | João A. terá sido violado e espancado dos 11 aos 18 anos, por dois funcionários da Casa Pia. |
10-01-2003 | EX-ALUNO ACUSA MÉDICO E FUNCIONÁRIO SUSPENSO | Até ontem, João A. - um dos menores que frequentou a casa do embaixador Jorge Ritto, em Cascais, e que foi fotografado e filmado nas orgias em que era obrigado a participar - nunca quis falar do que lhe sucedeu, apesar de a sua mãe já ter apresentado uma queixa no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP), que, de acordo com o que o CM apurou, de nada valia em termos jurídicos, dado que o jovem é maior de idade. |
11-01-2003 | JOÃO A. CONTA TUDO AO DIAP | O advogado ex-casapiano confirmou, ainda, que entregou ontem no DIAP o depoimento que João A. lhe prestou na quinta-feira, tal como o nosso jornal noticiou na edição de ontem. |
12-01-2003 | JORGE RITTO INCRIMINADO POR JOÃO A. | Cópia do documento entregue no DIAP foi também remetido à actual provedora da Casa Pia, Catalina Pestana, e à Inspecção-Geral de Saúde, que, nesta altura, também já estão a par das acusações de João A.. |
16-01-2003 | ESTADO TRAI VÍTIMA DA CASA PIA | João A. e a tia adoptiva Manuela C. nem queriam acreditar no telegrama que receberam na terça-feira: nele são bem legíveis o verdadeiro nome, morada e local de trabalho do ex-aluno da Casa Pia, dados que Catalina Pestana prometeu nunca divulgar. |
17-01-2003 | VÍTIMA DE RITTO CONTA TUDO | Primeiro fui obrigado a masturbar o "A.", tendo este de seguida saído da casa de banho para verificar se vinha alguém, tendo avisado que estava tudo isolado e foi-se embora. |
18-01-2003 | 'NÃO ME ENCONTRO A MONTE, NEM ESTOU DESAPARECIDO' | Catalina Pestana adiantou ontem ao CM que o jovem João A. tem de ser ouvido no Ministério do Trabalho, Segurança Social, por causa do processo disciplinar instaurado ao funcionário A.P., da Casa Pia, que, alegadamente, o terá violado, em 1989. |
05-02-2003 | FUI VIOLADO E ESPANCADO | Entrevista a João A. |
07-02-2003 | RITTO DESMENTE JOÃO A. | Na entrevista de quarta-feira, João A. diz que foi "violado por Jorge Ritto", uma afirmação de teor semelhante a outras feitas em ocasiões anteriores. |
28-02-2003 | JOÃO A. VAI DEPOR À SEGURANÇA SOCIAL | De acordo com o que o CM apurou, João A. só agora está em condições psicológicas para relatar à Segurança Social os pormenores do abuso sexual de que foi alvo por parte do funcionário do Colégio Maria que a provedora Catalina Pestana suspendeu preventivamente. |
07-05-2003 | JOÃO A. AMEAÇADO DE MORTE | Segundo adiantou ao CM a tia adoptiva de João A. que solicitou o anonimato, por temer "represálias", o jovem, nos últimos dois meses, tem sido "bastante incomodado com telefonemas ameaçadores". |
08-05-2003 | ASSESSOR DO MARIA PIA INVESTIGADO PELA PJ | Adelino Granja, por seu lado, assegura que 'João A.', uma das vítimas de 'Bibi' e do embaixador Jorge Ritto, lhe garantiu que foi muitas vezes agredido por António Magalhães. |
21-05-2003 | JOÃO A.: VOU DORMIR MAIS DESCANSADO | O CM sabe que João A. soube da detenção de Jorge Ritto por uma das pessoas que mais o apoiou desde que saiu da Casa Pia. |
24-07-2003 | TESTEMUNHA TENTA MATAR-SE | Ontem, perto das duas da tarde, João A. decidiu "acabar com a vida" ingerindo "comprimidos para dormir". |
26-07-2003 | NÃO HÁ PROSTITUTOS ENTRE AS TESTEMUNHAS | O que João A. fez (tentativa de suicídio, através da ingestão de comprimidos para dormir) já foi tentado por outras vítimas da pedofilia? |
08-09-2003 | DENÚNCIAS DE PEDOFILIA INUNDAM RTP | "Fui violado pelos três e fomos filmados durante o tempo todo", declarou João A.. |
08-09-2003 | ADELINO GRANJA: NUNCA DISSE QUE HAVIA CRIANÇAS A MENTIR | O que referi foi que fiquei espantado com o facto de João A. me ter garantido que só teve relações sexuais com o 'Bibi' e com Jorge Ritto e nunca me ter falado que também tinha sido violado por Paulo Pedroso. |
13-09-2003 | ESTOU ANSIOSO POR TESTEMUNHAR | Entrevista a João A. |
18-09-2003 | JOÃO A. ESTÁ ARREPENDIDO | João A. está arrependido de ter ameaçado de morte o advogado Adelino Granja. |
31-12-2003 | TESTEMUNHA ENVOLVE FERRO E JAIME GAMA | TESTEMUNHA ENVOLVE FERRO E JAIME GAMA |
02-01-2004 | JOÃO A. É TESTEMUNHA FIÁVEL PARA MINISTÉRIO PÚBLICO | João A. é uma das testemunhas arroladas pelo Ministério Público que os peritos do Instituto de Medicina Legal consideram fiável, no tocante à questão da credibilidade, adiantou ao CM, fonte da investigação do processo de pedofilia da Casa Pia. |
03-01-2004 | DENUNCIANTE DE MINISTRO É TESTEMUNHA | Por isso digo que o tratamento dado ao actual ministro devia ser idêntico para Ferro Rodrigues, Jaime Gama, Jorge Sampaio, António Vitorino e aos ex-futebolistas Carlos Manuel e Chalana. |
03-01-2004 | JOÃO CRAVINHO ATACA PGR E FERRO MANTÉM SILÊNCIO | Em segundo lugar, Ferro Rodrigues, através de Vera Jardim já reagiu ao facto do seu nome e o de Jaime Gama serem visados no processo. |
05-01-2004 | PRESCRIÇÃO SALVA FERRO | No depoimento o jovem diz que foi levado por 'Bibi' para uma casa em Cascais onde se encontravam Ritto, Ferro e Jaime Gama e onde foi vítima de abuso sexual. |
15-08-2004 | MAIS RISCO PARA VÍTIMAS | No caso das cassetes de Octavio Lopes o Correio da Manhã escreve: Mas não é apenas ela a surgir nas cassetes roubadas, mas igualmente João A. e Joel. |
05-09-2004 | JOÃO A. DETERMINANTE | João A. e um outro casapiano participaram em filmes de natureza pedófila à venda, em França, por catálogo. |
27-09-2004 | MANTENHO TUDO O QUE JÁ AFIRMEI | Processo: testemunha 'João A.' garante estar a dizer a verdade |
24-12-2004 | Faleiro e Soares investigam | Cristina Faleiro e Paula Soares, procuradoras adjuntas que juntamente com João Aibéo representam a acusação no julgamento da Casa Pia, são as novas responsáveis pela investigação das queixas interpostas por Ferro Rodrigues, Jaime Gama e Paulo Pedroso contra algumas das testemunhas do processo de pedofilia |
05-01-2005 | Dez vítimas reavaliadas | André', o chamado braço-direito de 'Bibi', e 'João A.', o jovem que no dia da libertação de Paulo Pedroso acusou na televisão o deputado de abusos sexuais, são duas das dez principais testemunhas do processo de pedofilia da Casa Pia que vão ser sujeitas a novas perícias de personalidade. |
05-04-2005 | Ex-provedor nas orgias | 'João A.', uma das principais testemunhas do processo Casa Pia, implicou o ex-provedor Luís Rebelo e Manuel Abrantes nas orgias que, entre os 12 e os 17 anos, assegura ter presenciado na casa de Colares, disse ontem Catalina Pestana, na 35.ª sessão do julgamento de pedofilia. |
07-06-2005 | Autoridades investigam ameaças de morte | Conforme noticiou o CM em Novembro de 2003, 'João A.', um dos jovens que referiu o nome de Paulo Pedroso e a chamada casa dos 'erres, foi, mais do que uma vez, intimidado através de telefonemas anónimos. |
15-06-2005 | Vítima tenta suicídio com facada na barriga | 'João A.', uma das testemunhas que envolveu Paulo Pedroso e Jorge Ritto no escândalo da Casa Pia, foi a primeira vítima a tentar acabar com a vida (2003). |
20-08-2005 | Perícias repetidas | Foi a testemunha que falou na casa dos 'Erres' e mencionou os nomes de Ferro Rodrigues e Jaime Gama. |
24-11-2005 | Vítima ingeriu herbicida letal | 'João A.', uma das testemunhas que envolveu Paulo Pedroso e Jorge Ritto no escândalo de pedofilia da Casa Pia, foi a primeira vítima a tentar pôr termo à vida, logo apôs a divulgação do caso, em 2003. |
18-03-2006 | Vítima julgada por difamação | João A. processado por Jaime Gama |
23-03-2006 | Meninas nas orgias | 'João A.', de 24 anos, o ex-aluno da Casa Pia que ontem acabou de ser ouvido na 160.ª sessão do julgamento de pedofilia, revelou que também havia raparigas envolvidas nas orgias da casa dos 'Erres', no Restelo. |
21-04-2006 | Strecht refere Ferro | Ferro Rodrigues, Jaime Gama e Paulo Pedroso processaram várias vítimas do processo Casa Pia que mencionaram os seus nomes. |
27-06-2006 | Detido acusador de Bibi | João A., de 25 anos, uma das principais testemunhas do processo Casa Pia, foi detido no último sábado suspeito de furtos a diversas residências na zona de Colares, concelho de Sintra. |
20-09-2006 | Relação dá razão a vítima | Recorde-se que 'João A.' foi também processado por difamação por Jaime Gama, pelas declarações prestadas na fase de inquérito, mas, neste caso, o jovem vai mesmo ser julgado. |
27-09-2006 | João A. assaltou 14 casas | João A. assaltou 14 casas |
12-02-2007 | Casa Pia deixa defesa de vítima | Os advogados das vítimas e da Casa Pia vão deixar de representar 'João A.', o ex-aluno da instituição que envolveu Ferro Rodrigues e Jaime Gama no processo de pedofilia da Casa Pia. |
04-06-2007 | Denunciantes da Casa Pia julgados | 'João A.', ex-casapiano que acusou várias pessoas de abusos sexuais e é testemunha do caso de pedofilia, foi processado por Paulo Pedroso, Ferro Rodrigues e Jaime Gama. |
18-10-2007 | Catalina denuncia casa de orgias | Em julgamento, 'João A.' explicou que as vítimas entravam na moradia com uma diferença de 15 minutos e que a saída era sempre feita por um local diferente para não chamar a atenção. |
21-11-2007 | Vítima que acusou Pedroso ganha acção | O antigo aluno da Casa Pia João A. (nome fictício) não vai ser julgado por ter acusado Paulo Pedroso de estar envolvido no escândalo de abusos sexuais com jovens da instituição. |
27-11-2007 | Ferro vai testemunhar | Em julgamento, a principal testemunha do processo e 'João A.' voltaram a apontar Ferro Rodrigues. |
23-12-2007 | Vítima acusada por Gama chama Costa | António Costa, líder parlamentar do PS à data da divulgação do escândalo da Casa Pia, foi arrolado como testemunha de defesa de 'João A.' - o jovem de 26 anos que envolveu Ferro Rodrigues e Jaime Gama no processo de pedofilia e que começa a ser julgado por difamação a 9 de Abril. |
26-12-2007 | Duas vítimas de pedófilos já são pais de família | Foi a testemunha que falou na 'casa dos erres', no Restelo, e que referiu os nomes de Ferro Rodrigues e Jaime Gama. |
25-06-2008 | Médico do Ferrari tinha Lotus vermelho | São hoje lidas duas sentenças de processos relacionados com a Casa Pia:a do jovem que envolveu Jaime Gama no caso de pedofilia, e a de Ferreira de Sousa, que acusou Ferro Rodrigues de ser 'um grande mentiroso'. |
19-07-2008 | Ferro Rodrigues perde recurso | JAIME GAMA DERROTADO |
22-11-2008 | Vítimas vão ouvir sentença no tribunal | No último ano, três foram pais e dois emigraram: 'João A.', o jovem que acusou vários arguidos de abusos mas cujos crimes já tinham prescrito, e 'Daniel', partiram para França em busca de estabilidade, sobretudo emocional. |
24-11-2008 | Ministério Público defende acusação | O ex-inspector explicou que Ferro Rodrigues e Jaime Gama 'começaram a ser referidos pelas gerações mais antigas'. |
02-05-2009 | Jaime Gama perde processo | Casa Pia: Presidente da Assembleia acusou João A. de difamação |
29-11-2009 | Cinco vitórias para vítimas | Apenas Jaime Gama, actual presidente da Assembleia da República, conseguiu levar o jovem que referiu o seu nome a julgamento, mas 'João A.' foi absolvido em primeira instância e também em sede de recurso. |
03-09-2010 | Casa Pia: "Falta alguém no banco dos réus" | Oito anos depois de ter rebentado o processo, os jovens representados por Miguel Matias deixaram de ser menores, saíram da Casa Pia e alguns já têm mesmo filhos, como é o caso de 'João A.', o ex-aluno da instituição que envolveu Ferro Rodrigues e Jaime Gama no escândalo de pedofilia. |
09-09-2010 | Carlos Mota procurado no Brasil | 'João A'., que envolveu Paulo Pedroso, Ferro Rodrigues e Jaime Gama no processo de pedofilia mas que depôs apenas como testemunha por os alegados factos já terem prescrito, tem manifestado a sua revolta numa página da internet, onde aparece com uma arma e faz ameaças |
Foi o espanto total naquele dia na sala de audiências. A testemunha Pedro Lemos, talvez por ingenuidade mas seguramente de forma inadvertida, revelou que, entre o depoimento prestado na Policia Judiciária e aquele dia no Tribunal, se tinha encontrado no Algarve com o Procurador João Aibéo, aquando das férias deste e a pedido do mesmo.
Agora Pedro Lemos, em entrevista ao jornalista Carlos Tomás conta a história desse encontro e o conteúdo dessa conversa. Ao ouvi-lo hoje, o espanto é ainda maior, perante a gravidade do que ele afirma sobre a conduta do procurador João Aibéo.
A testemunha Pedro Lemos aparece neste Processo através de um depoimento que prestou na Policia Judiciária a 2 de Outubro de 2003.
Nesse depoimento diz que foi vítima de múltiplos abusos enquanto estudava na Casa Pia de Lisboa mas por parte de funcionários da própria Casa Pia. Não há a mínima referência ao meu nome ou à minha pessoa.
Pedro Lemos também já tinha feito uma denúncia na PSP de Tavira onde também não há a mínima referência à minha pessoa.
Foi, por isso, com espanto que em 2006 - quase três anos mais tarde - em pleno Tribunal oiço Pedro Lemos falar no meu nome:
Procurador - Sr. Pedro Lemos dessas quatro vezes que foi levado à casa de Colares, quem foi, ou que foram as pessoas que abusaram de si?
Pedro Lemos - Sr. Carlos Silvino, Sr. Jorge Rito e Sr. Carlos Cruz
Procurador - De todas as vezes, e pense bem, de todas as vezes que foi a essa casa, estavam lá sempre essas três pessoas?
Pedro Lemos - O Sr. Jorge Rito e o Sr. Carlos Cruz sim. E o Carlos Silvino também.
Procurador - Portanto estavam lá sempre.
Pedro Lemos - Sim, sim não sei se uma combinação qualquer
Procurador - Não sabe se
Pedro Lemos - Se era já propositado, se não sei
Procurador - Quando o Sr. lá chegava, as pessoas já lá estavam, ou só chegavam depois?
Pedro Lemos - Chegavam depois
Procurador - O Sr. quando ia para lá, esqueça isso, o que é que acontecia exactamente, quando o Sr. diz que era abusado, isso quer dizer exactamente o quê?
Pedro Lemos - Era muitos miminhos, digamos assim, vou tratar disso por outras palavras, da parte deles, muitos miminhos, muitos carinhos, muitas ofertas, como por exemplo camisolas do Benfica, como roupas, dinheiro
Procurador - Quem é que lhe oferecia?
Pedro Lemos - O Sr. Jorge Rito, o Sr. Carlos Cruz
Procurador - Quem é que lhe ofereceu as camisolas do Benfica?
Pedro Lemos - Fez-me a oferta o Sr. Carlos Cruz
Procurador - (....) o Sr. sabia que eram o Sr. Jorge Rito e o Sr. Carlos Cruz?
Pedro Lemos - O Sr. Jorge Rito, sinceramente não conhecia nem por nome, nem que era uma figura social aí, e o Sr. Carlos Cruz conhecia aí da televisão, basicamente
Procurador - Mas não sabia o nome
Pedro Lemos - Era tão novo, isso não posso responder, em princípio, sabia que era uma figura pública, era só
Procurador - Portanto olhou para aquela cara e conheceu aquela cara como sendo alguém da televisão. É isso?
Pedro Lemos - Sim. Porque é normal por coincidência o meu pai também via o um, dois, três, na altura e deu logo para identificar essa pessoa
Procurador - Então quando é que o Sr. pôs um nome naquele rosto? Ou seja, quando é que o Sr. soube que aquela pessoa que estava em Colares, e que o Sr. diz ter reconhecido como uma pessoa que apareceu, que aparecia na televisão, quando é que soube que essa pessoa se chamava Carlos Cruz?
Pedro Lemos - Por conversas, das pessoas lá dentro, na casa, foi assim
Procurador - Lá dentro, ainda, da casa?
Pedro Lemos - Sim, sim, sim
(...)
Juíza - Sr. Pedro Lemos continua advertido do dever de falar com verdade está sob juramento portanto o dever se falar com verdade a tudo o que lhe for perguntado. Compreende?
Pedro Lemos - Sim sim
Juíza - O Sr. referiu no dia de ontem que tinha que falou com o Sr. Procurador. O Sr. Procurador que estava aqui presente, diz que falou na altura que falou com o Sr. Procurador. Quando é que falou com o Sr. Procurador, onde falou e sobre o que falou? E que Procurador, exacto, que se estava a referir embora ontem já tenha identificado.
Pedro Lemos - Onde falei foi nas Cabanas, o que falei sobre o processo que está a ser falado neste tribunal, e
Juíza - E quando é falou?
Pedro Lemos - Foi em Agosto, salvo erro, Agosto ou em Setembro ou em Julho não sei, foi no verão já
(...)
Juíza - Foi a primeira vez que falou desses factos do Sr. Carlos Silvino, do Sr. Jorge Leitão Ritto e do Sr. Carlos Pereira Cruz?
Pedro Lemos - Se foi a primeira vez que eu falei?
Juíza - Sim
Pedro Lemos - Sim sim foi a primeira vez com o Sr. Procurador sim
Juíza - Foi a primeira vez que falou ao Sr. Procurador. E tirando a Policia Judiciaria falou com mais alguém?
Pedro Lemos - Não não falei a mais ninguém
Juíza - E porque é que falou ao Sr. Procurador?
Pedro Lemos - Porque ...porque não contei tudo aos Srs. Agentes da Policia Judiciaria porque eu na altura estava-me a sentir um bocado não é surpreso, um bocado desconfiado com a situação e era uma situação um bocado complicada e eu não contei não contei realmente o que se passou aos agentes da policia judiciaria
Juíza - Eu estou a falar do Sr. Procurador. Porque é que decidiu contar ao Sr. Procurador
Pedro Lemos - Transmitiu-me confiança, segurança, não sei, foi esse sentimento que eu tive
Juiz - De quem é que partiu a iniciativa dessa conversa?
Pedro Lemos - De quem partiu a iniciativa? Foi minha
Juiz - Foi sua?
Pedro Lemos - A iniciativa desta conversa foi minha
Juiz - Da conversa com o Sr. Procurador
Pedro Lemos - Foi minha foi minha. Pronto o Sr. Procurador contactou-me
Juiz - Contactou como?
Pedro Lemos - Por telefone
Juiz - Sim
Pedro Lemos - Por telefone e a gente combinou nas Pedras da Rainha onde a gente estava e aí conversamos e eu contei tudo o que se passou comigo
Juiz - Sim. O Sr. Procurador telefonou-lhe e disse que queria falar consigo por alguma coisa
Pedro Lemos - Para contar tudo o que se passou comigo
Juiz - Para
Pedro Lemos - Foi contar tudo o que se passou comigo
Juiz - Contar tudo ao Sr. Procurador ou no Tribunal?
Pedro Lemos - Ao Sr. Procurador e agora no Tribunal
(...)
Juiz - O Sr. já tinha sido convocado para vir a Tribunal
Pedro Lemos - Quando eu falhei sim Sra.
Juíza - E o que é que aconteceu dessa vez?
Pedro Lemos - Dessa vez? Não tive cabeça, psicologicamente não estava bem.
(...)
Mª João Costa - Se o Sr. se essa conversa teve lugar antes ou depois da notificação para esta data de audiência?
Pedro Lemos - Ora se fui notificado para o dia 19 de Julho não é?
Juíza - Não não para hoje para o dia de ontem
Pedro Lemos - Ah se eu falei com alguém?
Juíza - Não não se essa conversa que teve com o Sr. Procurador se foi antes do Sr. saber que vinha outra vez a Tribunal, que lhe tinha sido marcada outra data, ou se foi depois. É isso Sr.ª Dr.ª?
Pedro Lemos - Foi muito antes que eu depois falhei à primeira audiência foi muito antes
Juíza - Não. Quando é que o Sr. soube que tinha que vir ao Tribunal no dia de ontem?
Pedro Lemos - Fui comunicado pelo Sr. Carlos
Juíza - E lembra-se quando é que foi isso?
Pedro Lemos - Foi antes de ontem, antes de ontem que tinha de vir hoje sim
Mª João Costa - Então só mais esta pergunta: quem é o Sr. Carlos?
Juíza - Já disse ontem. É da provedoria
Pedro Lemos - O Sr. Carlos é da Provedoria é o motorista que me foi levar
Mª João Costa - está a referir-se ao motorista da Dr.ª Catalina?
Juíza - Sabe se é motorista da Sr.ª Dr.ª Catalina?
Pedro Lemos - Sim. Ele é que me foi buscar.
(...)
Juiz - Nessa altura também foi alguém algum motorista da Casa Pia buscá-lo ou
Pedro Lemos - Não não não fui eu que vim de transportes para Lisboa
Juiz - O Sr. veio de transportes?
Pedro Lemos - Exactamente
Juiz - Então veio para Lisboa e não veio ao Tribunal?
Pedro Lemos - Fui a Lisboa, fiquei em casa do meu pai, e no outro dia era para vir a Tribunal , não sei se era de manhã, era para vir a Tribunal de manhã salvo erro, da parte da manhã e andei aí por Lisboa e depois fui-me embora, nem vim
Juiz - Então o Sr. veio do Algarve a Lisboa para vir ao Tribunal e depois acabou por não vir. Mas porquê? Alguém lhe disse para não vir?
Pedro Lemos - Não não ninguém me disse nada. Eu não me estava sentir bem psicologicamente e não vim. Andei por aí por Lisboa. Apanhei o autocarro e fui-me embora.
(...)
J. Maria Martins - Sr. Pedro Lemos diga-me lá o sr. tinha o número de telefone do Sr. Procurador?
Pedro Lemos - Eu não. Não tinha
J. Maria Martins - Não conhecia o Sr. Procurador?
Pedro Lemos - Não não
J. Maria Martins - O Sr. Procurador Aibéo é aquele Sr. que está ali que falou consigo?
Pedro Lemos - Sim
J. Maria Martins - Foi o Sr. Procurador que lhe ligou?
Pedro Lemos - Correcto
J. Maria Martins - Ele quando lhe ligou disse o quê?
Pedro Lemos - Que era uma testemunha do Ministério Público, e pronto foi uma conversa e depois combinamos o encontro como o Sr. Procurador ia lá para
J. Maria Martins - Foi o Sr. Procurador que lhe disse que queria falar consigo? Uma vez que foi ele que lhe ligou ou foi o sr. que disse que queria falar com o Sr. Procurador?
Pedro Lemos - A gente...não me recordo bem, não quero estar aqui a dizer que eu disse uma coisa e não disse, é assim o Sr. Procurador telefonou-me, marcou-se uma conversa e como o Sr. Procurador ia passar férias lá em baixo, marcou-se um encontro ali na zona onde eu moro e trabalho, para se conversar um bocado
J. Maria Martins - Portanto a iniciativa para você falar com o Sr. Procurador foi dele. Foi ele que lhe ligou a si. Não foi
Pedro Lemos - Ahn digamos que não foi por iniciativa nem nada
J. Maria Martins - Escute quem é que fez o telefonema? Não foi o Sr. Procurador para si?
Pedro Lemos - Sim sim
J. Maria Martins - Pronto. E então combinou encontrar-se consigo lá em baixo no Algarve. É isso?
Pedro Lemos - Exacto
(...)
Juiz - Oh Sr. Pedro Lemos vamos lá a ver. Quando alguém nos telefona e concordamos em falar com a pessoa, há-de haver um assunto para falar. Ao telefone o que é que o Sr. Procurador lhe disse que iam falar? Lembra-se?
Pedro Lemos - Não não me recordo
Juiz - Não se recorda? Então depois de decorrida toda a conversa qual foi o sentido que o Sr. ficou da intenção do Sr. Procurador? Porque é que foi falar consigo? Qual era a razão mesmo razão para falar consigo? Tem de haver uma razão para falar consigo
Pedro Lemos - Acho que a razão
Juiz - Era o quê a razão?
Pedro Lemos - Não lhe consigo explicar bem a essa pergunta.
Juiz - A razão era para o Sr. lhe contar o que se tinha passado?
Pedro Lemos - Não, era eu é que contei, eu é que contei
Juiz - A razão não era para o Sr. contar ou era para contar?
Pedro Lemos - Não lhe posso responder a essa pergunta não consigo responder a essa pergunta
(...)
J. Maria Martins - Sr. Pedro Lemos o Sr. Procurador, que é para nós não ficarmos aqui, o Sr. Procurador quando lá chegou entregou-lhe alguma notificação e disse assim: o Sr. tem de que ir ao Tribunal no dia 21 de Setembro?
Pedro Lemos - Não não
J. Maria Martins - Ele não foi lá para o notificar para o Sr. vir aqui ao Tribunal pois não?
Pedro Lemos - Não, não, a data ainda não tinha sido marcada
J. Maria Martins - Pronto então a conversa foi sobre o processo. É isto que o Sr. já disse há pouco, que já referiu varias vezes
Pedro Lemos - Exacto
J. Maria Martins - Tinha dito na polícia judiciária o que disse depois. Foi isto
Procurador - Oponho-me a esta maneira de fazer perguntas. Isto é por na boca da testemunha pergunta a respostas
Juíza - Já está gravado o que o Sr. disse o que falou e mesmo a questão da policia judiciaria
J. Maria Martins - Srª. Drª. ninguém me vai convencer que o Sr. Procurador foi lá a baixo para notificar a testemunha e é a ideia que querem passar ...em causa aqui que isto vai para o Tribunal Europeu ...não aceito ... ser espezinhado
O leitor julgará. Eu limito-me a perguntar se é ou não legítimo supor que outras acções destas poderão ter ocorrido ao longo de todo o Processo.
A história que se segue merece uma grande compaixão e consideração por este rapaz. O Pedro C. é daqueles rapazes de quem se fica com pena, com vontade de ajudar.
Tem o nome da minha filha Marta tatuado no corpo, diz que efectuou a tatuagem já no estabelecimento prisional, porque gosta muito dela. Diz que conheceu a Marta quando ela tinha 18/19 anos: "ela na altura era solteira, eu tinha o telemóvel dela. Eu gostei muito dela e fiquei apaixonado por ela." (O que é obviamente mentira!)
Enviou para o Tribunal, várias cartas para a Dr.ª Ana Peres, para o Sr. Procurador, para mim, para a Raquel (minha ex-mulher), para o Dr. Ricardo Sá Fernandes e até para a mulher deste. Toda a gente recebeu cartas.
Cartas completamente fantasiosas mas com uma preocupação: restabelecer a verdade sobre a casa de Elvas, e ajudar uma pessoa que não estava lá em Elvas, que era eu. Todos os outros estavam, e mais alguns, mas eu não estava em Elvas.
Para perceber, tem de ver os desenhos do Pedro C. Note-se que a fachada da casa de Elvas não é mais do que a cópia da fotografia que o Correio da Manhã publicou com o título de "A Casa das Orgias".
Quanto aos personagens na casa de Elvas, é assim que Pedro C. As descreve e identifica:
O Dr. Ricardo Sá Fernandes fez, nas alegações finais, um retrato bem claro:
"Ele mete todas as pessoas neste filme: a Dr.ª Catalina, o Pedro Namora, o Sr. Embaixador, Ana Paula Valente, o Hugo Marçal, o Herman José, o Tubarão, que ele diz que é o doutor Ferreira Diniz, o Francisco Alves, o arqueólogo submarino, o Manuel Abrantes, a D .Gertrudes, o Chalana, o Carlos Manuel, a Fernanda Teresa, o Paulo Pedroso, o Sá Leão, o Joel, que como se sabe um nome fictício e muitos outros.
As pessoas que aparecem na televisão, fazem parte da história que este rapaz construiu - peço desculpa pelo texto que se segue mas acho importante terem uma noção do que aqui se fala:
"(..,) lembro-me de uma monitora, a Ana Paula Valente, trazia a uma coisa tipo algemas e outra para tapar os olhos, algemavam e depois começavam a abusar de nós. O Sá Leão só filmava, depois entregava as cassetes ao Abrantes que era o Provedor. A Ana Paula, pedia para lhe enfiarem o respectivo objecto onde calhava, era no rabo na boca, punha iogurte lambia depois pedia para que a gente a masturbasse. Às vezes apareciam pessoas que não conhecia, um Senhor com um sinal na cara, não me lembro do nome, ele veste-se de policia é actor aparece na televisão, um Senhor de bigode, eles davam nomes sem ser verdadeiros, o Senhor de bigode seria o Chalana, o adjunto do Benfica. Lembro-me bem onde fica a vivenda é na rua Domingos Lavadinho N.º 24, lembro-me bem da rua da saída, eles paravam nas bombas, o Bibi telefonava do Ericsson dizia que a gente estava a chegar, depois aparecia o tio Rito, que era o nome de código dele, até me deu um fato todo preto, uma camisa azul da Quebramar e uma gravata, sapatos pretos, e aparecia o Ferrari, a alcunha dele era o tubarão por ser forte. A D. Gertrudes também mexia no nosso sexo, ele pedia para a lamber a D. Gertrudes, dizia olha que pilinha tão pequenina e tão engraçada depois a Ana Paula fazia o resto, começava a mexer, chamava o Bibi (...)" etc., etc., etc., etc.
Enfim, é um cenário destes por várias páginas, isto desenrola-se por umas 6 páginas, onde naturalmente acaba por me envolver também."
Pedro C. foi submetido a perícias psicológicas.
Volto a citar Ricardo Sá Fernandes nas suas alegações finais ao referir-se a este episódio:
"Sr.ª Doutora esta é uma, é uma história muito, enfim, muito compungente e que merece uma grande compaixão e consideração por este rapaz.
Mas este rapaz que disse o que disse, ao Instituto de Medicina Legal, o Instituto de Medicina Legal concluiu da seguinte maneira: as descrições efectuadas sobre a vivência de várias situações de natureza sexualmente abusiva enquanto permaneceu institucionalizado na Casa Pia, preenchem vários critérios clínicos a serem tidos me consideração pelo tribunal, aquando da avaliação da credibilidade nomeadamente estrutura lógica, elaboração não estruturada, quantidade de detalhes, contextualização, descrição das interacções, reprodução das conversações detalhes inusuais, detalhes supérfluos, correcções espontâneas e admissão de falhas de memórias. Salienta-se ainda a autenticidade das emoções que acompanham os relatos, e lhe conferem uma dimensão de experiências vivenciadas. Considera que tem capacidades cognitivas para testemunhar em tribunal, compreende aquilo que lhe é perguntado, e consegue elaborar uma resposta coerente. Sr.ª Doutora fica-se muito assustado quando se lê este relatório do Instituto de Medicina Legal, ainda por cima porque este é um relatório da perita Rute Agulhas e é também um relatório do psiquiatra que também diz a mesma coisa, mais ou menos. O examinado apresenta um quadro de atraso mental de grau ligeiro, existe um funcionamento intelectual nos limites inferiores do normal, mas com dificuldades de funcionamento adaptativo esta problemática mais do que resultante de anomalia biológica surge compreensível no contexto da sua história pessoal. Não se apura presença de sintomatologia psiquiátrica grave ou aguda, não se apura presença de sintomas psicóticos como delírios ou alucinações. O examinado refere algum receio com a sua segurança, o que se admite em conformidade no contexto situacional em que se encontra fase ao processo em causa com contornos mediáticos, sendo que mantém vontade de depor.
Que em 2007, Instituto de Medicina Legal, o psiquiatra e psicóloga tenham dito, tenham tido o atrevimento de escrever sobre este rapaz o que aqui está, aparentemente à luz dos melhores critérios porque, Sr.ª Doutora, ele diz muitos pormenores muitas coisas, mas nada disso... quer dizer qualquer pessoa para fazer uma perícia sobre este rapaz, que viria depor neste processo tinha que estar minimamente integrado no que é este processo, perceber, de uma forma óbvia, a completa fantasia inconsciente, esta sim, deste rapaz. O enorme sofrimento que este rapaz tem, a enorme compaixão que ele merece, a enorme ajuda de que ele carece. Pois o que estes dois Senhores disseram, é que não senhora, ele tem uns problemas, tem um pequeno atraso, mas que preenche os requisitos todos e tal, os relatos são coerentes e, fica-se estupefacto e fica-se muito avisado quanto ao que são perícias, muito avisado. E fica-se também, muito consciente da necessidade que em Portugal existe de rapidamente o Estado fazer uma intervenção na medicina forense porque isto é ofensivo para as pessoas, é ofensivo para a dignidade das instituições, e é perigoso para a saúde e para a liberdade das pessoas."
***
Uma nota final:
O Procurador João Aibéo, teve um almoço com este rapaz antes dele depor.. Ouviu-lhe a história mas não sei o que lhe terá dito. Sei que o Dr. Aibéo insistiu em levar este rapaz a Tribunal numa atitude para a qual só encontro uma definição: "Tudo o que vem à rede é peixe". Talvez contasse que em Tribunal, Pedro C. acabasse por me incriminar. Não foi o que aconteceu. No final da audiência, Pedro C. Fez questão de entregar ao Tribunal um documento: era um retrato que ele desenhou de mim, com o pedido par que o Tribunal mo entregasse.
E na audiência de Julgamento, só o Dr. Aibéo interrogou Pedro C. A seguir a ele, o Dr. José António Barreiros, na altura mais um dos vários advogados que a Casa Pia foi tendo, depois de uma ou duas perguntas, teve pena do rapaz e solicitou a interrupção da audição, requerendo que Pedro C. fosse sujeito a uma perícia. Todos os Advogados de defesa concordaram. Era demasiado penoso assistir àquele depoimento.
Prevaleceu o bom senso dos Advogados que não entraram no jogo do Ministério Público.
Fez-se a perícia, analisada acima. Pedro C. Nunca mais voltou a Tribunal como testemunha.
Apareceu muitas vezes a assistir ao Julgamento. Sempre que conseguiu chegar à fala comigo só me dizia: "Sr Carlos Cruz: fui chamado à Judiciária pelo Inspector (cada dia era um nome diferente) que quer que eu acuse o sr Carlos Cruz. Eu disse que não o fazia".
Pois é esta mente que os psicólogos-peritos do IML consideraram credível!!!
Lendo tudo o que publico neste site sobre as Perícias Psicológicas, (e muito mais se poderia publicar) não me parece que haja outra conclusão a tirar a não ser a de que estas Perícias constituiem uma das peças mais nefastas e perversas do Processo Casa Pia. Fica aqui um resumo dos vários PECADOS MORTAIS cometidos e para os quais nãos encontro absolvição nem penitência.
***
Afirmações da psicóloga Alexandra Anciães, que realizou as Perícias Psicológicas, à juiza de Instrução Ana Teixeira e Silva, durante o Debate Instrutório:
E em Tribunal:
Alexandra Anciães - Não foi seguido neste caso, não por renúncia da nossa parte, mas porque aquilo que me foi dito a mim é que nós não poderíamos ter acesso a nenhuma peça processual, por questões... eu penso que decorrentes da própria investigação, do próprio inquérito que estava a haver na altura, e portanto... ou seja, seria por essa questão que nós não poderíamos ter acesso.
Isso foi aquilo que me foi informado pelo meu Director de Serviço. Nós não poderíamos ter, neste caso, acesso às peças processuais.
Por outro lado, outra das questões que também não tivemos acesso foi às famílias dos sujeitos, ou mesmo aos outros relatórios sociais, porque esses geralmente estão integrados no processo... mas há as questões da família...
Este dado é só por si suficiente para pôr em causas todas as perícias.
***
Ninguém competente no campo da Psicologia Forense pode fazer perícias válidas com estas limitações. A afirmação não é minha: basta consultar os manuais, os artigos, os livros sobre a matéria publicados em todo o mundo.
E uma das razões é que: desde que haja alguma contradição entre o que uma pessoa diz à Investigação e o que afirma ao perito para se pôr imediatamente a hipótese de que está a mentir.
Isto é o que afirmam todos os cientistas mundiais no âmbito da perícias psicológicas forenses. Desde o início, a Drª Alexandra Anciães não podia fazer as perícias que fez. Não teve acesso a elementos, dados e documentos fundamentais para o fazer. Que lhe foram negados!
PORQUÊ?
Não me pode ser negado o direito de admitir, como possível, que foram negadas todas as informações à perita, para prevenir exactamente a hipótese de ela descobrir que tudo era mentira. Não o afirmo! Mas tenho que admitir como provável! É mais legítima esta minha afirmação do que o são as conclusões das perícias.
***
Todos os manuais internacionais que consultei, toda a literatura a que tive acesso, são claros em dois pontos:
1-As entrevistas (pela polícia ou por peritos) devem ser gravadas em vídeo ou áudio
Ou, no mínimo,
2-O relato das declarações do indivíduo sujeito à perícia, deve ser transcrito na sua totalidade (verbatim é o termo usado).
Ora, nestas perícias "à portuguesa" o primeiro ponto foi pura e simplesmente ignorado. Quanto ao segundo, a Drª Alexandra Anciães, remeteu-se a transcrever excertos das declarações das vítimas, escolhidos por si, de acordo (segundo ela declarou em Tribunal), com os apontamentos que tirou.
Qual o critério da escolha desses excertos? Que grau de subjectividade esteve presente na sua escolha? Escolheu os que confirmariam a tese da Acusação? Porque escolheu umas partes e ignorou outras? Detectou mentiras nas outras? Ou as outras é que eram a Verdade? Como pode defender um ou outro critério? Com que base científica, uma vez que a legis artis recomenda a transcrição total e rigorosa de tudo?
***
O Prof Pio Abreu, valor incontornável da Psiquiatria em Portugal e de méritos reconhecidos internacionalmente, analisou as perícias da Dª Alexandra Anciães. Eis as suas conclusões, que se encontram no processo:
"Fosse qual fosse a razão, a peritagem revela incompetência e parcialidade pelas seguintes razões:
a) Renunciou a qualquer fonte externa, incluindo consulta dos autos do processo, entrevista com familiares ou outras pessoas, ou ainda consulta de processos individuais e outros documentos, que pudessem suportar ou pôr em causa as versões directamente transmitidas pelas testemunhas.
b) Como consequência, errou ao descrever dados factuais dos antecedentes familiares, erro esse que logo se detectou à primeira e breve confrontação com os processos individuais. Por maioria de razão, os dados transmitidos pelas testemunhas sobre as ocorrências relevantes, poderão ser incorrectos.
c) Deu proeminência ao relato acusatório dos examinandos, de uma forma inusitada, sem cuidar de esclarecer, confrontar, nem pesquisar as circunstâncias envolventes.
d) Omitiu selectivamente a descrição de aspectos menos abonatórios, mesmo que os entrevistados lhe tivessem dado as "deixas". Em consequência ocorreram lapsos de compreensão nos relatórios.
e) Nunca investigou as fontes da memória, mesmo em situações datadas de há dois anos ou mais, e em que a memorização tivesse sido ajudada por fotografias, conversas ou outros meios.
f) Desprezou a dinâmica familiar e dinâmica da interacção entre pares, resultando lapsos de compreensão no entendimento da evolução e personalidade dos jovens.
g) Nunca procurou a motivação para as denúncias, limitando-se antes a perguntar porque não falaram mais cedo, como se a motivação fosse uniforme e obrigatória.
h) Não investigou as eventuais interferências sobre as testemunhas, nomeadamente de jornalistas e outros.
i) Desprezou completamente as interacções, actuais e antigas, com a polícia.
j) Não estudou a sugestionabilidade interrogativa, pelo contrário, desprezou os factores de sugestionabilidade, que lhe apareceram nos testes.
k) Fez um exame psicopatológico pobre e que fica muito aquém do que revelaram os testes.
l) Desprezou completamente a possível ingestão de drogas, nomeadamente psicofármacos que interferem com a memória.
m) Apresentou conclusões idênticas (copiadas umas das outras) na maioria dos relatórios, apesar da variabilidade dos casos no que respeita aos antecedentes, exames directos, testes e discussão.
4. Entre os problemas detectados ao confrontar os autos de inquirição de testemunhas, entre si e com os relatórios policiais, problemas esses que levaram à situação presente, podemos apontar:
a) A existência de entrevistas repetidas, a partir das quais se podem suspeitar influências sugestivas ou persuasivas, mesmo inadvertidas, mas cuja prova será impossível de fazer pela inexistência de registos video-gravados das inquirições.
b) O completo desprezo pelo apuramento das motivações dos jovens que, salvo raras excepções, e mesmo assim duvidosas, não se apresentaram espontaneamente à inquirição com a motivação decorrente dos abusos de que foram alvo.
c) A inexistência de uma palavra ou preocupação com as influências mediáticas, e seus efeitos na opinião pública e individual, embora elas perpassem em todo o processo e sejam mesmo introduzidas pela investigação.
d) A aceitação de "memórias recuperadas" como se elas fossem genuínas.
e) A sincronização (e por vezes competição) dos discursos, entre si ou através de terceiros, de modo a que se encontrasse uma história colectiva para contar"
***
Já o Dr. Santos Costa, outro eminente Psiquiatra da Universidade de Coimbra, declarou em Tribunal:
Dr. Ricardo Sá Fernandes - (...) E a pergunta que eu ponho ao Dr. é a seguinte: - se é pedida uma avaliação a pessoas que inclusive até neste caso, pretende verificar da fiabilidade de relatos, se era importante ou não ter conhecimento de todos estes antecedentes?
Dr. Santos Costa - Dr. eu diria que era fundamental.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Sem isso, não é possível averiguar...
Dr. Santos Costa - Fundamental... se quiser, obrigatório. São essas perícias... até mesmo por essa complexidade, e a perícia em si qualquer que seja a área de direito em que estejamos a participar ou a actuar, ou a intervir do ponto de vista pericial, naturalmente que a perícia é um puzzle. É um puzzle onde as várias peças têm que encaixar e portanto, temos que perceber esse conjunto de informações, esse conjunto de passos ou de peças, de modo a podermos concluir com esses cuidados conclusivos que eu digo, mas sobretudo discutir. Há um capítulo obrigatório em qualquer perícia médico-legal, e também neste caso, da perícia psiquiátrica... que é o capítulo da discussão. É fundamental discutirmos, e temos que discutir alguns dos elementos que se consigam reunir... e a reunião desses elementos é que nos permite estar à vontade, porque é em sede de discussão que nós preparamos as próprias conclusões. E o que encontramos, é que de facto estes dados não são discutidos
***
Mas se estas opiniões dos dois eminentes professores portugueses não chegassem, também o Colégio Português de Psiquiatria se pronunciou e proferiu um parecer que foi entregue à Juíza de Instrução Ana Teixeira e Silva.
O JORNAL DE NOTICIAS de 1 de Maio de 2004 resume esse parecer de forma claríssima:
"Colégio de Psiquiatria enviou parecer à juíza Ana Teixeira e Silva que "arrasa" perícias a jovens
Casa Pia - Colégio de Psiquiatria defende que testes aplicados às alegadas vítimas só são úteis num contexto clínico e terapêutico. Ordem dos advogados lamenta inexperiência dos peritos
Perícias não podem avaliar se alguém fala verdade
Os testes aplicados pela psicóloga Alexandra Ansiães, do Instituto de Medicina Legal de Lisboa, destinados a avaliar a credibilidade das alegadas vítimas do processo de pedofilia na Casa Pia apenas "são úteis num contexto clínico e terapêutico". Essa é a principal conclusão do parecer, aprovado por unanimidade pelo Colégio da Especialidade de Psiquiatria da Ordem dos Médicos, que foi enviado, anteontem, à juíza Ana Teixeira e Silva acerca "da aptidão dos testes utilizados nas perícias à personalidade das testemunhas com o fim de atestar se tais pessoas falam ou não verdade quanto à identificação que fazem das pessoas que supostamente delas abusaram".
Composto por oito psiquiatras, o Colégio vai mais longe e afirma que os testes "não têm potencialidades ou validade para atestar se determinada pessoa fala ou não verdade quanto à identificação que faz das pessoas que supostamente dela abusaram", como Alexandra Ansiães defendeu em vários dos seus relatórios.
"Não existem testes psicológicos que permitam predizer o grau de adequação da identificação de alguém relativamente à sua identidade. Ou seja, não é possível comprovar através de testes psicológicos de inteligência e/ou personalidade, se a evocação ou relato de um evento é fidedigna e/ou verídica, no seu todo ou em alguma das suas partes", lê-se no documento a que o JN teve acesso. Nos relatórios que serviram para Rui Teixeira sustentar as prisões preventivas de vários arguidos, Alexandra Ansiães fez questão de sublinhar que não há qualquer método validado cientificamente que permita afirmar a completa veracidade de um relato ou de um testemunho. Porém, a perita acaba quase todos os relatórios dizendo que é forçada a admitir a veracidade global dos relatos, porque os jovens não apresentam patologias graves ou perturbação de personalidade
Uma teoria rebatida pelo Colégio de Psiquiatria: "A ausência de patologia ou a evidência de declarações inconsistentes não autoriza nunca o perito a pronunciar-se pela veracidade das mesmas. Uma testemunha saudável e inteligente, até sofrendo de perturbação emocional decorrente de abusos realmente sofridos, pode, ainda assim, estar confundida por qualquer motivo e não há método de o demonstrar."
E o parecer remata: "Mesmo que a convicção do perito vá no sentido de acreditar que globalmente o relato e verdadeiro, deve abster-se de o enunciar."
Autor: Carlos Tomás e Tânia Laranjo
***
Já em relação às chamadas "Segundas Perícias" feitas em 2008, cinco anos depois das primeiras, também qualquer cientista detectará os seguintes erros cometidos:
-Falta
de entrevista estruturada ou semi-estruturada.
-Ausência
de discussão de resultados
-Falta
de conhecimento de antecedentes dos examinados.
-Incongruências
inexplicáveis relativamente a dados objectivos das anteriores perícias.
-Falta
de validação dos testes realizados.
-Inadequação
do teste Millon.
Isto é, e apesar da finalidade destas perícias ter sido desvirtuada pelo Tribunal (limitou-se a perguntar o óbvio: se os rapazes tinham capacidade para testemunhar, esquecendo-se que, quem tem capacidade para testemunhar, tem capacidade para dizer a verdade ou mentir), apesar disso, repetiram-se os mesmos erros e cometeram-se outros.
***
Depois disto tudo, que é apenas uma parte do que se pode dizer sobre Perícias, apetece-me apenas fazer uma pergunta:
OS PERSONAGENS DESTES EPISÓDIOS TODOS DORMEM DE CONSCIÊNCIA TRANQUILA?
O famoso CBCA, em linguagem simples, é um processo de aplicação de 19 critérios à análise de um depoimento das vítimas ou supostas vítimas de abusos sexuais. Hoje em dia está adoptado em muitos tribunais Europeus, Norte-Americanos e Canadianos.
The Criterion Based Content Analysis Technique (CBCA)
(Análise de Conteúdos Baseado em Critérios)
Muitas vezes o objectivo da entrevista com uma criança alegada vítima de abuso surge para levar a criança a fornecer mais informação acerca do abuso que o entrevistador assume que aconteceu. Precisamos de recuar e ter consciência de que as alegações podem ser verdadeiras ou inteiramente fabricadas (ou algo intermediário). Têm os psicólogos processos para distinguir entre depoimentos verdadeiros e fantasiosos e verdadeiros?
O CBCA foi desenvolvido como um processo clínico, na Alemanha, para distinguir alegações verdadeiras, de crianças, de alegações falsas. (Undeutsch, 1982, 1984, 1989). O CBCA é um componente de um procedimento mais completo, chamado Statement Validity Assessment -(Avaliação da Validade das Afirmações) (SVA), que consiste de três partes: entrevista estruturada com a testemunha criança, o CBCA e a aplicação da "Statement Validity Checklist" (Lista de Controlo de Validade) que dá acesso a outras características do processo de entrevista, a testemunha e a investigação (Raskin & Esplin, 1991). A descrição destes processos é a seguinte:
A parte da entrevista estruturada consiste de uma extensa entrevista com a alegada vítima usando perguntas direccionadas. O objectivo desta parte do SVA é criar uma ligação e acesso às capacidades cognitivas, comportamentais e sociais da criança. A segunda parte do SVA consiste no CBCA. Aqui, um conjunto de critérios é aplicado ao conteúdo verbal do depoimento da criança e usado para fornecer uma estimativa sobre a veracidade do depoimento. Durante esta análise, pode ser importante considerar a idade da criança, a sua experiência e nível de aptidão quando se aplicam os critérios. (exº: os depoimentos verbais das crianças podem conter menos detalhes, que é um dos critérios do CBCA).
OS 19 CRITÉRIOS DO CBCA
Características Gerais:
Coerência (estrutura lógica e solidez) - Um relato é considerado coerente se várias partes do que é relatado combinam entre si de forma lógica, coerente e consistente (coerência espácio-temporal).
Produção verbal não estruturada ou espontânea - O relato é considerado espontâneo se ocorre de modo não estruturado, desorganizado e sem constrangimentos na produção da descrição. Uma estrutura rígida é considerada de baixo nível de plausibilidade.
Quantidade de detalhes/suficiência dos detalhes - Um relato tem detalhes suficientes se o contexto for suficientemente detalhado - descrição de lugares e tempos - e é descrita uma série de ocorrências dentro do acontecimento.
Conteúdos Específicos:
Contexto envolvente - Quando existem descrições vocais, espaciais, temporais e pessoais nos acontecimentos relatados.
Descrição de interacções - Se estiveram mais pessoas presentes, é esperável a descrição de interacções (pelo menos três) entre pessoas que assistiram ao mesmo acontecimento.
Reprodução de conversações - Quando são produzidos diálogos entre os elementos que assistiram a determinado fenómeno, na sua forma original, salientando-se frases ou palavras não familiares.
Relato de complicações inesperadas durante o incidente - Sempre que são relatados acontecimentos inesperados, ou por interromperem, complicações, ou dificuldades.
Características Específicas do Conteúdo:
Detalhes inabituais - Detalhes realistas mas notáveis ou extraordinários e não habituais ou, simplesmente, não esperáveis dentro do contexto.
Elementos supérfluos ou periféricos - Sempre que são relatados elementos periféricos, ou seja, não determinantes para os acontecimentos narrados, mas que lhe estão associados no momento em que ocorrem os factos.
Detalhes dados que não são entendidos (especialmente crianças) - Aplica-se mais a crianças porque as suas estruturas cognitivas ainda não estão suficientemente desenvolvidas. Detalhes evocados mas com uma interpretação errónea.
Relação com acontecimentos externos - Aqui são referidos elementos externos ao acontecimento, embora sejam relacionados ao acontecimento. Por exemplo recurso a outros acontecimentos como forma de descrever o acontecimento em si (sons, sabores, etc.).
Dados sobre o estado subjectivo do sujeito - Se a testemunha descreve o seu estado emocional experienciados no momento do acontecimento.
Atribuição de um estado mental ao perpetrador - Referências a ideias, intenções, estados emocionais, motivações, etc. daquele que comete o crime.
Conteúdos Relacionados com a Motivação:
Correcções espontâneas - Sempre que a testemunha corrige espontaneamente durante a entrevista ou testemunho informação dada durante o testemunho relatado que está a ser analisado ou em relatos anteriores.
Admissão de falta de memória - Sempre que a vítima refere que há detalhes que não se lembra quando faz o relato espontaneamente.
Levantar dúvidas acerca do próprio testemunho - Sempre que a testemunha questiona o próprio relato, pondo o que está a dizer em causa, etc.
Auto-desvalorização - Sempre que a testemunha se auto-desvaloriza durante o relato (eu não devia ter feito isto ou aquilo, eu devia ter ido para casa, etc.), quer indicando sentimentos de culpabilidade, quer repetindo o acontecimento como quem procura cognitivamente formas de que ele não se volte a repetir.
Desculpabilização do perpetrador - É frequente as vítimas desculpabilizarem ou minimizarem a seriedade da ofensa. Pode ser uma falha em culpar ou expressão de ambivalência para com o ofensor. (Foi inclusivamente denominado de Síndrome de Estocolmo, quando a vítima se liga afectivamente ao agressor).
Elementos Específicos de Ofensa:
Detalhes característicos da ofensa - Quando são evocados detalhes que só podiam ser verificáveis na situação que está a ser relatada do crime e que são típicos da ofensa.
***
Para que um depoimento analisado segundo os critérios do CBCA seja considerado provavelmente verdadeiro, ele tem que conter pelo menos 6 destes 19. O que nunca acontece com os depoimentos dos assistentes do Processo Casa Pia. Porque são mentirosos.
A última parte do SVA consiste na aplicação da Statement Validity Checklist que contém factores relacionados com os depoimentos que avaliam a validade de uma série de outras características relacionadas com a entrevista, a testemunha e a investigação... Estas características incluem, por exemplo, o estado psicológico da criança e coisas acerca da entrevista que podem ter influenciado o seu conteúdo. Com base na integração dos resultados destas três partes do SVA é então feita uma avaliação global sobre a veracidade do depoimento.
Finalmente mais um elemento importante que se encaixa no texto anterior. Foi Publicado pelo "The Journal of Credibility Assessment and Witness Psychology" 1997, Vol. 1, No. 2, 44-67 - Publicado pelo Departamento de Psicologia da Boise State University.
Trata-se de um trabalho sobre a sugestibilidade das crianças no qual encontramos um quadro que explica as perguntas que podem ser feitas e que podem sugestionar os seus depoimentos.
Table 2. Tipos de Perguntas com Baixa e Alta Sugestibilidade |
|
Tipos de Perguntas |
Exemplos |
Baixa Sugestibilidade Perguntas Abertas |
|
Identificação |
"Que horas eram?" |
Selecção |
"Era Homem ou Mulher"" |
Pergunta Sim-Não |
"O homem disse alguma coisa?" |
Alta sugestibildade Perguntas Sugestivas |
|
Descrição e avaliação implícitas |
"A que velocidade X corre quando o viste fugir da loja?" |
Expectativa Implícita |
"E então a vítima certamente gritou por ajuda?" |
Separação incompleta em pergunta alternativa |
"Era um carro preto ou encarnado?" |
Pressão para concordância (comparação social) |
"A e B declararam que... Não viste o mesmo?" |
Partículas elocutórias, frase, entoação |
"Com certeza tu ouviste o tiro não ouviste?" |
Perguntas de continuidade (elaboração de conteúdo sugerido) |
"Agora que fialmente admitiste que ouviste o tiro, de onde é que ele partiu?" |
Pergunta repetida |
"Tens a certeza? Pergunto outta vez: X levou o dinheiro?" |
Feedback Negativo |
"Pura e simplesmente não é possível que não te lembres disso!" |
Ameaça e Promessa |
"Continuarei a perguntar-te até que me digas o que é que X te fez. Caso contrário não te largarei. Sentir-te-ás melhor quando me contares |
Por aqui se vê a extraordinária importância dos depoimentos serem gravados em vídeo. Ou então, como se diz atrás, os depoimentos devem ser escritos na íntegra e não transformados em resumos que as crianças assinam muitas vezes sem entenderem o que lá está escrito.
E por tudo o que passou neste Processo, para mim é lícito desconfiar dos caminhos que levaram a certos depoimentos.
Finalmente uma citação de Gunter Köhnken renomado Professor da Universidade de Kiev:
Uma outra forma de fabricação parcial ocorre se a testemunha viveu de facto o acontecimento em questão (ou pelo menos um similar), mas com outra pessoa que não é a que está a se acusada. Por exemplo, uma criança pode ter tido experiências anteriores de abuso sexual ou uma mulher pode ter sido violada antes. Em tal caso, o próprio acontecimento é descrito da memória mas em relação à pessoa acusada, o tempo e o local podem ter estar a ser fabricados!
A internet está cheia de informação. Aconselho consultar a Associação Americana de Psicologia e os sites: www.falsiabusi.it e www.truthinjustice.org/child-abuse.htm
Para informação sobre os caminhos que levaram à criação destes métodos, veja o link:
www.ipt-forensics.com/journal/volume2/j2_2_1.htm
****
Cito finalmente o livro "Forensics Psychology" de Lawrence S. Wrightsman (professor Emeritus de Psicologia Social com especialização em Psicologia e Lei, da Universidade de Minenesota):
1. Os entrevistadores devem falar com as crianças uma linguagem que elas entendam; assim devem ouvir uma amostra do discurso da criança para determinar o seu grau de linguagem. As perguntas subsequentes devem reflectir esse nível de linguagem
2. A documentação é essencial; se não forem gravadas, as perguntas e respostas devem ser registadas "verbatim" (textual e totalmente) sempre que possível. As categorias da CBCA são úteis aqui para julgar sobre a validade dos depoimentos da criança.
3. O interrogatório deve começar com perguntas de ordem geral e abertas. Se a narrativa resultar, os entrevistadores podem incitar a criança a elaborar, mas devem ser evitadas perguntas capciosas.
A APA (American Psychological Association) admite ser possível "construir pseudo-memórias sobre acontecimentos que nunca ocorreram. O mecanismo ou mecanismos pelos quais estas pseudo-memórias ocorrem não é normalmente bem compreendido".
***
Uma das tentações ao entrevistar jovens, é o uso de perguntas capciosas (leading questions) ou perguntas que já assumem uma determinada resposta. O dilema é que, sem o uso de tais perguntas, a criança pode mostrar-se relutante em responder, mas a natureza da pergunta pode levar a criança a responder na direcção sugerida, mesmo que a resposta não reflicta os sentimentos ou as crenças da criança.
Os procedimentos para entrevistar usados pela equipa do Instituto Internacional da Criança no caso McMartin Preschool (que deu origem ao filme "O Silêncio dos Culpados" ) foram severamente criticados por vários psicólogos e assistentes sociais (Ceci & Bruck, 1995; Mason, 1991) e o acesso às transcrições dessas entrevistas (graças ao departamento de Psicologia da Universidade McGill) permitiu a identificação de problemas específicos. Os cinco procedimentos que se seguem foram identificados como questionáveis por James M. Wood, Garven e os seus colegas (Wood et al., 1997; Garven, Wood, Malpass & Shaw, 1998).
1- Uso de perguntas sugestivas- Este problema envolve mais do que simplesmente perguntar à criança um conjunto de perguntas capciosas. A técnica de perguntas sugestivas consiste na introdução de nova informação quando a criança ainda não forneceu essa informação na mesma entrevista" (Garven et al., 1998, pg. 348). Por exemplo um "CII" (Coordenador de Investigação?) perguntou a uma criança da escola McMartin: "Lembras-te de fotografias de nus?" quando nunca tinha sido referida a existência de fotos ou de nudez (citado por Garven et al., 1998, pg. 348). Perguntas sugestivas reduzem o nível de credibilidade dos relatos das crianças (Ceci & Bruck, 1993); mesmo as respostas de adultos são susceptíveis de ser alteradas por tais perguntas (Loftus, 1975).
2- A Implicação da confirmação por outras pessoas- O que Wood et al. (1997) chama a técnica de "Outras Pessoas" envolve dizer à criança que o entrevistador já obteve informação de outra criança ou crianças no que se refere ao tópico a ser discutido. Por exemplo, quando começou uma entrevista, um membro da equipa do CII disse à criança que "todas as crianças" de uma fotografia da aula já lhe tinham falado acerca de "um conjunto de segredos yucky" da escola (citado por Garven et al. 1998, pg. 348). Tais acções criam pressões (para serem conformes) tal como acontece com técnicas similares de interrogatórios da polícia usadas com suspeitos. A memória dos adultos tal como a das crianças pode ser substancialmente afectada pelo conteúdo dos depoimentos de outras testemunhas. (Shaw, Garven, & Wood, 1997)
3- Uso de consequências positivas e negativas- Wood et al. (1997) notou o uso frequente de reforço negativo e positivo nas entrevistas do caso McMartin. Os psicólogos classificaram a técnica de dar ou prometer elogios e outros prémios como "Consequências Positivas". Por exemplo, depois de uma série de perguntas sugestivas levar uma criança a concordar que um professor tinha fotografado algumas crianças nuas, o entrevistador respondeu: "Posso-te fazer uma festinha na cabeça... vê como podes ajudar muito. Vais ajudar todas aquelas criancinhas porque és esperto" (citado por citado por Garven et al. 1998, pg. 349). A técnica chamada "Consequências Negativas" reflectem o criticismo sobre um depoimento de uma criança ou uma indicação geral de que tal depoimento é inadequado ou uma desilusão. Wood, Garven e os seus colegas encontraram exemplos impressionantes nas transcrições. Por exemplo, uma criança negou qualquer mau comportamento da equipa da escola McMartin e a resposta do entrevistador foi: "Vais ser estúpido ou vais ser esperto e ajudar-nos?" (citado por Garven et al., 1998, pg 349). Embora estes psicólogos tenham notado que os efeitos do reforço negativo e positivo na credibilidade das crianças não foi explorado no campo forense, existe uma larga aceitação do seu impacto geral.
4- Repetição de Interrogatórios- Imagine que você é uma criança e que o entrevistador continua a fazer uma pergunta a que você já respondeu sem ambiguidades, alguns minutos antes. Poderia este procedimento levar a alterar a sua resposta?. Wood e os seus colegas chamam a isso o método do "Perguntado-e-Respondido". As pesquisas encontraram geralmente que as crianças mudarão as suas respostas às perguntas de "resposta forçada" mas não às perguntas abertas; a interpretação é que as crianças assumem que a sua primeira resposta a uma pergunta de "resposta forçada" estava errada e mudam-na para agradar ao entrevistador. (Siegal, Waters, & Dinwiddy, 1988).
5- Convite à especulação- No método a que Wood et al (1997) chamam "Convite à especulação", é pedido à criança que "finja" ou "imagine qualquer coisa"; esta técnica foi usada pelos entrevistadores quando outros processos falharam para confirmar comportamentos errados. (Mais uma vez, é notavelmente similar à técnica usada pela polícia com os suspeitos, quando lhes pedem para jogar ou responder a uma pergunta como "Imagine que a matava - como é que o faria?"). Com efeito, este procedimento baixa o limiar para produzir depoimentos incriminatórios que mais tarde podem ser "confirmados" pelo uso dos processos descritos acima, especialmente "reforço do positivo" e "interrogatório repetido".
***
Resumindo: o que aqui fica escrito é bastante esclarecedor. Porque enuncia tudo o que se deve fazer e tudo o que não se deve fazer. Sabemos hoje que, no Processo Casa Pia, foi feito tudo o que não devia ter sido, e nada foi feito do que devia ter sido
O estado da investigação em processos deste género, que tem ocupado inúmeros cientistas desde pelo menos os anos 80, foi completamente esquecido. Ou melhor, não foi respeitado, por completa ignorância, e por surpreendente atraso no estado da Psicologia Forense no nosso país. Qualquer leigo, com estes elementos básicos, percebe.
Para além das Perícias Físicas e das Psicológicas feitas aos assistentes, outras foram feitas a alguns dos arguidos e outras tantas a alguns assistentes.
No que a mim me diz respeito, fui analisado pela equipa do Professor Carlos Amaral Dias que me submeteu a uma bateria de 19 testes e a muitas horas de entrevista pessoal em várias sessões. No final, o relatório produzido conclui:
A meu pedido, o Tribunal ordenou nova perícia agora feita pelo Instituto de Medicina Legal. Sujeitei-me a mais três testes e a várias entrevistas com um Psiquiatra (Dr. Rui Durval) (clique aqui) e com uma Psicóloga (Drª Luisa Coelho).
Esta perícia tem um aspecto curioso: o relatório final demorou meses a ser escrito. E durante esse período de extensão inexplicável, muita especulação se fez. A serem verdade algumas das versões sobre esse atraso, percebe-se a conclusão do Dr. Rui Durval:
O Dr Rui Durval diz isto tudo para afirmar, no fundo, como um amigo meu: "Sou dessa opinião e simultaneamente de opinião contrária".
***
A Drª Luísa Coelho foi ouvida em Tribuna. Interrogada pelo Dr. Sá Fernandes declarou:
Sá Fernandes - Tem presente o relatório do prof
Amaral Dias...
Sá Fernandes - Sobre, digamos, as características da personalidade, fiquei com a ideia de que as
conclusões são equivalentes ou aproximadas...
(...)
Sá Fernandes - Normo neurótico... Sim senhor... uff
Ora bem: quando o prf. Amaral Dias cita aqui o Freud dizendo que "a neurose é o
negativo da perversão" o que é que isto quer dizer?
Luisa Coelho
- Que exactamente sendo uma... um quadro mais evoluído do funcionamento que
acedeu, que passou por fases mais precoces, não estacionou nessas fases e
avançou naquilo que é suposto ser o estado adulto, funcionamento mental
característico do estado adulto, aí o neurótico contraria, implica não
perversão porque a perversão (?) há alguma fixação em estados de
desenvolvimento mais precoce. E daí essa consideração que vem do Freud que a
perversão não é compatível ou a neurose não é compatível com o estado de
perversão ou com um diagnóstico de perversão.
Sá Fernandes - Sim senhor. A srª Drª conclui que as
características de personalidade não são aparentemente compatíveis com o perfil
de abusador continuado em razão patológica... confirma isso?
(...)
Sá Fernandes - dizendo depois que relativamente à congruência com práticas ocasionais de abuso que isso não pode afirmar...... A srª drª tem que dizer que sim...
Juiza - Tem que ficar gravado, tem que verbalizar
(...)
Sá Fernandes- Relativamente a este elemento não
haveria testes psicológicos... não haveria testes psicológicos nem
psiquiátricos que pudessem excluir a possibilidade de uma pessoa ter práticas
ocasionais de abuso
Luisa Coelho
- Exactamente sr Dr.
Sá Fernandes- É assim não é?
Sá Fernandes - (...). O Prof. Amaral Dias diz assim: "o arguido foi submetido a uma rigorosa avaliação psicológica. Não revelou nem traços de carácter nem funcionamentos psicopatológicos nem outro tipo de alterações compatíveis com os crimes de que é acusado. Concluímos, de acordo com os resultados encontrados, haver uma baixíssima congruência entre a avaliação efectuada e as práticas parafílicas que lhe são atribuídas." E é... o prof Amaral Dias também obviamente que não diz que não é possível que tenha havida práticas ocasionais, aliás também diz isso logo no princípio do relatório... A questão é esta: esta conclusão de que, não sendo impossível, já se sabendo que os traços de personalidade não são aparentemente compatíveis com um abusador continuado, em razão patológica, se esta afirmação de que os resultados encontrados permitem ou não a conclusão de há uma baixa congruência entre esses resultados e as práticas parifílicas que são atribuídas ao sr Carlos Cruz . O que é que a srª Drª pode dizer sobre isso?
Luisa Coelho - Eu, se me permite, penso que não há grande contradição, por isto: porque o prof Amaral Dias fala em parafilia, práticas parafílicas. A parafilia é um quadro, é uma caracterização que (?) vem descrita psiquiatricamente. E nós, penso que nos nossos, e falei sobre isso com o Dr. Rui Durval a questão que se põe é entre a parafilia e a pedofilia como uma parafilia e a questão do abuso sexual. Portanto, parece estar fora de questão até porque a pedofilia ou parafilia tem determinados critérios e isso parece que não obtemos em qualquer sítio das nossas avaliações dados que encaixem nessa caracterização. Agora, é sempre, é difícil em relação ao abuso de menores. Ou uma situação de abuso, lá está, uma situação em que há um contacto ocasional em que esses critérios não estão presentes, em que não há personalidades tipo para o abuso e portanto aí, neste caso é que elevamos um bocadinho a fasquia da congruência. Não podemos dizer tanto "baixíssima" porque não estamos a falar de parafilia, estamos a falar de abuso
Sá Fernandes - Portanto a srª Drª está de acordo com esta conclusão se estivéssemos a falar de
práticas parafílicas..
Sá Fernandes - ...
regulares...
Luisa Coelho
- Sim exactamente
Sá Fernandes - Relativamente a abusos ocasionais não
há maneira de poder...
Sá Fernandes - Sendo assim não há de facto incongruência entre os dois relatórios. Queria
fazer-lhe só mais uma pergunta relativa a esta matéria ainda: uma personalidade
dúplice, portanto uma pessoa que tem uma vida e esconde outra... aquilo que...
no senso comum se diz "aquele fulano tem uma dupla personalidade"
Sá Fernandes - Mr
Hyde e Dr Jekill
Sá Fernandes - Isso é compatível com a personalidade
que encontraram no sr Carlos Cruz?
Juiza
- Srª Drª antes de responder, acrescentando eu o seguinte ao que o sr Dr. diz:
mesmo que essa vida dupla, essa duplicidade, seja ocasionalmente, essas duas
situações.
Sá Fernandes - Não. Eu primeiro preferia responder em geral. E depois então no particular. Em geral... uma vida dupla..
Juiza
- Pode responder, srª Drª
Luisa Coelho
- Lá está... numa situação dessas temos que partir do pressuposto de que
existe, que se identifica uma personalidade que... adopta este tipo de
comportamento de forma ocasional ou não... neste caso, ocasional, porque a
outra seria... isso havia critérios... mas... era preciso que entendêssemos que
existe uma personalidade que tem esse tipo de comportamento. A partir do omento
que nós não a definimos porque não é possível tipificar, ... duplas
personalidades no sentido em que existência de vidas ou comportamentos que se
inserem em paradigmas diferentes, isso é possível, isso é possível. Agora,
porque não há uma definição, uma categorização específica para esta, para uma
situação ocasional de um abuso.
Sá Fernandes - Ou seja... e respondendo no fundo
àquilo que já é sugestão da srª drª ... uma
vida dupla, digamos regular, que implicasse um determinado tipo de
comportamento destes, isso não encaixaria nos testes.
Luisa Coelho
- Não encaixaria, não.
Sá Fernandes - Práticas
isoladas, disfarçadas, digamos assim, isso..
Luisa Coelho - Isso pode acontecer e passar perfeitamente ao lado de um exame psicológico.
(...)
Sá Fernandes - Portanto, quem tem praticas parafílicas e ao mesmo tempo tem uma vida aparentemente normal do ponto de vista sexual... onde ele tem prazer é na parte parafílica...
Luisa Coelho - Exactamente.
Sá Fernandes - ... na outra é uma componente que ele encontra mas que não o preenche. É isso?
Luisa Coelho - E mais cedo... É... E mais cedo ou mais tarde esta dominância acaba por surgir e portanto ao indivíduo é-lhe difícil a partir de certa altura afirmar-se nas duas formas
(...)
Sá Fernandes- Agora, segundo ponto: não foi encontrada uma vida tendencialmente dupla mas sim uma vida regulada por padrões morais rígidos, exigência e perfeccionismo, com sinceridade, conformismo, responsabilidade, etc. O sujeito dispõe de vários recursos que lhe permitem assegurar o seu bom funcionamento mental, mesmo em situações indutoras de sofrimento psicológico. Os padrões relacionais com os outros são diferenciados mas em termos do seu nível de proximidade e de conhecimento do contexto" Isto quer dizer o quê?
Luisa Coelho - Que ao nível das relações interpessoais existe alguma maturidade, existe o conheci... isso conforme o prf Amaral Dias, o conhecimento e o reconhecimento do outro enquanto entidade diferente de si próprio, enquanto entidade autónoma e que... apague isso tudo integrado numa conformidade social ou numa relação regulada por normas sociais e que... que... enfim... que nos norteiam
Sá Fernandes - E isto foi também verificado nas suas avaliações... concorda com isto?
Luisa Coelho - Sim
***
SEGUNDAS PERÍCIAS A ALGUNS ASSISTENTES
Alguns assistentes foram sujeitos às que ficaram conhecidas como as "Segundas Perícias". Foi uma decisão do Tribunal a pedido das defesas e que chegou a ser muito criticada.
Poucos se aperceberam da "batota" feita pelo Tribunal: as defesa pediam novas perícias psicológica à personalidade dos assistentes devido ao desastre que tinham sido as primeiras feitas pela Drª Alexandra Anciães. Meses depois do requerimento das defesas, o Tribunal fingiu deferir.
O Tribunal mandou executar segundas perícias mas que não tinham nada a ver com o que os advogados tinham pedido: ordenou perícias para determinar se os rapazes tinham capacidade para depor.
O que é batota. Primeiro porque nunca pusemos em dúvida a capacidade para testemunhar e não tínhamos nenhuma dúvida que todos eles eram capazes de o fazer. Essencialmente porque a capacidade para testemunhar não analisa a capacidade para falar verdade ou para mentir.
E às defesas interessava era ter relatórios fiáveis sobre a personalidade de quem ia depor.
Mesmo assim, ainda se concluíram algumas coisas interessantes.
O Chefe da equipa que conduziu estas segundas perícias, Dr. Nivaldo Marins, ouvido em Tribunal, não deixou de revelar que também desta vez não tinham os peritos tido acesso a informação anterior. Nem do Inquérito nem das declarações prestadas em Julgamento.
Assim, e além da já referida, repetem-se as falhas nas tais "Segundas Perícias":
-Falta
de entrevista estruturada ou semi-estruturada.
-Falta de registos áudio e/ou vídeo.
-Falta
de conhecimento de antecedentes dos examinados.
-Incongruências
inexplicáveis relativamente a dados objectivos das anteriores perícias.
-Ausência
de discussão de resultados.
-Falta
de validação dos testes realizados.
-Inadequação
do teste Millon.
O chefe de equipa, Dr. Nivaldo Marins teve a honestidade de dizer o que pensava em resposta ao Dr. Sá Fernandes:
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Dr. esse comportamento descrito relativamente ao JPL, designadamente quando ele se revolta contra o professor, contra o director e diz uma expressão, que a Dr.ª pode-me ajudar, está no primeiro parágrafo da última folha.
Juíza Presidente - "Se me denuncia, eu mando tratar de si".
Dr. Ricardo Sá Fernandes - "Se me denuncia, eu mando tratar de si". Já aqui em audiência de julgamento, uma assistente social que o acompanha neste processo, já depois do processo, uma equipa que foi constituída para acompanhar estes jovens, aconteceu também ela ter referido aqui que ele teria dito uma coisa do mesmo género, um momento de conflito, também a ameaçou que a denunciaria ou que trataria dela, qualquer coisa equivalente. Eu queria que o Dr. enquadrasse estas informações com a avaliação que fizeram, com o perfil de personalidade dele e eventualmente até com a perturbação do stress pós-traumático. Portanto, queria que o Dr. enquadrasse estas duas coisas e visse da sua congruência.
Nivaldo Marins - Isso aconteceu em 2000? A data do ocorrido.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - É Dr. a data de 2000. Depois a outra senhora que aqui depôs, em que ele terá tido um comportamento, equivalente a uma das senhoras que o acompanha, isso terá ocorrido já em 2004 ou 2005.
Nivaldo Marins - Em 2000, o examinado tinha 16 anos. Pelo tipo de comportamento relatado, levando-se em conta os 16 anos, não sou pedopsiquiatra mas também conheço algumas coisas da pedopsiquiatria evidentemente. Levando em conta os 16 anos em 2000 do examinado, o tipo de comportamento é repetitivo, que ele tem, eu enquadraria em termos de diagnóstico aos 16 anos, eu apontei isso antes, página 97, eu já tinha ideia que já tinha relatado os elementos colhidos nos autos, tenho quase a certeza. Página 97, estou a falar do JPL em 2000 com 16 anos. Um adolescente, é essa a minha dimensão de análise. Em termos de diagnóstico e pelo tipo de comportamento relatado, não há dúvidas, eu o enquadraria como tendo na altura, na classificação da pedopsiquiatria, chamada a perturbação do comportamento. E, essa perturbação do comportamento, não preciso nem ler aqui, os exemplos aí mostram, essas alterações constantes junto às normas sociais; o desrespeito, o uso de drogas, a falta de limites, então evidentemente ele tem uma perturbação do comportamento.
(...)
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Dr. eu percebo isso, o que eu só não percebo e devo-lhe dizer que isto para a defesa que enfim, eu faço para este caso, não é muito relevante mas é para eu perceber. No caso do Francisco Guerra, se os senhores tivessem conhecimento de todas estas histórias, de toda esta informação, o patamar da avaliação não passaria de um perfil de personalidade histriónica, ou não podia passar de um perfil de personalidade histriónica para uma verdadeira perturbação da personalidade histriónica? Aqui a minha dúvida é porquê que, quer dizer eu no resto não tive grandes surpresas no vosso relatório, eu neste estava à espera que isso correspondia à minha apreensão empírica que não fosse só um perfil de personalidade, era mesmo uma perturbação da personalidade, que não está aqui reflectida.
Nivaldo Marins - Os outros elementos que constituem a perturbação histriónica não foram observados. Por exemplo, nos exames solicitados, a aparência física para chamar a atenção...
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Dr. pare já aí, porque eu dou-lhe já um elemento que o Dr. não tem. Este rapaz, ao contrário de todos os colegas, andava de fato e gravata. Na Casa Pia a partir de determinada altura, passou a andar de fato e gravata, era gozado, entre aspas, pelos outros porque enquanto os outros andavam de jeans este rapaz andava de fato e gravata. Olhe encaixa logo aí nessa primeira. Os Drs. Não sabiam. O Dr. não sabia, mas agora passa a saber. Aquilo que eu estou a dizer e é isso que com...
Nivaldo Marins - Só uma pergunta, é que não sei, foi esse elemento que deflagrou o caso Casa Pia?
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Foi.
Nivaldo Marins - Então evidentemente está explicado. Foi essa pessoa que deflagrou...
(...)
Nivaldo Marins - Mas temos que ter cuidado com uma certa ilação que pode estar sublinearmente aqui incluída e que não é verdade. Que ilação é essa? Consideremos pois, então segundo o perito, que esse indivíduo tem uma perturbação de personalidade de ordem histriónica. Consideremos segundo o perito, que não tendo elementos, evidentemente essa perícia falhou nesses aspectos e é evidente por A + B + C. Mas é um elemento, agora eu preciso coligar esse elemento com a capacidade de testemunhar o nome dessa pessoa, certo.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Eu estou de acordo Dr..
Nivaldo Marins - Não é a partir desse elemento, generalizar. Por exemplo, na minha prática outros casos de deficit intelectivo e deficiência mental ligeira por exemplo, em pessoas que têm capacidade de testemunhar e testemunham, evidentemente. Quer dizer, a presença de uma determinada perturbação psíquica não é elemento por si só.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Mas eu estou de acordo, mas ele tinha capacidade para testemunhar.
Nivaldo Marins - Eu volto a dizer que pela análise que fizemos, pelos elementos que temos, o estilo de personalidade é referido por aquilo que o senhor falou, está dentro dos aspectos histriónicos da personalidade. Assinar como o representante maior da... Isso tudo está... Agora, não há bizarrice do comportamento.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Utilizei mal a palavra. Mas então o Dr. admite se tivesse a informação que não tinha, visivelmente logo por essa maneira de vestir, por essas histórias que eu lhe contei, o Dr. admite que com outros elementos, aquele elemento da personalidade histriónica podia somado com estes, sem prejudicar a capacidade de testemunhar, poder levar a que pudéssemos considerar este rapaz...
Nivaldo Marins - Poderia.
Juíza Presidente - Eventualmente se isso se pudesse considerar, o que é que isso influenciava ou em que medida é que isso influenciava a sua capacidade para testemunhar?
Nivaldo Marins - Poderia influenciar na medida e que se realmente ficar comprovado que há uma capacidade grande dessas pessoas da mitomania, de criar histórias, histórias inverídicas a respeito disso, dos acontecimentos.
(...)
Juíza Presidente - Mas eu há pouco perguntei na instância que estava a ser feita com o Dr. Ricardo Sá Fernandes -, se existisse essa característica, esse traço ou qualquer coisa mais forte, em que medida é que isso influía na conclusão da capacidade de prestar depoimento, e o Dr. na sequência disse, e eu agora é que preciso ser esclarecida por certo posso ter compreendido mal, disse tinha influência porque há uma capacidade grande de mitomania de criar acontecimentos.
Nivaldo Marins - Eu posso criar acontecimentos não filiados, não relacionados ao evento em si.
Juíza Presidente - Mas também posso criar acontecimentos relacionados com o evento em si.
Nivaldo Marins - Sim, posso criar. Se eu começo a criar um na mente que eu sou o dono de uma grande transportadora e assino como o dono de uma transportadora, isso é um elemento. Mas, se começo a criar questões relativas ao foco da atenção que é os abusos propriamente, a ideia deve ser vista com reservas.
Juíza Presidente - Estou esclarecida, agora sim.
***
Conclusão: também nestas "segundas perícias" a falta de elementos para os peritos terá deturpado a verdade de um diagnóstico.
Levou em consideração o Tribunal todo este conjunto de condicionantes? Não me parece.
Pelo contrário, para encontrar uma qualquer"ressonância da verdade", o Tribunal escolheu o que lhe convinha e ignorou as falhas e as contradições. O Acórdão é muito claro nesse aspecto.
Conforme salientei mais do que uma vez, estas perícias, nas condições em que foram feitas não podem ser levadas a sério: inexperiência da perita, falta de tempo, falta de equipamento, falta de elementos e relatórios indispensáveis, utilização leviana e irresponsável do termo VERACIDADE para avaliar o relato das vítimas. É muito erro junto! No entanto, não tenho dúvidas de que tiveram influência nos três juízes. Como tiveram enorme impacto na opinião pública porque uma Comunicação Social acrítica e, em alguns casos, conluiada com a acusação, transmitiu a ideia de que este arremedo de perícias era a prova de que os rapazes estavam a falar verdade. O que é mentira, obviamente!
O Professor Pio de Abreu foi muito claro no Tribunal:
Professor Pio de Abreu - Lá está... nunca poderia ter passado para a comunicação, nunca podia ter acontecido o que aconteceu. É que o caso português, é absolutamente insólito, nunca aconteceu em lado nenhum, e daí a dificuldade, nós termos anos e anos em cima disto, até descobrir a verdade, penso eu... porque as coisas estão de tal modo baralhadas. Há uma coisa que foi feita, que foram as imagens sociais e que eu na altura pus aqui, mas citando apenas do Gary Wells a "indução de estereótipos". A comunicação social e sobretudo a televisão, estava sistematicamente a pôr a cara dos arguidos, a face dos arguidos e depois... pedofilia. Bem, eu devo dizer tanto quanto sei, nesta situação não existiu pedofilia, a pedofilia não tem nada a ver com isto, a pedofilia normalmente tem crianças imberbes.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Mas, avancemos para o estereótipo.
Juíza Presidente - Para não ficarmos com outra definição. Pode prosseguir senhor professor.
Professor Pio de Abreu - Mas a comunicação social fez isso, e realmente as pessoas falavam era "os pedófilos". Ainda hoje, eu vinha com um chofer de táxi e ele dizia isso, porque a indução do estereótipo... porque ele dizia "a cara dele, a cara dele tem qualquer coisa" E eu perguntei-lhe: - mas oiça lá, se eu lhe for dizer que eu olho para a sua cara, e acho que você pela sua cara andou para aí a fazer isto ou aqueloutro? Como é que é isso? " Realmente tem razão". Mas de facto, essa ideia foi induzida. Foi criado o estereótipo do "pedófilo" e é disso que as pessoas falam, e agora estamos na civilização da imagem também, e as crenças das pessoas partiram daí e as crenças dos próprios miúdos.
(...)
Professor Pio de Abreu - Há pessoas que eu fico espantado... às vezes, nós os médicos, fazemos diagnósticos aquilo que queremos, porque nós perguntamos ao doente o que é que ele tem, diz-se "nós estamos a pensar num diagnóstico" O doente começa a dar os sintomas relacionados com esse, é o que a gente estava à espera, eles dizem-nos o que nós queremos sem a gente dizer... por isso é que eu digo "inadvertido". Basta que as pessoas estejam à espera de uma determinada resposta, para eles darem essa resposta, e isto são os mecanismos da sugestão."
(...)
Professor Pio de Abreu - (...) O Good Johnson tem o relato de algumas dessas situações que são verdadeiramente dramáticas. Eles estavam no corredor da morte. Se o entrevistador está convencido que certo acontecimento aconteceu, ele tenta apenas recolher evidência confirmatória e portanto, não questiona a pessoa, e depois não investiga as fontes da memória. Por exemplo: - pergunta à pessoa se este facto aconteceu, e não se ele viu ou se ele presenciou. Ora bem, isto é já uma pergunta de convicção... é possível que muitos destes miúdos estejam convencidos de que realmente as pessoas que foram arguidas, que realmente andaram nisso... embora, não tenham uma ideia muito clara se aconteceu com eles ou não, se eles presenciaram ou não... e eles sentem-se também em uma campanha, é o espírito de grupo, uma luta de sobrevivência... e eu compreendo a perspectiva deles, eles foram heróis, foram as pessoas mais importantes deste País, a certa altura. Basta eles estarem convencidos de que isso aconteceu, que estes arguidos estiveram em situações dessas, para eles dizerem que sim, que isso aconteceu e depois, acabarem por introduzir nas suas próprias memórias.
(...)
Professor Pio de Abreu - Existe, é a história da hipótese "Undeutsche" E essa hipótese diz o seguinte: - "declarações falsas, são diferentes em conteúdo de declarações verdadeiras". É uma hipótese que de qualquer modo não foi comprovada cientificamente, mas há muita gente que escreve sobre isso, porque isso é de facto o talismã, para as pessoas poderem perceber a tal veracidade do testemunho. Agora, todos são unânimes: depois de várias entrevistas, depois de várias inquirições, se eles viverem em espírito de grupo, não se consegue. Como é que se consegue saber se eles estão a dizer uma coisa que é forjada? Se eles usarem linguagem repetida, que não é deles... pode existir, eles agora têm 18 anos, já mais 5 anos sobre todos estes acontecimentos, portanto isso é muito difícil... mas, por exemplo o uso de expressões de linguagem, que é mais linguagem de adultos, que foi usada por adultos e que às vezes nós sabemos que foi usada por pessoas na própria televisão, a repetição dessa linguagem... isso não é linguagem espontânea, isso é uma coisa que se pode apanhar... eu detectei algumas vezes.
(...)
Professor Pio de Abreu - Normalmente, existe muito cuidado quando se fala destas histórias, porque uma história repetida num campo de dificuldades da memória, pode induzir as falsas memórias e as pessoas de tanto repetirem uma história acabam por acreditar nela. Eu posso dar um exemplo, posso ilustrar, eu posso perguntar por exemplo: - com quem jantou? Ou que jantou ontem? Ou jantares sociais, lembra-se com quem esteve? Pronto, as pessoas podem-se lembrar ou não. Mas, se eu a certa altura mostrar uma fotografia ou disser "fulano tal jantou consigo, você não se lembra?" E a certa altura, a pessoa de muito pensar nisso, acaba por se lembrar que essa pessoa jantou consigo, sobretudo se tiver uma fotografia actual e isso é claramente uma indução de falsa memória... eu estou a dizer em termos abstractos, porque foram feitas essas experiências.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - E isso aconteceu na avaliação que o senhor professor fez?
Professor Pio de Abreu - Ora bem... a avaliação mostra uma coisa que é estranhíssima. Para já, todas as pessoas acusadas... primeiro, os termos da acusação das pessoas não é linear, eles têm claramente desde o início, querem acusar certas pessoas e dizem, mas primeiro dizem que ouviram falar e passado algum tempo, eles dizem "eu vi fulano tal" e finalmente dizem "eu mantive contactos com ele". E isto, acontece imensas vezes. Esta estrutura é uma estrutura que para nós nos coloca a questão de a história ir sendo construída cada vez mais pormenorizadamente. Depois, a propósito das fotografias...também criando-se um clima emocional, é um modo de induzir, portanto existia um clima emocional claramente, que se induziram crenças e provavelmente falsas percepções não só nestes rapazes, mas em muita gente, ou seja, eu posso constatar pelo que vejo e até pela minha profissão, que muita gente acabou por ter percepções falsas e sobretudo convicções erradas, que são inabaláveis neste momento... nomeadamente quanto à culpa dos arguidos, mesmo dos que já foram libertados... a criação do clima emocional que sempre existiu, pressão dos miúdos. A utilização de fotografias... todas as pessoas que eram acusadas, à medida que iam aparecendo na televisão... a ponto de nas primeiras declarações sobre a casa de Elvas, o primeiro rapaz que fala sobre a casa de Elvas, diz que lá estavam as pessoas conhecidas, que eram o Carlos Cruz já na altura e um médico pediatra.
(...)
Professor Pio de Abreu - O que eu estava a tentar dizer, é como é que se consegue construir uma história, só isso. E a primeira vez que a história é colocada, é localizado na casa de Elvas, são localizadas na casa de Elvas, três pessoas: - o Carlos Cruz, o dono e o médico pediatra.
(Nota:Como é sabido, o médico pediatra apareceu na televisão mas nunca foi ligado a este Processo. Mas só porque apareceu na televisão logo no início, como autor de filmes de 8mm com miúdos, foi de imediato colocado na casa de Elvas pelo menos por JPL numa entrevista à TVI.)
Juíza Presidente - Basta dizer três pessoas.
Professor Pio de Abreu - O pediatra que tinha aparecido na televisão, ou seja tudo isto é da televisão, e se nós analisarmos toda esta construção da história, vamos vendo que ao longo do tempo, eles vão falando à medida que as pessoas vão aparecendo na televisão
(...)
... uma pessoa por exemplo, vê uma fotografia, portanto vê uma cena de um indivíduo que comete um crime, e depois tenta reconhecê-lo através de uma fotografia e uns podem reconhecer acertadamente e outros podem reconhecer erradamente. Aqueles que podem reconhecer erradamente... uma grande percentagem... podem estar pouco convictos ou muito convictos. Mas se o investigador disser "sim senhora, acertou nesse, era esse mesmo" o grau de convicção aumenta, e aumenta para valores incomensuráveis, a pessoa fica absolutamente convencida que era mesmo aquele e que não era outro, e fica mesmo estranhíssima se por acaso descobre que é outro... portanto, o grau de convicção é enorme. E isto é uma maneira de criar falsas memórias. De cada vez que eles foram repetidamente à polícia e que observavam a fotografia, eles iam aumentando o seu grau de convicção sobre a presença daquelas pessoas lá.
(...)
Dr. Ricardo Sá Fernandes - No início desta investigação, eles já estavam a depor na comunicação social e a afirmar que tinham sido vítimas. Que importância é que isto tem do ponto de vista psicológico, para aquilo que eles depois vão dizer ao processo?
Professor Pio de Abreu - É evidente que eles não podem dizer nunca que isso foi aldrabice, isto é a questão da vida deles. Aquela entrevista foi a questão da vida deles, eles nunca mais podem negar isso.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Olhe senhor professor, eu só tenho mais uma pergunta para lhe fazer. Se nós quisermos saber a verdade, verdadinha do que é que aconteceu neste processo, e no relato destes rapazes, é ou não imprescindível nós conhecermos... esqueça a limitação legal que lhe foi referida aqui várias vezes... mas se o tribunal quiser aproximar-se da verdade, precisa ou não precisa de conhecer as sucessivas declarações que eles prestaram no inquérito?
Professor Pio de Abreu - Tenho que as conhecer, tenho que perceber como é que esta história foi construída.
Juíza Presidente - Mas tem que conhecer só as respostas ou as perguntas?
Professor Pio de Abreu - Devia conhecer as perguntas, mas as perguntas não existem em lado nenhum, a não ser que tenham gravado os depoimentos, o que deviam ter feito.
Juíza Presidente - Mais alguma questão?
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Mas o conhecimento dessas declarações, tal como elas existem, não existem de outra maneira, isso é elemento imprescindível ou não para perceber o que é que aconteceu neste processo?
Professor Pio de Abreu - Sim, a não ser que queiram que a verdade seja apurada só depois do julgamento.
***
Já num Parecer sobre estas mesmas perícias, que se encontra no processo, o Professor Carlos Amaral Dias escreve, logo a abrir:
"As memórias são influenciadas por pessoas de confiança (em crianças, adolescentes ou adultos), especialmente pai e mãe, cuidadores, educadores, terapeutas, entre outras pessoas com quem tenham relações afectivas significativas e pessoas a quem seja atribuída autoridade (por exemplo polícias, juízes, alguns professores, etc.). Por estes motivos, médicos, psiquiatras e psicólogos devem manter-se neutrais, sem juízos de valor e empáticos para com a pessoa que relata acontecimentos de abuso sexual. Não devem exercer nenhuma pressão para a evocação do acontecimento, principalmente quando pode prejudicar relações significativas para a criança, adolescente ou mesmo adulto (American Psychiatric Association, 2003).
***
ALEGAÇÕES FINAIS
Em função de tudo o que se passou, o Dr. Ricardo Sá Fernandes, nas alegações finais, fez as seguintes afirmações sobre estas perícias:
As conclusões da perícia, das perícias da Dr.ª Alexandra Anciães com excepção do caso do NC em que ela de facto reconhece a existência de uma psicopatologia e portanto problemas cognitivos que podem interferir no testemunho, relativamente a todas as outras perícias esta ... é chapa 4: A ausência de psicopatologia grave, inexistência de perturbações do pensamento, percepção, memória e juízo crítico, coerência e consistência das descrições onde não se detectam erros grosseiros, aparente autenticidade das emoções que acompanham os relatos. Se relativamente aos 2 primeiros pontos, eu no geral estou de acordo, ausência de psicopatologia grave, ou perturbação de personalidade caracterizada por tendência à fabulação ou à fantasia, e isto porque pura e simplesmente não há nenhuma perturbação da personalidade caracterizada por isso; agora, que eles têm perturbações de personalidade têm, e a própria Alexandra Anciães aqui em tribunal o reconheceu relativamente, pelo menos, ao Francisco Guerra e ao JPL. Portanto esta ... esta ... esta conclusão é desmentida por ela própria aqui em audiência de julgamento. Mas o que é mais grave é esta expressão "coerência e consistência das descrições onde não se relatam erros grosseiros nem elementos que possam ser interpretados como factores de simulação ou de dissimulação", de onde ela depois de outra parte retira que existe veracidade nos relatos ... . (...) Portanto veracidade remete para a precisão e a verdade do relato, ora "isso não é possível de avaliar" diz ela, diz ela aqui.
Devo dizer que a Dr.ª Alexandra Anciães foi das pessoas que evoluiu. Enquanto outros não saíram do sítio onde estavam como o D. Pedro Strecht e em geral o Ministério Público, a Dr.ª Alexandra Anciães evoluiu.
A Dr.ª Alexandra Anciães começou por não perceber nada do que eram as técnicas da ciência, para apurar credibilidade de relatos e aprendeu e evoluiu, e revelou com muita humildade aqui na audiência de julgamento. Aquilo que nós avaliamos em termos periciais é a credibilidade do relato na sua globalidade. É só daquele. Podemos eventualmente depois fazer uma avaliação inter relatos. Neste caso não foi feita.
Eu pergunto, quando fez essas avaliações ... (imperceptível) ... a cometer um erro terminológico, pus ali veracidade, queria dizer credibilidade. "Tinha noção, são 2 realidades distintas foi erro meu, um erro meramente terminológico.", "Quando utilizou a palavra veracidade nos relatórios foi inadvertidamente?", "Exacto.", "Não está a emitir nenhum juízo de valor sobre se aquelas pessoas em concreto foram abusadoras ou não destes rapazes?", "Exacto."!
A posição é correcta. Todavia, não é verdade que a Dr.ª Alexandra Anciães tenha feito um mero erro terminológico. Eu percebo que ela tenha querido dizer isso aqui e não se pode levar a mal, mas de facto não fez um mero erro terminológico.Ela estava efectivamente equivocada, como revelam as suas declarações da Instrução de 31 de Março de 2004: ...a credibilidade tem a ver com a consistência ou coerência das declarações; ao referir veracidade quer dizer se a pessoa está ou não está a falar a verdade.
Ora bem, ela tem perfeita noção que quando escreveu nos relatórios credibilidade era a consistência das declarações e a veracidade é se está a falar a verdade e ela atestou uma e outra.
Portanto aqui a Dr.ª Alexandra Anciães faltou-lhe dar um passinho ainda, mas eu compreendo que não tenha dado. Todos temos ... todos, quando somos apanhados num erro, tentamos compor as coisas e ela tentou compor. E no essencial eu suponho que a Dr.ª Alexandra Anciães merece esta vénia da defesa. Tirando este aspecto ela deu um grande passo, o grande passo de reconhecer que fez o que não devia ter feito e eu fiquei com a certeza, tiro a palavra certeza ainda que aqui até a pudesse usar, de que efectivamente a Dr.ª Alexandra Anciães, se hoje fosse chamada a fazer novas perícias, não repetiria os erros que cometeu. Ela era uma pessoa muito inexperiente: "A Sr.ª Doutora já tinha feito alguma perícia de personalidade relativamente a um processo criminal, relativamente a vítimas de abusos sexuais?"- "Para vítimas de abusos sexuais não tinha.".
Como é que é possível confiar a uma jovem licenciada que não tinha nenhuma experiência de abuso sexual, nunca tinha feito nenhuma perícia num processo criminal, confiaram-lhe estas perícias? Toma lá logo 30 para fazer num mês. Isto é uma coisa de uma ... de um grau de irresponsabilidade.
"Não questionou os seus superiores? Neste contexto todo não é melhor termos mais tempo, pedirmos mais pessoas, pedirmos outras colaborações, questionou ou não questionou?", "Questionei sem dúvida, na altura questionei o meu Director de Serviço. A resposta que eu tive do meu Director é que teriam de ser feitas efectivamente por mim.", "não foi neste caso", (ela não obteve os elementos do processo com que habitualmente trabalha), "não por renúncia mas por aquilo que me foi dito, que não podíamos ter acesso a nenhuma peça processual por razões que decorrem da própria investigação, do próprio inquérito que estava na altura que seria ... não podíamos.".
O Sr. Procurador João Guerra não confiava no Instituto de Medicina Geral como não confiava na Polícia Pudiciária e portanto ele não podia dar-lhe os elementos porque podia haver uma fuga de informação e portanto ... poder haver, podia, mas quer dizer, quando as instituições funcionam com esta desconfiança, não é possível então ir lá "arranje-me aqui uma pessoa de toda a confiança", coisa de facto estranhíssima este procedimento que o Ministério Público adoptou neste processo.
"Como é que se pode avaliar se a exposição mediática influenciou ou não influenciou?", pergunta minha. - "Para isso tinha que ser feita uma avaliação dos depoimentos que eles fizeram na Polícia Judiciária antes da mediatização e depois daqueles que fizeram posteriormente ao nível policial", "Quer dizer, a Sr.ª Doutora teria que ver os processos da polícia?", "Sim, para avaliar a questão, sim. Para avaliar a questão da mediatização eu teria que ver os processos antes e os processos depois.", é ela que reconhece aqui.
Quanto à questão mediática: "Eu não tenho maneiras de avaliar isso, como é que eu avalio? Se tivesse lido os relatórios anteriores." "Não podemos saber se isto é o resultado da mediatização ou não", podia ter cá escrito", e eu pergunto: "Mas a Senhora não podia ter cá escrito isso?", e ela, com humildade, diz: "Podia!", "Se a Sr.ª Doutora tivesse elementos estaria em condições de produzir um relatório mais completo?", "Certo", "A única razão pela qual não se socorreu desses documentos foi porque não teve tempo?", "Exacto."!
"Aquilo que aqueles rapazes disseram pode ser tudo verdade, tintim por tintim, como pode ter acontecido que eles tenham trocado o nome dos abusadores?", "Sim."!
ESTADO DA CIÊNCIA
As memórias são influenciadas por pessoas de confiança (em crianças, adolescentes ou adultos), especialmente pai e mãe, cuidadores, educadores, terapeutas, entre outras pessoas com quem tenham relações afectivas significativas e, pessoas aquem seja atribuída autoridade (por exemplo polícias, juízes, alguns professores, etc). Por estes motivos, médicos, psiquiatras e psicólogos devem manter-se neutrais, sem juízos de valor e empáticos para com a pessoa que relata acontecimentos de abuso sexual (American Psychiatric Association, 2003) - cfr. Amaral Dias no parecer junto aos autos.
A ausência de patologia ou da evidência de declarações inconsistentes não autoriza nunca o perito a pronunciar-se pela veracidade das mesmas. Mesmo que a convicção formada pelo perito, no decurso da sua actividade específica, vá no sentido de acreditar que, globalmente, um relato é verdadeiro, o mesmo perito deve abster-se de o enunciar pois, para além de não dispôr de qualquer método que permita objectivamente demonstrá-lo, o mesmo não decorre directa e fundamentadamente da sua competência científica ou profissional e, até, porque se estaria a substituir ao juízo próprio do tribunal, construído sobre todos os factos apurados, testemunhos e outros elementos de prova produzidos - cfr. parecer do Colégio Português de Psiquiatria junto aos autos.
***
O não actuar tendo em conta estas exigências da ciência, ou é incompetente, ou desonesto ou (se estiver de boa fé) ignorância Não podemos deixar em roda livre as asneiras de pessoas empossadas de determinado poder só porque lhes foi atribuído esse poder. E muito menos quando estamos a lidar com processos que decidem a vida de uma ou mais pessoas.
A documentação que se segue é confrangedora. Arrisco mesmo afirmar que é ASSUSTADORA!
Num processo com esta dimensão, com este mediatismo, com esta responsabilidade criminal e social, a Acusação, protegida pelo monopólio do Instituto de Medicinal Lega para realizar perícias, que lhe é atribuído pelo Código do Processo Penal, cometeu o "crime" de "pactuar" com o IML a realização das perícias psicológicas por uma jovem psicóloga avençada, numa quantidade e com prazos que, desde o início, apontavam para a impossibilidade de um trabalho científico sério.
Pela sua experiência, pela posição profissional que ocupava, pela falta de meios e pelo pouco tempo concedido a Drª Alexandra Anciães jamais poderia ter sido responsável pelas perícias.
Após as perícias realizadas, e os pareceres emitidos, a Dr.ª Anciães entrou nos quadros do INML. Propositadamente? Não sei! Mas que é suspeito... é. Entre outras situações similares, lembra-me a escolha do Juiz Rui Teixeira que, de acordo com a lei não era o Juiz natural do Processo e que na noite de 31 de Janeiro para 1 de Fevereiro de 2003 decretou a minha prisão preventiva!
***
Logo na fase de Instrução, ficou bem clara a posição da Drª Alexandra Anciães. Perante a juíza Ana Teixeira e Silva declarou:
Portanto, teve que fazer um trabalho que nunca tinha feito e numa área que nem existia em Portugal. (E hoje?) Num processo desta importância e desta gravidade.
Bateria de testes, exame psiquiátrico e outras informações objectivas; detectar discrepâncias entre as declarações no inquérito e na perícia (FUNDAMENTAL!); falta de registo em áudio ou vídeo; transcrições parciais das declarações!
Isto é uma listagem assustadora de tudo o que não foi feito e era obrigatório fazer.
Pois mesmo nestas condições, a perita atreveu-se a tirar conclusões homologando a VERACIDADE dos relatos dos examinados por ela. Quádruplo erro: poucos testes, falta de comparação com declarações nos autos, transcrição parcial, uso do termo VERACIDADE!!!
E qual o critério das transcrições parciais? Que grau de subjectividade na escolha desses "bocados" das declarações? Que importância teria o que foi omitido? O que é que a perita "escondeu" ou "apagou"? Que possibilidade tem uma defesa de analisar as declarações a não ser aceitar o que a perita "escolheu"?
Ora aqui está uma confissão honesta. E mais uma razão para não escrever relatos parciais. Era fundamental comparar com o que tinha sido dito na PJ e descobrir se tinha ou não havido contaminação, histórias construídas sob influência de perguntas, etc., etc., etc. Todo a comunidade científica mundial sabe que é assim. Só Francisco Guerra, por exemplo foi ouvido 17 vezes! E, a propósito, vejamos o que disse a perita em julgamento, respondendo ao Ministério Público:
"Depois, o Francisco acaba por fazer então o relato dos factos na última sessão, mas faz o relato dos factos de uma forma "a despachar", ou seja... "Eu sei que tenho que dizer isto, então aquilo que aconteceu foi isto, isto, isto e isto..."; assim, não de uma forma natural, como quem faz... como os outros jovens, por exemplo, mas de uma forma que queria quase desembaraçar-se daquilo, pôr cá para fora, assim de uma forma repentina.
Eu lembro-me, por exemplo, em relação aos alegados abusadores - e eu perguntei-lhe se ele sabia quem era, porque ele não falava sobre isso... eu perguntei-lhe se ele reconhecia, se sabia quem eram - ele diz: "foi este, este, este e este...!", tal e qual desta forma que eu estou a dizer. Não houve alguma reflexão da parte dele, não foi ponderado... Enquanto que os outros pensavam... elaboravam... digamos que faziam um relato de uma forma elaborada, o Francisco não; o Francisco queria meramente despachar-se daquilo..."
Ministério Público: Sra. Dra., face ao que está a dizer é lícito concluir que o Francisco teria dito qualquer coisa para se ver livre daquilo?
Alexandra Anciães: Pode
ter dito coisas para se ver livre daquilo, pode.
***
A Drª Alexandra Anciães, já no Debate Instrutório, não conseguiu ocultar algumas fragilidades. Poucas, mas suficientes para, pura e simplesmente, se poder afirmar que as Perícias Psicológicas deste Processo são uma mistificação, uma nulidade, um exemplo dramático de como não se fazem perícias. Incompetência? Encomenda? Ignorância? Má-fé? - Não sei.
Erradas? Sem, qualquer valor científico? Sem valor probatório? - Sem dúvida.
A Comunicação Social não entendeu assim: engoliu o que lhe deram e mastigou tudo para depois cuspir sobre a opinião pública a ideia [falsa] de que as perícias atestavam a verdade (veracidade) dos testemunhos. O que a própria perita vem a desmentir em Julgamento, no Tribunal, como veremos.
***
Durante o Julgamento, o erro, a asneira, a mistificação, a falsidade acabaram por ficar completamente evidentes: por honestidade (finalmente) ou por não poder fugir à verdade, a Dr.ª Alexandra Anciães, retratou-se bastante.
Ao Ministério Público deu, entre outras, as seguintes respostas:
-"Portanto, o Prof. Mendes Pedro ficou com os jovens com menos de 16 anos, e eu fiquei com os jovens para cima de 16 anos, inclusive"
-"Primeiro, houve logo um pedido de urgência feito pelo DIAP. Portanto, pelo menos aquilo que me foi transmitido a mim é que eu teria um espaço muito limitado de tempo, nomeadamente cerca de um mês e meio, para fazer as perícias que tinham sido solicitadas. E isso levou a que tivesse que desenvolver de alguma forma algumas estratégias, porque era quase impensável fazê-lo neste espaço de tempo."
-"Depois também a questão da uniformização metodológica também teve a ver com a indisponibilidade de instrumentos no IML. Ou seja, o IML até à data - portanto, até à data das avaliações - trabalhava quase exclusivamente com adultos e portanto, embora existissem instrumentos para crianças... eram crianças mais pequenas, não havia ninguém na altura que trabalhasse com eles... não havia, digamos, instrumentos de avaliação dirigidos especificamente a esta... a este grupo. Portanto, ou seja, para dar um exemplo, foi utilizado o MMPI... E depois se calhar podemos entrar mais nessas questões mais específicas... Foi utilizado o MMPI; poderia eventualmente, se fosse hoje, ter sido utilizada a versão para adolescentes que já existe." (Nota: não foram utilizados os testes adequados)
-"Sim, aquilo que se averiguou, depois no contexto da entrevista, é que a denúncia nunca partiu dos miúdos. (Nota: foram então escolhidos...!) Portanto, os miúdos não denunciaram voluntariamente a situação, ou seja, não foram num momento qualquer das suas vidas dirigir-se à Polícia, ao MP ou a alguém para fazer a denúncia".
-"Depois, a maior parte dos sujeitos, como eu já referi, não sabiam àquilo que iam. Eram muitas vezes retirados pela Polícia Judiciária da cama de manhã - porque foram sempre levados pela Polícia Judiciária, pelo menos que eu tenha tido conhecimento - eram retirados, por exemplo, de manhã da cama, apareciam-me muitas vezes sem pequeno-almoço ou sem almoço... (Conviria ter os jovens fragilizados para "confessarem" tudo? Não era PIDE que fazia isso aos cidadãos?) Portanto, imaginem o que é que é nós começarmos entrevistas às 9 da manhã e as crianças ou os jovens não terem tomado o pequeno-almoço... muitas vezes era necessário ali fazermos uma pausa para que os sujeitos fossem tomar o pequeno-almoço ou para almoçarem, para comerem qualquer coisa... Depois também o facto de ou não serem avisados das perícias em concreto, daquilo que iam fazer, e dos dias em que isso ia ocorrer... fazia com que muitos tivessem, por exemplo, compromissos com outros amigos, etc., e que ficassem no fundo um pouco frustrados por não poderem ir a esses compromissos... O facto também de terem feito anteriormente um exame de natureza sexual que é intrusivo... o próprio exame tem um carácter de intrusividade... e que não terá deixado, provavelmente - isto é uma suposição minha - boas lembranças naqueles jovens..."
-"Todos estes motivos fizeram com que houvesse algumas condicionantes... Não que invalidassem a recolha de elementos, mas as quais são importantes para se perceber alguns... algumas das questões que depois aparecem. Por exemplo, estes sujeitos não estavam motivados... Imaginem o que é que é um jovem ser de repente submetido a 5 horas de entrevista, dentro das quais se pergunta mais uma vez o que é que lhe aconteceu, quando ele já fez não sei quantas inquirições na Polícia Judiciária ou outras instâncias... de repente tem que repetir tudo novamente, ainda para mais a uma técnica do sexo feminino, o que também não é fácil..."
-"Não foi seguido neste caso, não por renúncia da nossa parte, mas porque aquilo que me foi dito a mim é que nós não poderíamos ter acesso a nenhuma peça processual (Nota: material indispensável segundo a ciência em vigor em todo o mundo) por questões... eu penso que decorrentes da própria investigação, do próprio inquérito que estava a haver na altura, e portanto... ou seja, seria por essa questão que nós não poderíamos ter acesso.
-"Isso foi aquilo que me foi informado pelo meu Director de Serviço. Nós não poderíamos ter, neste caso, acesso às peças processuais. Por outro lado, outra das questões que também não tivemos acesso foi às famílias dos sujeitos, ou mesmo aos outros relatórios sociais, porque esses geralmente estão integrados no processo... mas há as questões da família..." (Nota: idem)
-"Depois, a veracidade. De facto, foi introduzida de forma inadvertida por nós, e isto decorre... porque alguns investigadores, sobretudo em Portugal, fazem o termo... ou seja, a tradução que fazem do termo "credibilidade", utilizam como se fosse veracidade. E isso deu azo a que realmente houvesse aqui alguma confusão, e era bom esclarecer essa confusão. Portanto, veracidade remete para a precisão e a verdade do relato; e isso não é possível avaliar." (Nota: portanto, por um mero erro de tradução, escreve-se que o relato é verdadeiro! E pronto!)
"Ministério Público: (...) Nas perícias que a Sra. Dra. fez... há algumas diferenças, mas em todas elas aparece... ou em quase todas elas, na maioria delas - eu já vou referir quais - nas conclusões, aparece este parágrafo: "Assim, sem prejuízo das reservas atrás expressas, somos levados a admitir a veracidade global do relato... com base nos seguintes elementos de ordem clínica e psicométrica...". Portanto, a palavra é também adoptada; o termo "veracidade" também é adoptado e utilizado nas perícias. O que eu peço à Sra. Dra. é então, em função do que está a dizer, como é que isto deve ser lido, como é que isto deve ser interpretado, qual foi o sentido atribuído a esta expressão?
Alexandra Anciães: Não devia estar... O termo "veracidade" não devia estar, de maneira nenhuma, aí escrito. E portanto isso é um erro nosso, um erro da nossa parte, que assumimos. Aquilo que devia estar escrito de qualquer forma teria sido sempre a credibilidade do respectivo relato, nunca a veracidade."
"Depois também não se pode excluir a questão da contaminação pós-evento, ou seja, tudo aquilo que eles possam ter ouvido depois disso... até porque é um caso bastante mediatizado, falado publicamente, e portanto não se pode nunca retirar esse efeito. Há sempre a possibilidade de contaminação dos acontecimentos e de inclusão até de outras coisas que não tenham sido vivenciadas."
É portanto notória a evolução da Drª Alexandra Anciães. E é de louvar que, em função dessa evolução, ela reconheceu a fragilidade (nulidade) das partes mais importantes do seu relatório: jamais poderia ter escrito VERACIDADE, podia ter havido CONTAMINAÇÃO, nunca teve ACESSO ÀS PEÇAS PROCESSUAIS nem AOS ELEMENTOS FAMILIARES. E, digo eu, nem aos PROCESSOS INDIVIDUAIS da CASA PIA.
Aliás, veja, clicando aqui, o que disse o Professor Costa Santos (alto quadro do IML, hoje Director da delegação de Lisboa) também em Tribunal, sobre esta matéria.
Leia também, clicando aqui, o que disse o Professor Pio Abreu, de Coimbra, eminente Psiquiatra com projecção internacional.
***
Vejamos agora o que a Drª Alexandra Anciães respondeu ao Dr. Sá Fernandes. Mas como preambulo comecemos com as conclusões das suas perícias:
Estas conclusões são comuns (copy/paste) a praticamente todos os relatórios da Dr.ª Alexandra Anciães.
Em Julgamento, instada por Sá Fernandes:
Dr. Sá Fernandes - E a pergunta que eu faço à Sra. Dra. é se, quando fez estas avaliações, limitou-se a cometer aqui assim um erro terminológico, e onde pôs ali "veracidade" queria pôr "credibilidade"; ou se, pelo contrário, não tinha noção de que eram duas realidades distintas...?
Dra. Alexandra Anciães - Não, tinha... Tinha, tinha noção... São duas realidades distintas e, portanto, foi um erro meu mesmo... em termos de terminologia. Não devia ter sido feito de forma nenhuma, foi um erro.
Dr. Sá Fernandes - Um erro meramente terminológico?
Dra. Alexandra Anciães - Sim.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Por outro lado, também é naturalmente muito importante a consciência do erro de que, quando utilizou a palavra "veracidade" nos relatórios, utilizou-a inadvertidamente e, portanto, se fosse hoje não a teria escrito...
Dra. Alexandra Anciães - Exacto.
Dr. Sá Fernandes - Quando se refere à credibilidade, refere-se a uma coerência global dos relatos que lhe fizeram...? Quando se refere à credibilidade destas pessoas...
Dra. Alexandra Anciães - Não das pessoas, Sr. Dr.
Dr. Sá Fernandes - Então...
Dra. Alexandra Anciães - Não das pessoas. Eu nunca... Eu não estou a credibilizar as pessoas. Eu estou a credibilizar o relato, e o relato individual de cada um numa primeira instância.
Dr. Sá Fernandes - Quando se refere à credibilidade do relato, quer-se referir à credibilidade global do relato...?
Dra. Alexandra Anciães - Exacto.
Dr. Sá Fernandes - Ou seja, não está a emitir nenhum juízo de valor sobre se aquelas pessoas em concreto que estão ali identificadas foram efectivamente, ou não foram, abusadores destes rapazes?
Dra. Alexandra Anciães - Exacto.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Não é isso... A Sra. Dra. já tinha feito alguma perícia de personalidade, para um processo criminal, relativamente a vítimas de abusos sexuais?
Dra. Alexandra Anciães - Perícias sobre personalidade para processo criminal, já tinha.
Dr. Sá Fernandes - Para vítimas de abusos sexuais?
Dra. Alexandra Anciães - Para vítimas de abusos sexuais, não tinha. Nem eu, nem acho que quase ninguém em Portugal, porque antes deste processo existiam poucos pedidos vindos exactamente do sistema judicial.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Sra. Dra., eu só quero saber o seguinte. Questionou-se? Colocou aos seus superiores... dizendo: "Não, acho que é melhor virem outras pessoas; ou mais pessoas. Eu sozinha não"? Se a Sra. Dra. os fez é porque acabou por entender que estava em condições de os poder fazer, como é evidente; senão não os tinha feito. Mas antes de os ter feito, quando lhe é pedido isto... A pergunta que eu lhe ponho é esta: não questionou os seus superiores, e disse: "Neste contexto todo, não é melhor termos mais tempo, pedirmos mais pessoas, pedirmos outras colaborações...?" Questionou ou não questionou?
Dra. Alexandra Anciães - Questionei. Sem dúvida.
Dr. Sá Fernandes - Quem é que questionou?
Dra. Alexandra Anciães - Na altura questionei o meu Director de Serviço.
(...)
Dra. Alexandra Anciães - A resposta que eu tive do meu Director é que teriam que ser feitas efectivamente por mim... E logo aí eu coloquei a questão da nuance dos 16 anos, e eu recusei-me mesmo a fazer as perícias a menores de 16 anos... E ele disse-me que tinham que ser efectivamente feitas por mim, porque não havia no exterior... - como é que eu hei-de dizer isto? - não havia... podia haver... digamos, podiam não ser isentas as perícias feitas no exterior, exactamente pela mediatização do processo, e, digamos, pelo facto de serem vários arguidos, de conhecerem várias pessoas em vários locais... Portanto, digamos que para haver uma maior imparcialidade e objectividade neste processo, seria mais indicado serem feitas internamente. E sendo feitas internamente, a pessoa mais indicada para as fazer era eu. Pelo menos foi isto que me foi referido...
(...)
Dra. Alexandra Anciães - Não foi seguido neste caso, não por renúncia da nossa parte, mas porque aquilo que me foi dito a mim é que nós não poderíamos ter acesso a nenhuma peça processual, por questões... eu penso que decorrentes da própria investigação, do próprio inquérito que estava a haver na altura, e portanto... ou seja, seria por essa questão que nós não poderíamos ter acesso. Isso foi aquilo que me foi informado pelo meu Director de Serviço. Nós não poderíamos ter, neste caso, acesso às peças processuais. Por outro lado, outra das questões que também não tivemos acesso foi às famílias dos sujeitos, ou mesmo aos outros relatórios sociais, porque esses geralmente estão integrados no processo... mas há as questões da família...
(...)
Dr. Sá Fernandes - Portanto, podia saber, ou podia ter avaliado, quando fez aquelas avaliações... ter carreado elementos concretos para as avaliações que fez sobre a possibilidade ou não de a exposição mediática destes homens, prévia à sua avaliação, ter influenciado aquilo que eles lhe disseram.
Dra. Alexandra Anciães - É que isso não é possível de avaliar, Sr. Dr.. É assim... Nós... coloca-se sempre essa hipótese. Agora, como é que se pode avaliar se essa exposição mediática influenciou ou não? Para isso teria que ser feita uma avaliação dos depoimentos que eles fizeram na Polícia Judiciária antes da mediatização, e depois aqueles que eles fizeram posteriormente, nomeadamente ao nível do exame pericial. Portanto eu não tenho condições, na altura em que os faço, de avaliar... Não é que eu não me tenha interrogado! Claro que interroguei, até porque nós ligávamos a televisão e em qualquer canal, a qualquer hora, o caso era falado! Agora o que não temos é uma forma objectiva de o avaliar!...
Dr. Sá Fernandes - Quer dizer que a Sra. Dra. teria que ter visto os processos da Polícia Judiciária para...?
Dra. Alexandra Anciães - Por exemplo... sim; para avaliar essa questão sim.
Dr. Sá Fernandes - Mas isso então era mais uma razão para a Sra. Dra. ter insistido, junto de quem lhe pediu os relatórios, que não estava em condições de poder produzir aqueles relatórios sem ver, sem ter acesso àquilo que, nos outros casos todos que a Sra. Dra. fez, tinha!
Dra. Alexandra Anciães - Sr. Dr., a questão da insistência é muito engraçada porque não é bem assim que as coisas se passam...! Ainda agora há pouco tempo tive um caso que estou a ver um sujeito já por duas vezes... um homicídio... um homicídio violento... estou farta de insistir com o MP que preciso de ter o processo, porque sem o processo, eles fazem uma série de quesitos e eu não posso responder, porque nem sequer sei o que é que o sujeito fez... soube através de uma tradutora... e o MP neste caso, por exemplo, continua a insistir que é muito complicado, é muito complicado, é muito complicado...! E isto é o dia-a-dia!
Nota: o Ministério Público, para as perícias, ambas físicas e psicológicas, nega o acesso às peças processuais indispensáveis para os peritos poderem fazer um trabalho decente. Entretanto, na Comunicação Social são publicadas parcialmente essas mesmas peças, de forma seleccionada cirurgicamente, orientando a opinião pública no sentido que mais convém à Acusação!
(...)
Dr. Sá Fernandes - Quanto à questão mediática...?
Dra. Alexandra Anciães - Não tenho maneiras de avaliar isso; como é que eu avalio? Já referi ainda há bocado...
Dr. Sá Fernandes - Só se tivesse tido os relatórios anteriores...
Dra. Alexandra Anciães - Exactamente. Depois ainda há a questão dos cuidadores; dos Pais, dos familiares, etc. Um dos motivos por que não foram feitas entrevistas com os cuidadores foi exactamente pelo facto de eles dizerem que os cuidadores não sabiam das questões. Portanto, não houve... Ao não saberem, não há uma troca de informação; não há uma possibilidade de sugestão. Portanto, foram colocadas estas hipóteses. É claro que se calhar, se me perguntar - e se calhar foi isso que me perguntou - se devia constar do relatório essa exclusão de hipóteses, se calhar devia.
Dr. Sá Fernandes - Se calhar... ou devia?
Dra. Alexandra Anciães - Se calhar devia. Ou devia, pronto, posso assumir que devia. Não está. Mas não quer dizer que não tenha sido feita.
Dr. Sá Fernandes - Foi feita em relação aos pares. Relativamente...
Dra. Alexandra Anciães - Em relação aos pares, em relação aos cuidadores...
Dr. Sá Fernandes - Relativamente à comunicação social, não podia.
Dra. Alexandra Anciães - Não é possível avaliar.
Dr. Sá Fernandes - Podia ter cá escrito: "Não podemos saber se isto é o resultado da mediatização ou não". Podia ter cá escrito isso?
Dra. Alexandra Anciães - Podia.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Portanto, se a Sra. Dra. tivesse tido estes elementos, estaria em condições de produzir um relatório que em teoria seria mais completo, mais exaustivo, mais rigoroso?
Dra. Alexandra Anciães - Certo.
Dr. Sá Fernandes - A única razão pela qual não se socorreu desses elementos foi porque não teve tempo e porque eles não lhe foram facultados?
Dra. Alexandra Anciães - Exacto. Porque não foram facultados... não. A questão do tempo... se me fossem facultados, poderia não ter tempo para ver tudo...
Dr. Sá Fernandes - Por outro lado - a Sra. Dra. já disse aqui - aquilo que aqueles rapazes disseram pode ser tudo verdade, "tim-tim por tim-tim", como pode ter acontecido que eles tenham trocado o nome dos abusadores por outras pessoas... Sim, não é?
Dra. Alexandra Anciães - Sim.
(...)
Dra. Alexandra Anciães - Sim, podia. Em termos dos Pais podia ser feito, e foi feito; em termos das polícias... é assim, não tenho meio de avaliar como é que eles fazem as entrevistas, portanto... eu penso que eles seguem os protocolos... A Polícia Judiciária seguirá os protocolos... (Ver artigo sobre Procedimentos. Esta mais uma razão para os incluir no êmbito da Perícias Psicológicas)
Dr. Sá Fernandes - Quais protocolos?
Dra. Alexandra Anciães - Os protocolos que existem em termos de interrogatório das testemunhas, de modo a que não hajam questões sugestivas, questões repetidas, por aí fora.
Dr. Sá Fernandes - Mas esses protocolos existem onde, Sra. Dra.?
Dra. Alexandra Anciães - Existem pelo menos na literatura.
Dr. Sá Fernandes - E a Sra. Dra. sabe se a Polícia conhecia essa literatura?
Dra. Alexandra Anciães - Não. Mas presumo que tenha. Isso seria colocar em causa todas as instituições, Sr. Dr. Isso seria eu avaliar... Então nesse caso também teria que avaliar se a Polícia Judiciária também fez um bom reconhecimento ou não dos sujeitos... Isso não compete à perícia, de maneira nenhuma! Isso compete depois ao Tribunal reunir esses elementos, ouvidas as pessoas em concreto.
Dr. Sá Fernandes - Mas a Sra. Dra. partiu do princípio de que a Polícia tinha seguido esses protocolos, e que os conhecia?
Dra. Alexandra Anciães - Claro. E cabe ao Tribunal depois fazer uma avaliação... quando questiona a Polícia Judiciária, e ver se seguem os protocolos ou não. Não me cabe a mim, como perita - neste caso em concreto, e tendo o objecto de perícia a personalidade e a capacidade e a credibilidade - fazer uma avaliação desse tipo. Não sou investigadora policial!...
Já aqui publiquei e repito, para ajudar a memória: em Tribunal, Dias André disse que foi seguido o Manual da APAV mas Rosa Mota disse que foi seguido o Manual da Interpol. Este, não é um Manual tão pouco. Só que, todos os inspectores foram peremptórios que não seguiram Manual nenhum e nem conheciam a existência do Manual da APAV. Dias André e Rosa Mota mentiram! (Ver artigo "Procedimentos")
(...)
Dra. Alexandra Anciães - Sim, aquilo que se averiguou, depois no contexto da entrevista, é que a denúncia nunca partiu dos miúdos. Portanto, os miúdos não denunciaram voluntariamente a situação, ou seja, não foram num momento qualquer das suas vidas dirigir-se à Polícia, ao MP ou a alguém para fazer a denúncia.
(...)
Dra. Alexandra Anciães - (...) Depois também não se pode excluir a questão da contaminação pós-evento, ou seja, tudo aquilo que eles possam ter ouvido depois disso... até porque é um caso bastante mediatizado, falado publicamente, e portanto não se pode nunca retirar esse efeito. Há sempre a possibilidade de contaminação dos acontecimentos e de inclusão até de outras coisas que não tenham sido vivenciadas.
(...)
Dr. Sá Fernandes - (...) A Sra. Dra. admite ou não admite que, quando estes rapazes nas descrições que fizeram colocam estas pessoas e não outras, podem ter sido objecto de sugestão, de contaminação, de influências várias?...
Dra. Alexandra Anciães - Eu não sei quando é que eles fizeram os depoimentos, se foi antes ou depois da exposição mediática. Isso era importante avaliar, porque quando começa a haver uma exposição mediática e os arguidos começam a ser expostos, é porque já houve alguma denúncia para que eles fossem de alguma forma indicados...
Dr. Sá Fernandes - Sra. Dra., vamos caminhar para hipóteses: denunciaram-nos depois da exposição mediática.
Dra. Alexandra Anciães - Então aí pode haver influências, claro; sem dúvida nenhuma.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Sra. Dra., pronto... Fica-lhe bem...! Olhe, Sra. Dra., diga-me outra coisa. O Francisco Guerra tem ou não tem traços de personalidade "borderline"?
Dra. Alexandra Anciães - Tem.
Dr. Sá Fernandes - E onde é que isso é referido no relatório?
Dra. Alexandra Anciães - Isso é referido ao longo da descrição da personalidade.
Dr. Sá Fernandes - Mas onde é que é dito que ele tem traços "borderline"?
Dra. Alexandra Anciães - Pode não ter sido dito, mas é referido os vários... digamos, os vários... as várias características que formam traços "borderline", e quando fui inquirida a 31 de Março referi isso.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Sra. Dra., e outros traços de outras perturbações que a Sra. Dra. também tenha...?
Dra. Alexandra Anciães - Sim... Tem características narcísicas e anti-sociais também.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Eu percebo... Admito que se possa entender que há aqui alguma... implicitamente... ainda que não expressamente... Sra. Dra., diga-me uma coisa. Falou de traços borderline, de traços de personalidade anti-social e traços de personalidade narcísica. Que perturbação é que é essa, a perturbação narcísica? Como é que...? Também está descrita no DSM...?
Dra. Alexandra Anciães - Está. Eu posso dizer... só um segundo... Portanto, é um padrão global de grandiosidade; é a fantasia ao comportamento; necessidade de admiração e ausência de empatia, com começo no início da idade adulta e presente numa variedade de contextos... entre os quais sentimentos de grandiosidade, de auto-importância; preocupação com fantasias de êxito ilimitado: poder, brilhantismo, beleza ou amor ideal; crença de que se é especial e único e que, por isso, só se pode ser compreendido por, ou estar associado com pessoas ou instituições especiais e de elevado estatuto; necessidade de admiração excessiva; sentimentos de ser reverenciado, por exemplo, expectativas não razoáveis de tratamento especial... especialmente favorável ou adesão automática ao que espera; tirar partido dos outros, por exemplo, utilizar os outros para atingir os seus próprios fins; ausência de empatia; inveja; demonstrações de arrogância em comportamentos, etc.
Dr. Sá Fernandes - Sim senhora. E como é que isso se reflecte no relatório... Como é que isso está reflectido no relatório que a Sra. Dra. fez?
Dra. Alexandra Anciães - Aliás esses, por acaso, estão referidos mesmo como traços narcísicos...
Dr. Sá Fernandes - Onde...?
Dra. Alexandra Anciães - Porque estes, eu acho que é aqueles que se salientam mais, mesmo no Francisco...
(Sobre JPL)
Dr. Sá Fernandes - ...Sendo certo que a personalidade "borderline" é já de si uma perturbação... Era assim que eu lia, mas se calhar estou a ler mal... Portanto, quer dizer, pode-se ter uma personalidade "borderline" e não se ter uma perturbação da personalidade "borderline"...?!
Dra. Alexandra Anciães - Se não estiver desadaptado, não tem.
Juíza Presidente - Se não estiver...?
Dra. Alexandra Anciães - Desadaptado; se não houver uma desadaptação.
Dr. Sá Fernandes - Então diga lá, este senhor tem a perturbação da personalidade ou não tem?
Dra. Alexandra Anciães - Deixe-me ver, Sr. Dr.
Dr. Sá Fernandes - Então respondia só a essa pergunta e a seguir, Sra. Dra., podíamos fazer um pequeno intervalo. Portanto, a pergunta é se tem... se além da personalidade, que a Sra. Dra. já disse que tinha, se tem uma perturbação da personalidade; coisa que eu julgava que era a mesma coisa, mas pelos vistos não é!...
Dra. Alexandra Anciães - Sim, podemos considerar que sim, que existe uma perturbação da personalidade estado-limite.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Tudo é possível... E a Sr. Dra. não tem elementos... até porque fez estes relatórios com a falta de elementos... não tem elementos para explicar porque é que ele omitiu a referência ao Mike...?
Dra. Alexandra Anciães - Não, não tenho.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Oh Sra. Dra., e não pode ser também porque, entre Março... 10 de Março, e Julho de 2003, ele passou a ver na comunicação social, nas conversas com os amigos, nas conversas com a Polícia, no frufru que se gerou à volta disto... a ideia de que o Sr. Carlos Cruz também estava em Elvas, e o Paulo Pedroso estava em Elvas... e então foi preciso lá pôr... No processo mental que eu desconheço, ele pôs... teve que lá pôr, o Carlos Cruz... Isto também não é uma explicação?...
Dra. Alexandra Anciães - Também pode ser.
(...)
Dr. Sá Fernandes - (...) Já vimos que... No LM vimos há bocado que ele, ao Dr. Costa Santos, disse que só via caras; à Sra. Dra. pôs lá o Carlos Cruz... Aqui no LD, ele põe o Carlos Cruz... não põe o Carlos Cruz; aqui em Tribunal pôs... Estas dessincronias não lhe suscitam nenhuma dúvida?...
Juíza Presidente - Para a sua avaliação...
Dr. Sá Fernandes - Na sua avaliação...
Juíza Presidente - Para a que fez na altura...
Dra. Alexandra Anciães - Eu, na altura, fiz uma avaliação...
Dr. Sá Fernandes - Não, mas agora... com esta informação...
Juíza Presidente - Não...! Para a sua avaliação do que fez... Agora eu utilizei mal as palavras... do que fez na altura...
Dra. Alexandra Anciães - É assim... Se não incluiu o Sr. Carlos Cruz, e se o incluiu agora, provavelmente... ou alguma referência que ele não se lembrava na altura em que me referiu; ou não quis referi-la deliberadamente e referiu posteriormente... Não sei, Sr. Dr., eu não posso avaliar isso...
Dr. Sá Fernandes - Ou está a mentir!?...
Dra. Alexandra Anciães - Pode estar, Sr. Dr.
(...)
Dr. Sá Fernandes - Mas põe a hipótese...? Uma das hipóteses que tem que pôr é de ele estar a mentir...?
Dra. Alexandra Anciães - Quando nós fazemos uma avaliação da credibilidade pomos todas as hipóteses. São várias. Desde que a pessoa está a falar a verdade, mas que substituiu o abusador por outra pessoa - portanto, o relato é credível mas substitui-se o abusador por outra pessoa -; o relato é na sua globalidade credível, mas tem partes que não são... portanto, que já foram acrescentadas posteriormente, por exemplo; a influência de alguém... o facto de ter sido influenciado por alguém; o facto, por exemplo, de haver uma motivação por vingança é outra das questões; são várias... Motivos de vingança, benefícios pessoais... também para ajudar alguém, ou para proteger alguém... Portanto nós, quando fazemos uma avaliação da credibilidade, temos que ter sempre estas questões todas presentes.
Dr. Sá Fernandes - Portanto, perante uma situação destas como eu descrevi, a Sra. Dra. tinha que equacionar estas várias...?
Dra. Alexandra Anciães - Claro.
Dr. Sá Fernandes - ...Teria que equacionar estas várias hipóteses?
Dra. Alexandra Anciães - Antes de...
Dr. Sá Fernandes - Antes de concluir... Podia ser porque tinha trocado a pessoa do abusador, podia ser por influência de alguém, podia ser para proteger alguém, podia ser por uma motivação por vingança... enfim, podia ser por um conjunto variadíssimo de situações...?
Dra. Alexandra Anciães - Exacto.
Embora estejamos a tratar agora das Perícias Psicológicas, resolvi incluir, nesta sequência, transcrições das declarações de todos os Inspectores da PJ que participaram no Processo.
Parece deslocado mas não o é, por uma razão: como o leitor terá ocasião de ver, as Perícias Psicológicas foram feitas contra todas as regras exigíveis pela Ciência que se preocupa com a descoberta da Verdade. Ora, as inquirições das vítimas ou alegadas vítimas (os assistentes) também tem que obedecer a regras. Mais: foi afirmado que na PJ existem manuais com essas regras. E nenhuma delas foi seguida. Este o grande ponto comum entre os procedimentos da PJ e os da perita. Desde o início, as medidas recomendadas em todo o mundo civilizado foram sobranceiramente ignoradas. Por isso aqui publico estes elementos: a mentalidade que presidiu a este Processo é a mesma, na PJ e no Instituto de Medicina Legal.
Mas o Tribunal, que integra um Juiz que foi da PJ e colega da Inspectora Coordenadora Rosa Mota, diz no Acórdão que:
"analisou os depoimento dos inspectores da Polícia Judiciária com objectivo de despistar e isolar indícios da possibilidade ou da eventualidade de contribuição dos Inspectores da Polícia Judiciária, com os actos e diligências que efectuaram na fase de Inquérito, para a criação de uma "história" vertida na Acusação e posteriormente no Despacho de Pronúncia.
Analisada a actuação de 5 dos Inspectores da Polícia Judiciária, o tribunal não encontrou indícios, que sustentem uma preparação, condução ou de qualquer forma conjugação por parte da Policia Judiciária, dos depoimentos que vieram a ser prestados em audiência de julgamento pelos jovens identificados como vítimas.
A análise feita por este tribunal baseia-se na análise dos depoimentos de 5 inspectores. Nenhum destes inspectores ocupava um cargo de chefia, sendo por conseguinte meros executantes ou operacionais sem qualquer tipo de liberdade de análise crítica do que estava a acontecer."
Vejamos então os depoimentos da equipa da PJ e os seus procedimentos:
Cristina (Maria Pinto) Correia
Advogada -Sr.ª Inspectora, nos 20 anos que trabalha nos abusos sexuais, a investigação feita foi sempre desta forma ou tinha alguma autonomia relativamente às diligências que entendia que devia fazer depois de ouvir uma ou duas testemunhas, enfim, de fazer as diligências de recolha de prova que entendesse?
Cristina Correia-Para si e para o tribunal isto pode parecer irrelevante, mas para mim é a pura verdade, eu nos 20 anos de casa, de Polícia Judiciária, tive sempre muita sorte, eu chamo-lhe sorte, porque tive a possibilidade de trabalhar com uma grande autonomia pelos chefes que tive sempre distribuídos, não é, ou que me calharam ou a quem eu calhei, mas sei que alguns dos meus outros colegas, de outras brigadas, de outras secções, com outros chefes, com outros coordenadores não tiveram a minha sorte, e portanto, há um método de trabalho que para alguns chefes é assim que funciona, pronto, eles distribuem as tarefas, distribuem quem faz o quê, e as pessoas fazem isso mesmo. Comigo nunca se tinha passado.
Advogada -Até este processo?
Cristina Correia-Sim.
***
O Tribunal também não valorou na sua análise, entre outros, o depoimento do elemento mais experiente da equipa de profissionais da Policia Judiciária - a inspectora Cristina Correia que viria a revelar importantes considerações sobre como decorreram os interrogatórios na Policia Judiciária. O Tribunal fixou-se apenas nos depoimentos daqueles agentes que menos descreveram a investigação escondendo-se atrás de respostas "não me lembro" ou "não me recordo".
(Nota: curiosamente, a Inspectora Cristina Correia, alegando razões de ordem pessoal, abandonou a brigada antes do Inquérito chegar a meio)
Tampouco ouviu os magistrados do Ministério Publico que desde cedo dirigiram esta investigação.
Mais importante é que, na sua análise, não se refere aos procedimentos (ou à falta deles) no que toca à inquirição dos assistentes. Também não refere como está organizada e como operou a brigada da Policia Judiciaria.
Mas ainda considerou como normais e coerentes as recorrentes falhas de memória que varreram a equipa que investigou o mais mediático processo que Portugal alguma vez conheceu e por ventura conhecerá.
Em relação aos procedimentos que seguiram ou deveriam ter seguido ficam os relatos dos intervenientes, na primeira pessoa, para que o leitor possa, por si só, realizar a sua análise e avaliação.
Não deixe de comparar o que diz Dias André com o depoimento de Rosa Mota:
Rosa (Maria) Mota (Teixeira Mendes)
Advogado- - Na Polícia de Judiciária há um manual de procedimentos para ...
Rosa Mota - Não Sr. Doutor, existe um manual de procedimentos, um guia de procedimentos genéricos relativamente a situações de abuso sexual de menores, no âmbito da Interpol, única e exclusivamente para elementos de forças relacionadas com investigação.
Advogado - E esse manual de procedimentos, foi o manual que seguiram?
Rosa Mota - Sr. Doutor, todos os procedimentos que são seguidos na secção que investiga os abusos sexuais, têm também em consideração esse manual mas têm acrescidamente a situação em concreto, porque esse manual remete sempre para a situação em concreto.
Advogado - Sim senhor, mas como eu não conhecia esse manual ...
Rosa Mota - Não pode conhecer Sr. Doutor, é interno, é policial.
Advogado - Sim senhor. Vamos depois pedir com certeza, para que ele possa ser junto aos autos. Agora a pergunta é esta, nesse manual de procedimentos não é aconselhável, ou não é aconselhado, não faz parte dos procedimentos que este tipo de averiguação policial, de investigação, as pessoas da Polícia sejam acompanhadas de psicólogos que integrem as equipas, que oiçam as pessoas com psicólogos, ou especialistas do ramo de psiquiatria ou da pedopsiquiatria, nesse manual de procedimentos, isto consta ou não consta?
Rosa Mota - Que eu saiba não, de acordo com a nossa lei, não há nada que nos obrigue a ...
Advogado - Não estou a falar da lei.
Rosa Mota - Estamos Sr. Doutor, a Polícia obedece à lei.
Advogado - Estou a falar de procedimentos.
Rosa Mota - Não Sr. Doutor, a polícia obedece à lei na sua actuação. A Polícia Judiciária não tem nos seus quadros psicólogos afectos a investigação nenhuma, caso que tanto quanto sei acontecem em alguns dos países estrangeiros, portanto nós funcionamos com as regras aceites e impostas pela lei nacional.
(António José) Dias André
Procurador - Havia algum manual, algum conjunto de regras pelas quais o Senhor e a equipa de Inspectores da Polícia Judiciária orientassem as inquirições? A forma como eram tomadas as ... as declarações? Havia?
Dias André - Havia todas as recomendações fornecidas pelos ... pelos ... pelas ONG's com as quais mantínhamos uma ... uma estreita colaboração que era muito, muito ... era muito usual. Desde o Chão dos Meninos, ao IAC, à APAV e ... e aliás os procedimentos que nós utilizávamos eram uma compilação de todas essas ONG's que foram transcritas para o manual CORE que é uma edição da APAV, que foi feito com a ... com a colaboração da Dr.ª Rosa Mota e com a minha. Portanto, e aqui estão os procedimentos todos que são utilizados internacionalmente.
Procurador - Sr. Inspector esse livro que aí tem, tem-no desde quando?
Dias André - Desde que ele foi editado portanto em 2 ... estávamos na altura no inicio do processo,
Procurador - No inicio do processo, deste processo?
Dias André -Sim, sim.
Procurador - Portanto, Novembro de 2002?
Dias André - Admito, não posso garantir. Sei que estávamos no início do processo quando ... quando este livro foi editado. Quando a APAV ...
Procurador - Esse ... esse livro que o Sr. Inspector acaba de exibir, foi um livro que foi ... que só o Sr. Inspector tinha, serviu de patrão ... de padrão para orientação aos outros inspectores que formavam a brigada, foi distribuído pelos outros Srs. Inspectores que constituíam a brigada? Qual foi o grau de cumprimento ou de acatamento das instruções que decorriam desse ... desse manual?
Dias André - Foi distribuído ... foi distribuído e estava disponível para todos os elementos da brigada e não só, e todos os elementos da polícia que na altura me solicitaram, porque a APAV fez o favor de nos enviar vários exemplares, para distribuirmos por quem trabalhasse na área. E paralelamente isto são os procedimentos já recalcados de todas essas reuniões e de todo ... de toda essa bibliografia que era recolhida junto das ONG's, quer das correntes, e posso aqui citar as correntes escandinavas ... a corrente escandinava que caiu em desuso, em prol da corrente canadiana, corrente canadiana que é e toda essa ...
(...)
Juiz Presidente- Pode ... pode prosseguir Sr. Inspector.
Dias André - Portanto e isto eram procedimentos que já estavam ... já estavam ... já estavam a ser utilizados na brigada. (Nota minha: repare o que dizem TODOS os inspectores da brigada sobre este assunto!)
Procurador - Ó Sr. Inspector a Sr.ª Dr.ª Rosa Mota quando depôs neste julgamento perante uma pergunta correspondente a esta não fez referência nenhuma, pelo menos que eu tivesse ouvido, não fez referência nenhuma a esse manual e fez uma outra referência a uns ... a um manual da Interpol, creio que seria da Interpol ...
Dias André - Sim
Procurador - ... que também teria algum conjunto de regras relativamente à forma de proceder em casos desta natureza. O Sr. Inspector tem conhecimento de algum manual da Interpol?
Dias André - Tenho.
Procurador - De directivas, de recomendações?
Dias André - Tenho, conheço e não é mais porque é um manual só para uso exclusivo das forças policiais. E portanto bem feito mas contudo estará um bocado desactualizado porque baseado em muita, como eu referi há pouco, em muita teoria oriunda da Escandinávia e os Suecos, Norueguês, Dinamarquês não têm muito a ver com a nossa cultura ...
José Alcino (Álvaro Rodrigues)
Advogado - Sim, mas não, não há, não há, digamos, regras de procedimentos adoptadas? Não há, crimes de abuso sexual, deve-se fazer isto ... deve-se utilizar esta metodologia ...
José Alcino - Sim, mas nós frequentamos frequentemente, passo a expressão, institutos, seminários, conferências, cursos de actualização, cursos de actualização ...
Advogado - Sim senhor. Mas o que eu pergunto não é isso ...
José Alcino - Temos manuais também ...(imperceptível) ...
Advogado - Está aqui a olhar para este livro? O senhor conhecia este livro?
José Alcino - Conheço esse livro.
Advogado - Este livro, para ficar aqui, é o livro, é um livro da APAV, manual para o entendimento de crianças vítimas de violência sexual.
Juiz Presidente - Documento junto aos autos, audiência de julgamento.
Advogado - Documento junto aos autos. O senhor conhecia este, este livro?
José Alcino - Conheço.
Advogado - Conhecia na altura?
José Alcino - Sim, sim.
Advogado - Ou só conheceu agora?
José Alcino - Não, não, conhecia na altura.
Advogado - Conhecia na altura. E tinha-o estudado, naturalmente?
José Alcino - Sim, li o livro.
Advogado - Olhe, é que neste livro, a propósito da ... daquilo que se deve fazer numa, numa investigação de abusos sexuais, portanto, é dirigido concretamente à investigação de abusos sexuais, diz-se precisamente o seguinte ... só, só em alguns tópicos, para também não perdermos muito tempo, diz que as entrevistas devem ser precedidas da obtenção de informação prévia dos relatórios dos serviços das instituições onde eles tenham estado. Que se devem reunir com os profissionais ... antes de se fazer as entrevistas, se devem reunir com os profissionais que tenham acompanhado as crianças, psicólogos, trabalhadores sociais. Que deve haver uma discussão multidisciplinar com psicólogos ou psiquiatras. Que deve haver um determinado ritmo na forma como as entrevistas são feitas, duração, a forma de convocação. Que se devem, que se devem filmar as entrevistas e explica até como é que é feita a filmagem, como é que, ou seja, tudo aquilo que são ... o bê-a-bá, as linhas ... logo as mais gordas deste manual, sobre a forma de investigar os abusos sexuais, os senhores não cumpriram e conheciam estas regras. E eu não tenho dúvida que conheciam, porque este livro que está aqui até agradece ao Inspector Dias André e à Coordenadora Rosa Mota o apoio que deram nisto e o senhor diz que conheciam, não tenho razão nenhuma para duvidar que não conhecesse. Agora o que eu não consigo compreender do ponto de vista até intelectual, é como é que conhecendo os senhores estes procedimentos, não os aplicaram no terreno.
José Alcino - Disse há pouco a orientação, a orientação deste, deste, desta investigação deste, deste processo era das minhas chefias, portanto, e assim nos era ordenado.
Advogado - Mas ó Sr. Inspector, mas o senhor podia, como homem experiente nisto e como conhecedor disto, dizer, oiça lá, mas porque é que nós não fazemos como diz aqui o manual que nós próprios aconselhamos a, a que se siga?
José Alcino - Isso é um manual de procedimentos ...
Advogado - Pois é.
José Alcino - ... acho que está aí, não ... há situações que não, que não, não, não podem, como dizer isto? Esse tipo ... há situações que não, não, não devem ser, não podem ser, portanto, seguidas à regra.
Advogado - E havia alguma razão para não se terem seguido estes procedimentos?
José Alcino - A inquirição, por exemplo a gravação de imagens, é, era uma situação ... obrigava a muitas cassetes e depois estar a transcrever, portanto era uma situação muito complicada ...
Fernando (Manuel Serralheiro Machado) Baptista
Advogado - Que procedimentos é que seguiam?
Fernando Baptista -Basicamente aqueles que estão definidos no manual Core, que que aliás tinha sido elaborado em 2001, ou 2002.
Advogado - Sim senhor. Conhecia também os procedimentos da Interpol?
Fernando Baptista - Não.
Advogado - Não. Portanto eram os procedimentos do manual Core que seguiam?
Fernando Baptista - Sim.
Helena (Isabel Coelho Marques de) Almeida
Helena Almeida - Não, de forma alguma. nem assim podia ser porque estamos a lidar com, com, com vítimas, muitas vezes de, de muito reduzida idade. Nós frequentámos conferências e seminários acerca do tema. Quando alguém entra numa 1ª fase nos crimes sexuais, obviamente que há uma conversa por parte da chefia, relativamente à forma como deve ser, como deve ser abordado ...
Advogado - Conhece, conhece este livro?
Helena Almeida - Portanto o manual, esse é o manual APAV. Sim, sim conheço.
Advogado - E era este manual que vos era aconselhado seguir?
Helena Almeida - Sim, era-nos aconselhado seguir ... se nós entendêssemos que, que o deveríamos ler, portanto não era de carácter obrigatório.
Advogado - Bem, mas isto é um manual para o atendimento de vítimas de violência sexual, a Senhora leu ou não leu?
Helena Almeida - Não, não li. Eu já disse que ...
Advogado - Não leu?
Helena Almeida - ...tenho conhecimento mas não o li.
Advogado - Não leu. Olhe e ... e leu o manual da Interpol, na parte respeitante à investigação de abusos?
Helena Almeida - Não, não li.
Rita (Margarida Ranha dos) Santos
Advogado - Mas para os abusos sexuais, teve ... havia um ... regras específicas? Um pouco por toda a Europa e nos Estados Unidos, no ... a partir dos anos 80 começaram a ser criadas regras específicas para as inquirições de situações de abuso sexual. Na Polícia Judiciária também as havia ou não? Escritas, documentos ...
Rita Santos - Não, não as há escritas.
Advogado - Não as há escritas. A Sr.ª Inspectora conhece este livro?
Rita Santos - Sim.
Juiz Presidente - Fazer referência a um manual da APAV que foi junto aos autos na sequência da ... ou durante a audição do Sr. Inspector Dias André, testemunha.
Advogado - Quando é que lhe foi facultado este livro?
Rita Santos - No início da, da, da investigação do ... quer dizer, quando eu fui trabalhar com o Inspector-chefe Dias André e com a Dr.ª Rosa Mota.
Advogado - Ele deu-lhe este livro?
Rita Santos - Sim.
Advogado - Pronto, ainda bem que há alguém que ... a quem o livro foi, foi dado. Porque houve aqui já outros Inspectores que foram ... que depuseram e que ... a quem não foi facultado o livro, nem lhe foi mostrado. Há alguma razão ... bem, isso não sabe. A si foi-lhe dado o livro?
Rita Santos - Sim.
Advogado - Pronto e a senhora leu-o?
Rita Santos - Sim.
Advogado - E teve ou não consciência de que a forma como se estavam a inquirir as testemunhas não correspondia a alguns dos princípios ... já vamos depois ver quais são, que estão aqui neste livro?
Rita Santos - Na altura ainda não tinha ouvido nenhuma testemunha de ... nenhuma testemunha de, de crime sexual.
Advogado -Na altura quando?
Rita Santos - Na altura em que me foi facultado esse livro.
Advogado - Ainda não tinha ouvido nenhuma?
Rita Santos - Não.
Advogado - Está bem, mas leu-o antes de começar a ouvir?
Rita Santos - Sim.
Advogado -Pronto. E até aqui uma, uma ... uma coisa que diz assim, "a entrevista de investigação com a criança" e ... tem aqui uns pontos que, enfim, isso já está ... agora a senhora também, também a testemunha dizer uma coisa diferente mas enfim, todos têm dito, por exemplo, informação prévia ... os senhores não tiveram acesso, antes de começar a inquirir as pessoas, aos relatórios que havia na Casa Pia sobre estes rapazes, aos livros de ocorrências, à informação clínica, médica ... não tiveram acesso a isso?
Rita Santos -Não.
Advogado - Não.
Rita Santos - Antes não.
Advogado - Mas aqui o tal livro diz que se deve começar por pedir isso. Tendo a Sr.ª Inspectora lido o livro, não foi dizer ao Inspector Dias André, "olhe, aqui de acordo com estas regras nós devíamos começar por fazer uma análise desta informação toda ...".
Rita Santos - Não.
Advogado - Não pediu?
Rita Santos - Não.
(...)
Advogado - Tiveram discussões ... a equipa de inquirição integrou pessoas ... psicólogos, pedopsiquiatras?
Rita Santos - Não.
Advogado - Não. Tiveram reuniões com psicólogos, pedopsiquiatras?
Rita Santos - Eu não.
Advogado - Não. Colocaram a questão de poderem filmar estas, estas ... desde a primeira inquirição, como também aqui sugere o livro?
Rita Santos - Não.
(...)
Advogado -A Sr.ª Inspectora teve consciência de que não estavam a seguir o que estava neste manual?
Rita Santos -Sim.
Advogado -E não lhe ocorreu colocar essas suas dúvidas e dizer aos seus chefes, mas olhem, nós estavam a fazer isto, não estamos aqui a fazer isto de acordo com este manual, com as regras que estão aqui a considerar ...
Rita Santos - Nós não temos que fazer as coisas de acordo com esse manual.
Advogado - É o manual recomendado.
Rita Santos - Recomendado. Algumas situações que aí estão descritas são, neste momento utópicas, em relação ao trabalho da Polícia Judiciária.
Advogado - Recolher informação prévia?
Rita Santos - Não, reuniões multidisciplinares. Nem sequer estou de acordo com isso.
Advogado - Reuniões ... vamos começar por um ponto. Informação prévia, era utópico pedir isto?
Rita Santos - Não, isso foi feito em determinada altura do processo.
Advogado - Depois das inquirições. Mas aqui é informação prévia. Não lhe ocorreu discutir com os seus superiores que ... que, olhe, se não estava de acordo, dizer não vamos fazer isto, porque não estamos de acordo. Não lhe ocorreu discutir os procedimentos na equipa?
Rita Santos - Não.
Advogado - Não?
Rita Santos - Não, os procedimentos que, que houve alguma necessidade de pôr em causa, ou que, ou que de alguma forma podia não concordar ou concordar mais ou menos com o que me era pedido para fazer, era conversado.
Advogado - Sr.ª Doutora, não é isso. A Sr.ª Doutora tem um manual que lhe é sugerido ...
Rita Santos - Recomendado.
Advogado - ... recomendado, que tem um conjunto de procedimentos. Esse conjunto de procedimentos não estão a ser seguidos, e a Sr.ª Doutora não lhe ocorre que a discussão sobre os procedimentos deve ter lugar na equipa, para saber o que é que vão fazer.
Rita Santos - Sim, poderia ter lugar na equipa mas não teve.
Valter (Leonardo Fernandes Pereira da Silva) Lucas
Advogado - E foi-lhe dado ... foram dadas ... foi-lhe indicado que procedimentos é que devia adoptar?
Valter Lucas - Foi-me dado uma indicação geral dos procedimentos a adoptar.
Advogado - Que indicação geral é que lhe deram?
Valter Lucas - Não lhe sei precisar, recordo-me de ter sido abordado o tema, neste momento não me recordo quais é que foram as indicações específicas.
Advogado - Não se recorda, portanto, deram-lhe uma indicação geral?
Valter Lucas - Sim, que eu lembro-me disso ter sido abordado, lembro ...
Advogado - Indicação geral de que género? Tenha cuidado a ouvir os rapazes? São pessoas traumatizadas? Deram-lhe procedimentos?
Valter Lucas - Mas seguramente que terá sido algo dentro desse género.
Advogado - Uma coisa assim deste género, no geral?
Valter Lucas -Sim, geral.
Advogado - Portanto, procedimentos específicos, metodologias, isso não lhe indicaram?
Valter Lucas - Especificamente em relação ao abuso sexual de menores, não.
Advogado - O Doutor ... o Sr. Alexandre Dias André não lhe recomendou este livro que é um livro do manual ... o Manual da APAV?
Valter Lucas -Não.
Advogado - É que ele já esteve aí sentado e disse que era este ... que era estes os procedimentos que a equipa adoptava. Que tinha adoptado. A si não lhe participaram que deviam ser estes os procedimentos deste manual?
Valter Lucas -Não, a mim não.
Advogado -A si, não. E o Manual da Interpol? Sobre abusos sexuais? Sobre procedimentos em matéria de abusos sexuais? Deram-lhe alguma ... disseram-lhe para ler isso? recomendaram-lhe isso ou não?
Valter Lucas -Não.
Advogado - Disseram-lhe que era conveniente que antes de abordar os rapazes que tivesse ... que se procurasse preparar com especialistas, psicólogos, pedopsiquiatras, um trabalho multidisciplinar antes de propriamente fazer os interrogatórios?
Valter Lucas - Como eu já lhe disse é assim, fiz algumas inquirições a ofendidos, não foram muitas.
Advogado - Mas para as que fez teve essa ... deram-lhe instruções neste sentido? Teve ...
Valter Lucas - De falar com psicólogos ...
Advogado -Psicólogos, psiquiatras, quer dizer, preparar a entrevista num quadro multidisciplinar?
Valter Lucas - Tinha colegas já com vários anos de experiência na área e foi com esses colegas que falei.
Advogado -Portanto, não foi um quadro multidisciplinar?
Valter Lucas - Não, não foi um quadro multidisciplinar.
Advogado -Olhe e teve o cuidado de ... deram-lhe elementos para se preparar para essas entrevistas, conhecendo os antecedentes dos rapazes, informações que existissem na Casa Pia, relatórios sociais, relatórios da sua vida na Casa Pia, livros de ocorrências? Deram-lhe esse material ou não?
Valter Lucas - Em relação aos ... aos ofendidos que ouvi foi-me relatado o historial desses indivíduos.
Advogado - Mas deram-lhe material? Deram-lhe ...
Valter Lucas -É assim, não sei se me deram em folhas ou se me relataram pessoalmente qual é que era ...
Advogado --Mas relataram-lhe como?
Valter Lucas -Como se prepara qualquer trabalho, podem ter tido uma reunião comigo em que me relataram qual é que era o historial daquele rapaz, podem ter chegado ao pé de mim e dito: olhe, estão aqui estas folhas, isto é o historial desse ...
Advogado -Mas o senhor não se lembra se lhe fizeram uma coisa ou outra?
Valter Lucas -Não me lembro se fizeram uma coisa ou outra.
Advogado -E quem é que teve essas sessões de preparação consigo?
Valter Lucas - É assim, normalmente, era ou o Inspector-chefe Dias André ou a Coordenadora de Investigação Criminal, Dr.ª Rosa Mota.
Vítor (Nuno Menaia Cadete) Pita
Advogado -Não se recorda de nada. Está bem. O Sr. Inspector tinha, antes de iniciar esta investigação, já tinha experiência em matéria de abusos sexuais, de crimes relacionados com abusos sexuais?
Vitor Pita -Relativa, mas já.
Advogado -Quanto tempo?
Vitor Pita -Cerca de 4 meses.
(...)
Advogada -Muito bem ... durante o seu estágio pergunto-lhe se lhe foram, foram com certeza é um estágio, como qualquer estágio são dadas indicações ... quanto à forma, quanto aos procedimentos, e eu pergunto-lhe concretamente se durante o seu estágio com o Sr. Inspector Dias André e era coordenadora, como já disse também, a Sr.ª Sr. Inspectora Rosa Mota se lhe eram dadas indicações precisas como a forma ... que os autos deveriam ser feitos, nomeadamente, pergunto antes de mais nada quanto aos autos de inquirição de testemunhas ou de assistentes, o preenchimento desses autos, não me reporto, saliento, ao conteúdo das declarações, mas o que é que deveria constar desse auto?
Vitor Pita -Toda a informação julgada pertinente para o apuramento da verdade.
Cristina (Maria Pinto) Correia
Advogada -Sr.ª Doutora, uma vez que fez parte da investigação ainda que por um breve período de tempo, não é, três meses, mas numa fase bastante importante ... pergunto-lhe e participou noutras diligências, aquelas fotografias que foram juntas a folhas 940 no dia 31 de Janeiro, tanto quanto eu consigo, posso estar errada mas conheço, conheço praticamente todas as diligências que foram feitas no processo, e em termos de reportagem fotográfica é a única situação em que não há qualquer indicação da diligência, que não há nenhum auto, que não há nenhuma referência a quem efectuou as fotografias, quando é que foram efectuadas, e por quem foram efectuadas, ao contrário do que sucede nas dezenas, talvez dezenas de reportagens fotográficas que existem ao longo do processo, a Sr.ª Doutora enquanto membro, a Sr.ª Inspectora enquanto membro da investigação naquela fase, e conhecendo os elementos da, da, da, da brigada e tendo uma experiência já considerável, tem alguma explicação para isso?
Cristina Correia -Não, é, pode ser ...
Advogada -É um procedimento normal?
Cristina Correia -Não, até como a Doutora diz, todas as outras reportagens estão, estão datadas, não é, e identificadas de quem foi a sua autoria, neste caso pode, só encontro uma explicação de ser um lapso do colega que, que as fez, ou que as digitalizou e, e depois pôs no processo, não, não tenho outra explicação, não, não conheço a razão.
(...)
Juiz Presidente -Sabe esclarecer o Tribunal tendo em atenção o seu procedimento, o procedimento que normalmente têm em diligências idênticas, o porquê da não existência desse auto?
Cristina Correia -Não, não tenho nenhuma explicação, não sei.
Juiz Presidente -Costuma fazer mesmo quando é o seu procedimento que esteve naquela diligência, era mesmo quando é negativa, fazer o relato da diligência?
Cristina Correia -Eu pessoalmente costumo fazer nas diligências que eu esteja a determinar ou esteja eu a, a dirigir.
Juiz Presidente -Sim.
Cristina Correia -Ou a realizá-las, sim.
Juiz Presidente -Para este caso concreto, não pode acrescer nada quanto à inexistência de?
Cristina Correia -Não, não tenho nenhuma explicação ou razão para essa falha.
O que se estava a passar com as perícias foi uma das maiores mistificações deste Processo Casa Pia. Parecia que uma certa esquizofrenia tinha tomado conta de pessoas teoricamente responsáveis em todos os campos: peritos, polícias, procuradores, jornalistas. Estavam todos empenhados num Auto de Fé: à fogueira com eles! As Bruxas De Salém ocuparam Portugal. Há que levá-las à fogueira. A História é testemunha e um dia falará mais alto do que todas as asneiras e falsidades que foram ditas e publicadas. Olhando para trás, vejo um país na Idade Média.
***
Um dos temas mais explorados pela Comunicação Social durante o Processo Casa Pia foi,sem dúvida, o das perícias, nomeadamente as perícias psicológicas. Manchetes e mais manchetes, notícias e mais notícias, afirmando que as perícias provavam que as vítimas estavam a falar verdade.
Tudo isto é falso, impossível, só compreensível porque ninguém sabia com o que estava a lidar, o que estava a fazer ou como devia actuar. Com excepção dos vários comportamentos de má fé até aceito que muitos dos erros cometidos se devem pura e simplesmente à falta de experiência e à ignorância.
No entanto, salvo melhor opinião julgo que não se deve julgar ninguém com base na ignorância e apenas porque se desempenha a função de julgador. É uma das falhas mais graves e perversas do nosso sistema judicial.
O sistema prefere fazer fugas para a frente ou fazer passar a ideia de que são competentes, acabando por condenar cidadãos inocentes e, quiçá, absolver ou ignorar comportamentos criminosos de cidadãos culpados.
É por consequência deste cenário que a minha defesa e eu próprio estudámos, confrontámos, nos informámos e analisámos. Desse trabalho concluímos:
- A Psicologia Forense é aceite como um elemento sério em casos de abusos sexuais, em muitos países. Esse papel foi-lhe atribuído ao longo dos anos como uma necessidade para se evitarem mais erros judiciários depois de muitos se terem detectado. A sua utilização é sempre rodeada dos maiores cuidados e segundo regras bem estabelecidas.
- A ciência internacional investiu fortemente na investigação e análise para chegar ao desenho de regras básicas e métodos de análise que permitissem descobrir a compatibilidade ou a falta dela dos relatos com os factos. Mesmo assim, até ao dia de hoje, as conclusões da utilização desses instrumentos apontam sempre para uma "possibilidade" ou falta dela e nunca para a validação absoluta;
- Em Portugal isto era matéria maioritariamente desconhecida ou nunca aplicada por quem dela tinha ou deveria ter algum conhecimento. Isto foi evidente;
-Os métodos usados em nome da psicologia forense no processo Casa Pia situaram-se ao nível do quase amadorismo. Estes métodos foram responsáveis pela intoxicação da opinião pública, através de alguns media. Os métodos foram errados, insuficientes, mal analisados, mal aplicados, mal concluídos. O erro foi admitido em Tribunal. Mas veio tarde, o mal estava feito.
***
Esta página tem como objectivo levar ao leitor um enquadramento do tema Perícias Psicológicas. É o background para poder analisar a documentação que a seguir se publica, nomeadamente os depoimentos da Drª Alexandra Anciães, a psicóloga que foi "obrigada" a fazer cerca de 30 perícias, sem tempo, sem ajuda, com recusa de informação indispensável para este tipo de trabalho.
A Drª Alexandre Anciães, pela sua inexperiência e pela pressão de forças que ela percebeu que não podia contrariar, foi autora de uma das mais perversas acções levadas a cabo no processo Casa Pia. As aparência apontam para que ela terá sido "escolhida" para fazer o que fez e como fez. Honra lhe seja feita: com o passar do tempo, a Drª Anciães poisou os pés no chão e reconheceu, em Tribunal, como tinha procedido mal.
***
O mal estava feito, foi divulgado e propagandeado exaustivamente. Com ou sem má fé. A vaidade, a ignorância, as "costas quentes" fizeram com que jornalistas, ainda mais ignorantes, publicassem afirmações completamente descabidas.
Um jornalista e um jornal perceberam. E denunciaram, ouvindo os nomes mais prestigiados da comunidade científica internacional e nacional:
Expresso de 01.11.2003
Os especialistas contestam que os terapeutas das vítimas da Casa Pia sejam peritos na acusação
Os psiquiatras e psicólogos norte-americanos Garry Wells (professor de Psicologia da Universidade de Iowa) e Elizabeth Loftus (investigadora reconhecida mundialmente pelos trabalhos em síndromas de falsas memórias) .
Alguns dos maiores investigadores mundiais em peritagem testemunhal, os psiquiatras e psicólogos norte-americanos Elisabeth Loftus, Gary Wells e Richard McNally, contestam as afirmações dos psiquiatras Pedro Strecht e de Álvaro Carvalho, quando estes afirmam poder garantir, através de testes e observações, que as crianças e jovens adolescentes do processo Casa Pia estão a dizer a verdade quando acusam A, B e C de terem cometido abusos sexuais.
Gary Wells é professor de psicologia da Universidade de Iowa e colabora activamente com o Departamento norte-americano de Justiça na legislação sobre prova testemunhal, reconhecimento fotográfico e interrogatórios. Quando questionado sobre se é possível fazer uma afirmação como a destes psiquiatras portugueses, Wells responde com um «não»: «Sigo esta ciência há muito tempo. Se acontece que estes psiquiatras sabem de alguma técnica especial que o resto do mundo científico desconhece, adoraria ouvir mais sobre isso».
Por seu turno, Elisabeth Loftus,(clique aqui para saber mais) doutorada em Standford e considerada uma das maiores investigadoras mundiais nas síndromas de falsas memórias, refuta igualmente afirmações de Pedro Strecht e critica o médico por ter feito estas afirmações publicamente, dado ser simultaneamente médico particular de algumas das crianças e jovens. Se isto tivesse sucedido nos EUA, ele «seria processado por difamação», afirma Loftus.
Richard McNally, professor de psicologia em Harvard, vai na mesma linha: «Não vejo como é possível a esses médicos reivindicarem ou afirmarem que têm a certeza de que as crianças estão a dizer a verdade. Desconheço qualquer teste que possa fornecer essa garantia».
Os professores e investigadores referem-se, também, às justificações de Strecht com os testes que diz ter realizado aos jovens, (WISC, TAT e RORSCHASCH,). Para Elisabeth Loftus, essas afirmações «são irresponsáveis e enganadoras ao tentarem sugerir que os testes funcionam nessa direcção, quando não existe nenhuma evidência credível sobre isso».
Risco de sugestão e inquinação
Os investigadores lançam um alerta para a eventualidade de Portugal estar a viver um processo de histeria de falsas acusações sobre abusos sexuais, em grande parte provocado por um processo de sugestão e inquinação testemunhal. E relembram o que aconteceu nos Estados Unidos e em muitos outros países. «Centenas de pessoas foram presas aqui nos EUA, acusadas de crimes de abuso sexual. Mais tarde, descobriu-se que a grande maioria era inocente. Foi uma catástrofe e muitos casos foram provocados por sugestão pelos próprios médicos psiquiatras, psicólogos e terapeutas», conta Gary Wells, que recorda as profundas feridas que estes episódios deixaram, há uma década: «Passámos por isso tudo e foi uma experiência muito nefasta durante um longo período, mas saímos disto muito mais sábios e mais exigentes quanto a formas mais claras de prova».
Houve
outras vítimas, além dos inocentes acusados: as próprias crianças. «Muitos
processos destruíram as crianças. Ao serem tratadas como tivessem sido
abusadas, quando isso afinal não aconteceu, as crianças que não eram vítimas
transformaram-se em vítimas da própria falsa alegação. Hoje são doentes do foro
mental, quando não eram» - relata Ralph Underwager, um veterano nesta área,
director do IPT-forensic, (clique para saber o que é) que participou em mais de
500 casos de abuso sexual. (clique aqui para as Guidelines do IPT)
Também a comunidade académica nacional está apreensiva. Adriano Vaz Serra, professor catedrático de Psiquiatria da Universidade de Coimbra, Óscar Gonçalves, catedrático do departamento de Psicologia da Universidade do Minho, e vários outros professores, psicólogos e psiquiatras (como Pio de Abreu, Ana Vasconcelos ou Cristina Gonçalves) secundam os seus colegas norte-americanos nas críticas às declarações de Pedro Strecht e Álvaro Carvalho.
Terapeuta e perito são funções incompatíveis
Óscar Gonçalves é claro
quanto às certezas de Strecht e de Carvalho sobre as alegações das crianças e
jovens: «Não. De modo nenhum isso é possível. O mais que eles podem atestar é
que as próprias pessoas julgam que estão a dizer a verdade, o que é
completamente diferente. De modo nenhum há uma forma de podermos atestar que,
de facto, é verdade o testemunho de outra pessoa». Para o catedrático, «este
fenómeno, nos Estados Unidos, nasce com os terapeutas»: «Tenho uma forte
apreensão que a sua dimensão epidémica esteja a ser criada pelos próprios
terapeutas, que sejam eles a criar as memórias falsas».
A outra questão que escandalizou a comunidade académica foi o facto de terem sabido que ambos os médicos, Strecht e Carvalho, são simultaneamente terapeutas de vários destes jovens. Segundo todos os entrevistados, ser terapeuta e perito é totalmente incompatível.
Tanto os investigadores nacionais como os internacionais referem que é absolutamente vital que Portugal aprenda com a experiência de outros países que já passaram por este tipo de «epidemia», assim como que as autoridades judiciais recorram a equipas de peritos totalmente independentes para os apoiar neste tipo de casos.
Recorde-se
que os relatórios entregues por Strecht e a sua equipa ao Ministério Público
validaram os testemunhos dos jovens e crianças da Casa Pia nas acusações contra
Carlos Cruz, Paulo Pedroso, Hugo Marçal, Manuel Abrantes, Ferreira Diniz e
Herman José, entre outros. São também estes relatórios médicos, e os realizados
no mesmo sentido pelo Instituto de Medicina Legal, que estão a servir de
justificação para a realização das inquirições para memória futura.
Autor: Jorge Van Krieken
Mais tarde também o Jornal de Notícias publicou o que era incómodo para a "versão oficial":
Data: 06.01.2004
A professora universitária
norte-americana Elizabeth Loftus, especializada em memória e frequentemente
consultada em casos de abusos sexuais, falou ao JN do perigo das recordações
falsas nos depoimentos das vítimas do processo Casa Pia.
JORNAL DE NOTÍCIAS- Conhece o caso Casa
Pia, processo de pedofilia que envolve algumas figuras públicas portuguesas?
Elizabeth Loftus- Não conheço
suficientemente bem os pormenores do caso, mas acho que há algumas coisas
suspeitas. Pelo que percebi, durante anos nunca se ouviu falar dos abusos, que
terão acontecido durante muito tempo, mas de repente surgiram nomes de várias
pessoas que são suspeitas.
JN -As alegadas vítimas de pedofilia foram sujeitas a sucessivos interrogatórios. Isso pode ter influenciado o surgimento de falsas memórias nos seus depoimentos?
EL- Os depoimentos
devem ser sempre gravados em vídeo para se ter a certeza de que não houve
pressão para que determinada resposta surgisse na boca do interrogado. É
preciso saber de onde surgiram as ideias e se foram resultado de alguma
sugestão ou de coacção. Muitas vezes, a própria pessoa que faz o interrogatório
sugere determinada resposta sem sequer saber que o está a fazer. É isso que a
gravação em vídeo permite aferir.
Durante a fase de reconhecimento dos suspeitos, foram mostradas às crianças fotos de dois conhecidos políticos. Depois, num segundo reconhecimento, essas mesmas fotos voltaram a ser mostradas juntamente com várias imagens de outros possíveis suspeitos. Os menores acabaram por reconhecer as pessoas que tinham visto nas primeiras fotografias...
Uma pessoa pode parecer familiar a outra que já tenha visto a sua fotografia. O mesmo se aplica à imagem de uma pessoa famosa e conhecida... Pode parecer familiar a quem está a fazer o reconhecimento.É preciso ter cuidado, até porque o simples acto de se puxar uma foto de uma pessoa fá-la parecer suspeita. É uma situação muito perigosa...
JN-Como é que se pode determinar se as memórias de abusos sexuais durante a infância são verdadeiras ou falsas?
EL -É preciso perceber
como é que surgiram as denúncias, ter a certeza de que não surgiram na
sequência de sugestões da acusação, apurar se houve alguém que teve
conhecimento dos factos na altura em que aconteceram. No processo da Casa Pia,
não me parece ter havido investigação suficiente.
Autor: Maria Cláudia Monteiro
Já o Correio da Manhã tentou descredibilizar a psicóloga norte americana - a Drª Dulce Rocha (formação de Juíza) alinha na campanha da ignorância e faz afirmações sem qualquer suporte:
DULCE ROCHA: VÍTIMAS NÃO MENTEM
Dulce Rocha, presidente da Comissão Nacional de Crianças e Jovens em Risco, considera que a presença em Portugal da psicóloga e criminologista Elizabeth Loftus não deve ser aproveitada para desacreditar a investigação do processo de pedofilia da Casa Pia. "Se se puser em causa a investigação neste caso, isso pode suceder em todos os outros, pelo que ninguém iria para a cadeia. Em Portugal, temos profissionais competentes e bem treinados para investigarem os abusos sexuais de crianças."
Segundo Dulce Rocha, há métodos baseados em conhecimentos científicos e empíricos que "permitem, com fidelidade, analisar a veracidade dos depoimentos das crianças vítimas de abuso sexual". "Acredito, por isso, de acordo com a minha experiência profissional, que neste tipo de crimes, as crianças falam verdade, dado que abordam uma matéria que lhes é muito humilhante", concluiu.
Autor: João Saramago e Octávio Lopes
Retenhamos aquela afirmação da Srª Doutora: há métodos baseados em conhecimentos científicos e empíricos que "permitem, com fidelidade, analisar a veracidade dos depoimentos das crianças vítimas de abuso sexual".
É falso! As conclusões desses métodos são sempre no sentido da aproximação, isto é, só afirmam que é possível que estejam a falar verdade ou mentira. E, além disso, esses procedimentos não foram seguidos no Processo Casa Pia. Porque, ao contrário do que a Srª Doutora também afirma, não havia ninguém treinado para o fazer. E muito menos os peritos que intervieram no processo como se prova pela sua própria audição em sede de julgamento - veja aqui no site o artigo sobre a Drª Alexandra Anciães que realizou a maioria das perícias
***
A posição de pelo menos parte da comunidade científica portuguesa em relação ao que se passou, está retratada ao pormenor nesta entrevista que o prof. Adriano Vaz Serra, Director da Clínica Psiquiátrica dos Hospitais da Universidade de Coimbra, concedeu a Jorge Van Krieken e que este publicou no site Reporter X, a 30 deOutubro de 2003:
Jorge Van Krieken - Recentemente, em Portugal, um psiquiatra e um pedopsiquiatra afirmaram na TV, e em outros media, que podem garantir (devido aos testes que a sua equipa faz) que 32 crianças, adolescentes e adultos (dos 11 aos 22 anos) estão a dizer a verdade quando acusam A, B e C (pessoas específicas) de abusos sexuais. Isto é possível?
A. Vaz Serra - O apuramento da verdade dos factos não pode ser obtido apenas pela aplicação de testes. Antes deve ser conseguido pela junção de provas cujo conteúdo tenha sido debitado de forma espontânea e não seja influenciado por processos de sugestionabilidade ou de ganhos secundários.
(...)
Jorge Van Krieken - Estes médicos são actualmente também terapeutas de algumas destas crianças e jovens e, ao afirmarem que eles dizem a verdade relativamente ás acusações específicas que proferem contra determinadas pessoas, estão na realidade a assumir publicamente que essas pessoas cometeram esses crimes. Este tipo de afirmações públicas, como privadas, é aceite em Portugal pela Ordem e/ou restantes médicos? Porquê?
A. Vaz Serra - Fazer declarações em termos de pressupostos dados como certos mas que não estão ainda provados não é eticamente correcto. Determinam uma onda emocional que influencia a opinião pública e que só prejudica o apuramento imparcial dos factos.
(...)
Jorge Van Krieken - Um médico pode ser simultaneamente terapeuta e perito?
A. Vaz Serra - São dois planos distintos. Uma intervenção terapêutica traz sempre consigo o desenvolvimento de emoções, positivas ou negativas, que podem influenciar um parecer. Uma intervenção de peritagem deve ser isenta, imparcial, que procura reunir (sem influenciar) as provas da verdade. Não é aconselhável que as duas funções estejam associadas.
(...)
Jorge Van Krieken - Há algumas semanas atrás, uma procuradora do Ministério Público disse que na sua experiência de 12 anos no Tribunal de Família, nunca viu uma criança a mentir no tribunal. Acha isso possível?
A. Vaz Serra - Com todo o respeito que me merece uma Procuradora do Ministério Público não acho muito credível a sua observação. De facto tem-se visto que em tribunal uma criança pode não contar a verdade: por medo, por se sentir perturbada pelo ambiente e pela forma como as perguntas lhe estão a ser feitas, por coação, por reelaboração da memória ou devido à sugestionabilidade de terceiros. Para citar apenas um exemplo posso referir Shobe e Schooler (2001), que descrevem sete casos de memórias falsas, trazidos da casuística dos tribunais, todos eles influenciados pela sugestionabilidade exercida sobre o declarante.
(Para ler esta entrevista na sua totalidade clique aqui)
***
Outros, também dos melhores nomes desta ciência no nosso país, não desculparam a incapacidade, a falta de conhecimentos, o mau procedimento que enformaram estas perícias.
É exemplar a intervenção do Prof. Pio de Abreu, em resposta a uma Juíza, numa Conferência que se realizou em Lisboa.
"Temos de falar nas mentiras dos agressores, onde não temos posto a tónica, porque os agressores têm mais razões para mentir e mentem mais" - esta frase foi proferida ontem por uma juíza que estava entre a assistência da conferência "A procura da Verdade nos Casos de Abuso Sexual" e que não se conteve quando ouviu o psiquiatra Pio de Abreu dizer que "a auto-estima de uma pessoa melhora se disser que foi violada por uma pessoa famosa" e o também psiquiatra Adriano Vaz Serra sustentar que as crianças são sugestionáveis e podem mentir.
Perante a intervenção da juíza, que frisou ter acompanhado uma criança vítima
de abuso sexual, Pio de Abreu sublinhou que o papel dos médicos é o de ajudar o
doente a suportar o seu problema, melhorando a auto-estima, enquanto o papel do
juiz é o de fazer cumprir as leis. "Fazer justiça com sentimentos leva a
linchamento e à justiça popular. Parece-me que é o que está a acontecer",
disse Pio de Abreu.
Nessa Conferência Elizabeth Loftus afirmou: "a imaginação leva as pessoas a acreditar que fizeram e viram coisas que nunca aconteceram".
***
Relativamente também às perícias físicas, cito o que, na mesma Conferência, foi afirmado pelo Prof. Luis Conchero Carro, professor catedrático de Medicina Legal da Universidade de Santiago de Compostela, uma das maiores sumidades mundiais na matéria: "é extremamente difícil concluir que uma criança foi vítima de abuso sexual há mais de seis meses". Doutor Honoris Causa pela Universidade de Coimbra, Carro sublinhou ainda que atribuir o abuso sexual a um determinado agressor "é um erro grave".
***
A ciência percorreu um longo caminho para chegar a um plano em que é possível aproximar-se da detecção da mentira ou da verdade nos depoimentos de crianças e jovens vítimas de abusos sexuais.
Não tendo ainda de parar de investigar, chegou de facto a um consenso que é utilizado por tribunais da Europa e dos Estados Unidos. Infelizmente esse caminho parece não ter passado ainda por Portugal. Os nossos peritos, por negligência ou por faltas de conhecimento, não seguiram os métodos nem utilizaram os processos que hoje são considerados fundamentais neste tipo de casos.
Fizeram-se afirmações que não resistem à análise de quem na verdade dedicou a sua vida à investigação e ao aperfeiçoamento, com a preocupação de proteger vitimas e inocentes - são hoje as grandes referências mundiais nos seus campos de investigação, menos para os portugueses.
Finalmente publico as prometidas revelações sobre as Perícias Psicológicas.
A análise de documentos do Processo, de vários pareceres, das conclusões, das transcrições das sessões de Julgamento, a consulta e leitura do que mais de relevante existe em todo o mundo sobre a matéria, a consulta de trabalhos dos e sobre os mais conceituados cientistas, desta área da ciência forense, ocupou várias semanas. Tinha planeado gastar menos tempo. Mas esta matéria é quase inesgotável pela dimensão do erro destas perícias. E também pelo aliciante que é o seu estudo.
O que aqui publico é apenas uma parte do que é possível escrever sobre esta macha negra do Processo Casa Pia.
Pela sua leitura e análise, o leitor poderá imaginar a dimensão do que aconteceu. A análise exaustiva do que terá sido um plano de má fé ou apenas o uso da boa fé de quem não estava preparado para fazer este trabalho, pertencerá à História. E nessa, o Ministério Público, o Instituto de Medicina Legal e a Psicologia Forense do nosso país, não vão ficar nada bem no retrato.
A publicação, gradual, abrange 7 títulos e obedece a um critério de ordenação: enquadramento, similitudes entre processos da PJ e do IML, a perita e os erros cometidos, os métodos modernos usados em todo o mundo civilizado, os "pecados mortais" das perícias, as perícias que me foram feitas a mim e, finalmente, uma perícia perfeitamente escandalosa que ofende toda a ciência e devia ofender as consciências. No meio destes itens, o leitor tem ainda a possibilidade de aceder a informação complementar com um simples clique.
Obrigado pelo interesse em se manter informado.
Em nome da Verdade
Carlos Cruz
Já aqui critiquei, e insisto, o facto do (IML) ter o monopólio das perícias legais, sem que a defesa do arguido possa pelo menos ter um seu representante durante a realização das mesmas.
Curiosamente, quando fui examinado, a Acusação esteve presente. E ao mais alto nível: o procurador João Guerra.
Assim, a única forma que a defesa teve, foi a de pedir pareceres a Professores de indiscutível competência e prestígio na área da Medicina Legal que, como não podia deixar de ser, concluíram que o IML não procedeu como a ciência impõe, quer nos exames quer nas conclusões.
Procurava-se no meu pénis um sinal que Francisco Guerra tinha atribuído anteriormente a Paulo Pedroso. Posteriormente, "transplantou" o sinal de Paulo Pedroso para mim! Em tribunal reafirmou que eu tinha um sinal do tamanho de uma moeda de um cêntimo. O exame físico a que fui submetido mostrou que era uma completa mentira (mais uma) de Francisco Guerra. Mas isso não impediu dois tipos de notícias: que o exame me comprometia e que eu me tinha recusado a um exame completo. (Clique aqui e veja tudo)
Repito: à sombra do monopólio do IML(sem direito a contraditório) podem cometer-se as maiores asneiras, os maiores erros de avaliação, consciente ou inconscientemente, propositadamente ou não. E não há contestação possível.
Aliás, o problema passa a ser gravíssimo, quando a perícia é feita sem obediência a normas, regras, procedimentos reconhecidos pela comunidade científica como indispensáveis. Foi isto que aconteceu neste Processo Casa Pia. Quer nas perícias físicas, quer nas psicológicas.
Para além dessas falhas que aqui denuncio, ocorreu ainda aos peritos chegarem a conclusões que surgem como cópias umas das outras (copy/paste) sem atender à especificidade de cada caso. E porquê? Porque lhes foi negada informação indispensável contra todas as normas internacionais: as declarações das alegadas vítimas na Policia e dados sobre a sua história familiar.
Assim e sem informação prévia, os peritos, de uma forma temerária, tiraram conclusões que, nas mãos da Acusação e da Comunicação Social, incutiram na opinião pública e, quiçá nos Juízes, afirmações que apontavam para uma falsa conclusão: os rapazes foram abusados por aqueles arguidos. Inadmissível. Como é denunciado pelo parecer do Prof. Pinto da Costa (mais abaixo), o mais conceituado médico legista do nosso país.
Este capítulo, dedica-se às perícias de natureza sexual (físicas). O próximo tratará das psicológicas. Numas e noutras, debruçar-me-ei essencialmente sobre o "núcleo duro" dos assistentes, as alegadas vitimas que acusam todos os arguidos. E também sobre o exame que o IML me fez a mim.
***
Antes ainda de me debruçar sobre as perícias propriamente dita convém chamar à atenção o seguinte:
As memórias são influenciadas por pessoas de confiança (em crianças, adolescentes ou adultos), especialmente pai e mãe, cuidadores, educadores, terapeutas, entre outras pessoas com quem tenham relações afectivas significativas e, pessoas a quem seja atribuída autoridade (por exemplo polícias, juízes, alguns professores, etc). Por estes motivos, médicos, psiquiatras e psicólogos devem manter-se neutrais, sem juízos de valor e empáticos para com a pessoa que relata acontecimentos de abuso sexual (American Psychiatric Association, 2003) - cfr. Amaral Dias no parecer junto aos autos.
A ausência de patologia ou da evidência de declarações inconsistentes não autoriza nunca o perito a pronunciar-se pela veracidade das mesmas. Mesmo que a convicção formada pelo perito, no decurso da sua actividade específica, vá no sentido de acreditar que, globalmente, um relato é verdadeiro, o mesmo perito deve abster-se de o enunciar pois, para além de não dispôr de qualquer método que permita objectivamente demonstrá-lo, o mesmo não decorre directa e fundamentadamente da sua competência científica ou profissional e, até, porque se estaria a substituir ao juízo próprio do tribunal, construído sobre todos os factos apurados, testemunhos e outros elementos de prova produzidos - cfr. parecer do Colégio de Psiquiatria junto aos autos.
***
O Processo Casa Pia inclui-se no tipo de caso denominado internacionalmente como MVMO (Multi Victims Multi Offenders - Multi Vítimas Multi Abusadores). Ficaram conhecidos pelos diversos erros judiciários que provocaram em todo mundo. O Dr. Sá Fernandes, nas suas alegações recordou:
"(...) o julgamento mais caro da história judiciária americana (...) mais caro do que o julgamento do O.J. Simpson que custou 12 milhões de dólares. O caso McMartin custou 15 milhões de dólares e é o primeiro dos casos daquilo que hoje a doutrina internacional chama os multi-victim, multi-ofender, MVMO. (...). O julgamento em 1933 que ficou conhecido sobre o caso McMartin foi um dos primeiros casos, várias vítimas, várias agressões, multi-victim, multi-ofender, sua decisão durou 7 anos. (...) A principal prova de abusos baseava-se nas declarações das alegadas vítimas que relatavam memórias de repetidos abusos sexuais. Os menores eram pressionados pela família, os técnicos utilizavam perguntas orientadas, sugestivas e repetidas. Um procurador adjunto depois de se demitir reconheceu que alguns elementos não foram levados para o processo por não corroborarem ou por descredibilizarem a tese dominante ou os seus autores. Anos mais tarde pedopsiquiatras compreenderam que essas memórias podem ser facilmente implantadas, na cabeça dos jovens pelas técnicas de entrevista utilizadas à época. Os testemunhos dos jovens eram suportados por testes médicos que se cria na altura serem correctos. Anos mais tarde chegou-se à conclusão que eram inúteis. Desde então que psiquiatras e órgãos de investigação alteraram os métodos de interrogar crianças e jovens e não passaram, não se repetiram casos destes com esta gravidade nem nos Estados Unidos, nem no Canadá. Em 2005 os jornais davam conta que um antigo aluno, uma das antigas vítimas desmentia totalmente a sua história e afirmava ter mentido para proteger os seus irmãos e agradar aos seus pais.
- Sempre que eu desse uma resposta que eles não queriam perguntavam de novo e encorajavam-me a dar a resposta que eles procuravam, era evidente o que eles queriam, sei o tipo de linguagem que usaram comigo, coisas como eu sou muito esperto, ou podia ajudar outros miúdos que estavam com medo. Sentia que toda a gente sabia que estava a mentir mas os meus pais diziam:
- "Estás a ir muito bem, não te preocupes""
Deste e doutros casos nasce o livro "A Mais Cruel das Tiranias" de Dorothy Rabinowitz - Prémio Pulitzer em 2001 com este livro. Ela afirma que a maioria dos processos desta natureza depende da informação obtida nas entrevistas com os jovens alegadamente abusados. A maior vantagem deste processo é o grau fantástico e de inverosimilhança da informação obtida a partir das crianças, que nem sempre assim é tão espectacular e absurda. Mesmo assim, os relatos foram globalmente considerados credíveis apesar das contradições e fundamentaram 3 pesadíssimas condenações.
Depois de ter estado preso 18 anos, Gerald vem a ser libertado em 30 de Abril de 2004. Quanto à mãe e à irmã, tinham sido revogadas as penas, porque nenhuma foi achada culpada. É considerado um dos mais graves erros judiciários da história norte-americana
Cito o Dr. Sá Fernandes novamente:
"O argumento que "é assim porque é assim" é um argumento insubsistente e provém, desculpem que vos diga, relativamente a esta matéria, da pura ignorância. A mesma ignorância em que eu estava quando comecei este processo, mas em que já não estou hoje e em que, portanto, posso dizer que efectivamente esta situação de haver um conjunto de pessoas que acusam outras ser uma coisa completamente fantasiosa, ser uma fantasia de crianças ou adolescente ou juvenil que acontece (...) não podem intelectualmente utilizar como único argumento das vossas alegações que:
- "As crianças disseram isto, não há nenhuma razão para elas estarem a mentir, vamos acreditar", e pronto, não podem, intelectualmente não podem. É um problema intelectual, não podem. Mesmo que seja esta a vossa convicção subjectiva, não podem, porque as ... nas alegações esgrimem-se argumentos, não se esgrimem convicções. Eu expressei a minha convicção no início das minhas alegações mas disse:
- "Isto é um cumprimento que eu quero fazer ao Sr. Carlos Cruz mas não faz parte das alegações", não faz parte, é um cumprimento. O Dr. Aibéu passou as alegações a dizer:
- "E daqui decorre que eu tenho a certeza que houve abusos nas Forças Armadas", e não sei quê,
- "Eu tenho a certeza", disse para aí umas 6 vezes que tinha a certeza. Ora, eu tenho dificuldade intelectual em perceber como é que o senhor tem a certeza, tenho dificuldade, ainda por cima quando não utiliza argumentos, utiliza apenas as declarações destes jovens, enfim, que valem aquilo que nós vimos que valem, tenho dificuldade intelectual em compreender isso. Nós neste processo temos um elemento comum dos multi-victim, multi-ofender, jovens de uma instituição, aqui a Casa Pia, aqui neste caso, normalmente são escolas, onde as crianças estão juntas, onde há, onde, portanto, onde o contágio e a contaminação é mais fácil."
É curioso rever a entrevista de Ilídio Marques em que diz que "na Casa Pia todos se conheciam... um diz uma coisa e depois todos ficam a saber" (cito de cor).
***
No site www.religioustolerance.org/ra_lewis.htm pode ler-se:
By the mid 1990s, almost all child psychologists, child protective service officials, and police investigators in the English-speaking world had learned of the dangers of traditional but then discredited interviewing techniques when used on young children. They had learned safer methods. Accusations of M.V.M.O. crimes evaporated.
Em meados de 1990, quase todos os psicólogos infantis, funcionários de protecção às crianças, e investigadores da polícia no mundo de língua inglesa, tinha aprendido sobre os perigos das tradicionais, mas então desacreditadas técnicas de entrevista, quando utilizada em jovens crianças. Tinham aprendido métodos mais seguros. As acusações de M.V.M.O. evaporaram-se
Novamente às alegações do Dr. Sá Fernandes:
"Num caso, como é o caso da Casa Pia, que é um caso que abrange pessoas de vários sítios, que não são da Casa Pia, que não, nunca lá foram vistas, que não têm relação circunstancial com aqueles jovens, que se espalham por vários lados, é óbvio que era mais fácil, porque tinha-se o cuidado de ver, de estudar as relações entre as pessoas, de ver os locais e rapidamente isto se despistava, era facílimo, como eu disse era uma coisa que bastava analisar, avaliar as relações entre estas pessoas e avaliar os locais para esta história ficar rapidamente despistada, portanto, era muito fácil. Tinha sido, tinha sido em 2003 muito fácil de deslindar isto (...) como é que foi possível, como é que foi possível que isto tivesse chegado à acusação, como é que foi possível que ninguém tenha parado, tenha batido com o punho na mesa e dito:
-"Alto lá, há aqui qualquer coisa que não bate certo", isso devo dizer que tenho uma enorme dificuldade intelectual em compreender e acho, com toda a sinceridade o devo dizer que isso, à margem desse julgamento, não pode deixar de ser apurada, porque se o comportamento da comunicação social foi um comportamento lamentável mas nós não temos maneira de o julgar porque queremos que a comunicação social continue a ser livre, e portanto, há-de ser a comunicação social a encontrar os seus próprios caminhos de forma a não tornar a repetir o que aqui aconteceu, e portanto, quanto à comunicação social eu só tenho a esperar que corrija, que aprenda com o erro que cometeu e que se auto regule já relativamente ao comportamento do Ministério Público e do Instituto de Medicina Legal, eu como cidadão tenho o direito a reclamar na sede própria que se perceba como é que isto pôde acontecer, porque isto não podia ter acontecido, não podia ter acontecido, porque qualquer pessoa com o mínimo de bom senso, o mínimo conhecimento do que é uma investigação, o mínimo de conhecimento do que é a experiência humana teria que ter, numa fase deste processo, ter batido com o punho na mesa e ter dito:
- "Alto lá, vamos parar, vamos pensar."
***
O Prof Costa Santos realizou todas as perícias físicas. Contrariando os procedimentos adequados, fê-las sozinho.
Em Tribunal declarou: "Porque tínhamos estas limitações, foi decidido, e foi decidido nessa altura também pelo Director - eu diria que sobretudo pelo Director, pelo então Director da Delegação, o Prof. Jorge Soares, por proposta minha - que eu chamaria a mim, enquanto Director de Serviço de clínica médico-legal, a responsabilidade pelas perícias ditas de natureza sexual, e ele nomearia uma psicóloga... Portanto, o recursos humanos na altura eram - eram e continuam a ser escassos, mas na altura eram bem mais escassos do que são agora - tínhamos duas psicólogas e a opção dele recaiu sobre uma delas, a Dra. Alexandra Ansiães, para a realização das perícias sobre a personalidade. (...) mas sobre a minha intervenção nas perícias na totalidade porque fui eu que fiz a totalidade das perícias"
Todos os relatórios são assinados apenas por ele. E guardados por ele. Relatórios que eram escritos vários dias, nalguns casos semanas, nalguns mesmo meses, depois do exame.
Exemplos:
Francisco Guerra - Exame 25.03.03 - Relatório 31.03.03
JPL - Exame 31.03.03 - Relatório 29.07.03
Ilídio Marques - Exame 17.03.03 - Relatório (não tenho a data)
LD - Exame 08.05.03 - Relatório 31.07.03
LM - Exame 10.03.03 - Relatório 19.05.03
PP - Exame 02.06.03 - Relatório 03.06.03
Porquê um período tão longo para entregar os relatórios de JPL, LD, e LM, precisamente os que me acusam?
Estou convencido de que o Prof Costa Santos deu a resposta em Tribunal: "Todavia, neste caso concreto, muito rapidamente começaram a surgir na imprensa, portanto, coisas que era suposto estarem em segredo de justiça, e porque eu não queria de forma alguma que pudesse ser assacada à instituição e, portanto, às pessoas, portanto, o acesso a peças que era suposto estar em segredo de justiça, portanto, assumi eu próprio, portanto, essa responsabilidade de manter comigo, portanto, as... as... os relatórios, os relatórios... bom e os documentos. No fundo, cada um dos processos, manter todos aqueles que me diziam respeito e aconselhando, portanto, naturalmente os colegas a fazerem exactamente o mesmo, para evitar que qualquer peça que porventura pudesse surgir, portanto, na... pudesse surgir, portanto, na imprensa ou qualquer outro órgão de comunicação, portanto, nos pudesse ser imputado e, eventualmente, se tal acontecesse só podia ser responsabilidade de cada um dos peritos e apenas esses e não mais, não mais pessoas da instituição."
Curiosamente, o mesmo Prof Costa Santos violou variadíssimas vezes o segredo a que um perito está obrigado pois deu detalhes sobre o resultado de perícias aos agentes que acompanharam as testemunhas aos exames no INML (clique aqui para confirmar), sem que tivesse ainda sequer escrito o relatório nem analisasse as notas recolhidas nas entrevistas. E, ao fazê-lo, estava a contribuir para a possibilidade do segredo de justiça ser violado. Os agentes da PJ transmitiram por escrito aos seus superiores o teor da conversa, descrevendo que Jorge Costa Santos lhes relatara que as perícias (físicas) confirmavam o que as testemunhas teriam dito nas suas inquirições (!).
Ora, não tendo o médico perito conhecimento das declarações prestadas à PJ, como poderia fazer essa afirmação?
E assim, foram sendo publicadas dezenas de notícias (supostamente em segredo de Justiça) apontando que as perícias confirmavam que os abusados tinham sido vítimas daqueles arguidos. O que, além de ser falso, não viria a constar das conclusões finais.
Texto igual para todos para dizer que há sinais "compatíveis" com a prática repetida de coito anal e para afirmar (com excepção de JPL) que o relato também é "compatível" com essas práticas. Um perito não pode escrever isto. (v. parecer do Prof Pinto da Costa, mais abaixo).
Além de que, sendo que "compatível" não é prova. Porque pode ser "compatível" com outras causas, inclusive relacionadas com a própria saúde do observado: lesões hemorroidais, fezes duras, intervenções cirúrgicas, etc. Ora, isso não foi despistado e rapidamente poderia tê-lo sido.
Por outro lado, e muito importante: essas práticas não podem ser datadas e muito menos poderão ser aceites como válidas para actos praticados em 1999 e 2000, isto é, 3 e 4 anos antes!
O próprio Prof. Costa Santos teve que o admitir em Tribunal:
Professor Costa Santos - Não, não Sr. Dr.. Portanto, nós em rigor em rigor, só podemos estabelecer, portanto, um diagnóstico temporal baseado, portanto, no limite dos dez dias. Até aos dez dias que é o tempo, o tempo médio de que estas lesões... salvo... há sempre casos que fogem á regra mas, quer dizer, o tempo médio de cicatrização das lesões, portanto, é até dez dias. Portanto, até dez dias é recente; para além dos dez dias é não recente. A gravidade das lesões, isto é, o maior ou menor apagamento das pregas, a existência de fissuras persistentes, a hipotonia ou até, nalguns casos grave hipotonia para não dizer tonia, portanto, do esfíncter anal, a caracterização da mucosa, são esses elementos é que nos permitem dizer que houve uma situação repetida, não podendo dizer se foram sete, dez, quinze, vinte, trinta vezes e se ocorreram durante um, dois, três ou quatros anos, quer dizer, portanto. Tão só isso.
É impossível afirmar, ou concluir, se abusos ocorreram há mais de um ano (as «perícias», no máximo, indicam relações sexuais recentes e/ou continuadas). É falso afirmar que estas ocorreram 2, 3, 4, ou 5 anos atrás. Uma perícia com essa conclusão não pode ser aceite, porque é falsa. Não há qualquer base científica que possa legitimar essa afirmação. (V. Prof Pinto da Costa, mais abaixo.)
Aliás, a aceitarmos essa conclusão, será legítimo questionar sobre a origem das "lesões". Porque, por exemplo:
Francisco Guerra - pode ter sido abusado no Lar Evangélico do Porto, por Carlos Silvino, pelo educador Leonardo e no quadro de situações ligadas aos bairros da Boavista e do Zambujal.
JPL poderá ter sido abusado no processo do Mike.
LM - A análise sobre as perícias feitas a LM interessam-me particularmente já que o Tribunal me condenou por dois crimes (Av. Forças Armadas), que nunca aconteceram, na pessoa deste rapaz. (Clique aqui)
Ilídio Marques - Terá sido abusado pelo padrasto.
LD - Refere ter sido longamente abusado por Carlos Silvino. Não se conseguiu identificar o amigo para cuja casa ia frequentemente ao fim de semana. Está referenciado como autor de eventuais abusos sobre colegas mais novos.
PP - no INML, refere ter sido vítima de abusos por parte de um vigilante da Casa Pia.
MP - terá sido abusado no processo do Mike.(MP não foi sujeito a perícias)
As perícias físicas são mais um elemento perverso deste Processo. Possivelmente sê-lo-ão noutros processos onde os advogados não estudam, não investigam, não aprendem nem esclarecem.
Tive a sorte da minha defesa estar nas mãos de advogados que, lutando pela Verdade, não aceitaram passivamente a acção de um IML sentado no trono do monopólio, sem escrutínio de ninguém. E demonstraram que, também nesse pormenor, "o Rei vai nú". O Ministério Público tem no IML um "aliado" e este Tribunal não quis aceitar a completa falta de credibilidade destas perícias.
Por isso, o Dr. Sá Fernandes, questionou o Prof Costa Santos. As respostas deste, percebe-se a sua defesa do trabalho que fez. Mas demonstrou toda uma fragilidade que, a muito custo, acabou por vir ao de cima:
Professor Costa Santos - Portanto, a questão prende-se com a credibilidade das declarações, do relato, se quisermos. Essa é que é a questão nuclear. A questão da veracidade foi introduzida aqui, penso que por desvio de interpretação de algo que tem a ver com o facto de seguirmos protocolos e seguirmos guide lines, se quisermos, regras ou recomendações de actuação, como o SVA, que é o Statement Validity Analisys, que fala da validade das declarações, o facto de existir também algo que para nós é uma referência, e é uma referência de há muito tempo, que é o SRA, o Statement Reality Analisys, e quando se fala aqui em Statement Reality Analisys, da análise da realidade do depoimento, das declarações... E o facto de estas... de se ter feito, porventura... A colega Alexandra Ansiães aqui, por... por manifesta... por manifesta... Nunca tinha sido colocada sobre esta questão, sobre esta questão concreta, terá feito uma extrapolação, eu diria, quase literal daquilo que é a linguagem anglo-saxónica e daí ter utilizado a validade, mas é evidente que nós não validamos testemunhos, não validamos declarações..."
No que toca à Drª Alexandra Anciães, nunca poderia ter feito as perícias psicológicas. Mas isso veremos no capítulo dedicado a esse tema e que é ainda mais grave.
"Dr. Ricardo Sá Fernandes - Portanto, quando o Sr. Prof. nos seus relatórios, conclusão segunda, refere a coerência, a congruência do relato - segundo eu percebi, ou segundo eu avaliei - isso teve a ver com a avaliação da capacidade dos rapazes deporem, com o seu juízo critico, ausência de alucinações, de ilusões. E, quando se refere à coerência, à congruência do relato, aqui não está a incluir qualquer referência às pessoas que no meio desse relato surgem identificados como agressores?
Professor Costa Santos - Não. Exactamente. Portanto, é uma avaliação global.
(...)
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Sim senhor. Sendo assim, a pergunta que lhe coloco a seguir é a seguinte: A posição da defesa do Sr. Carlos Cruz nestes autos é a de que admite como muito provável que estes jovens tenham sido objecto, pelo menos a maioria deles, de abusos de natureza sexual, práticas anais repetidas, mas o Sr. Carlos Cruz diz "...Mas eu não fui!! Não os conheço, não tive nenhumas relações com eles! Eu não fui!" E depois, exerce a sua defesa, explicando que não poderia ser, que, inclusivamente, nas datas em que se lhes atribuem, não podia, enfim, a explicação que é do domínio público. A pergunta que eu ponho ao Sr. Prof. é a seguinte: Esta defesa que o Sr. Carlos Cruz faz, se amanhã o Tribunal vier a aceitar isto como bom, isto é perfeitamente compatível com os seus relatórios?
Juíza Presidente - Sr. Dr. não considero que essa questão, pelo menos para o Tribunal, seja pertinente colocar ao Sr. Prof. O senhor perito faz determinada perícia, diz o que diz...
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Não Sra. Dra. isto é muito importante. O facto do Sr. Carlos Cruz não ser o abusador, isso é compatível com o que o senhor diz nos seus relatórios?
Juíza Presidente - Sr. Dr., está esclarecido. O senhor perito disse que não foi à procura e não faz parte do objecto desta perícia encontrar autores.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Sra. Dra. desculpe. A Sra. Dra. deixa-me fazer esta pergunta, porque a seguir há outra pergunta que se segue a esta.
Juíza Presidente - Então, vou deixar. Se há uma pergunta dependente dessa vou deixar, apesar de a achar, do ponto de vista do Tribunal, talvez irrelevante.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Sra. Dra., a resposta parece óbvia mas...
Juíza Presidente - Pode responder, Sr. Prof.
Professor Costa Santos - Eu diria que é compatível. Que é compatível, quer dizer, é evidente que tenho outras razões e não queria estar aqui a individualizá-las, porque um dos elementos que utilizámos - eu próprio utilizei - para aferir, digamos assim, dos vários relatos, era o cruzamento da informação, a forma como era feita...
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Sr. Prof., é compatível?
Professor Costa Santos - Pronto! Se a pergunta é feita assim, em termos de sim ou não, portanto, é compatível.
Não se sabe que tipo de informação foi "cruzada" pelo Prof Costa Santos já que ele afirmou que não tinha acesso a informação prévia sobre o Processo e que não tinha tido qualquer contacto com o trabalho da sua colega Anciães. Nem valia a pena porque esta confessou que pediu essa informação mas que não lhe foi facultada.
(...)
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Sra. Dra. para mim é obvio que a resposta a esta pergunta deve ser que a Sra. Dra. imagina que eu acho que deve ser. Mas eu quero que isso fique claro, Sra. Dra. Com estas perícias...
Juíza Presidente - Com estas perícias, há alguma capacidade do ponto de vista técnico, do ponto de vista pericial para determinar se foi algum destes arguidos a praticar os eventuais actos repetidos de coito anal?
Professor Costa Santos - Individualmente, portanto, perícia a perícia, pessoa a pessoa, portanto, não são discriminativos.
(...)
Dr. Ricardo Sá Fernandes - O Sr. Prof., portanto, já disse agora... Ele omitiu o nome do Sr. Carlos Cruz quando refere a casa de Elvas; pode ser a tal postura defensiva e reticente, ou pode ser, pura e simplesmente, porque estava a mentir?
Professor Costa Santos - Sim. Eventualmente, sim.
Dr. Ricardo Sá Fernandes - E o Sr. Prof. - parece-me também evidente - ...pode apresentar as duas alternativas, mas não se pode decidir nem por uma, nem por outra? Nem tem nenhuns elementos para dizer que é mais provável uma ou mais provável outra? São as duas possíveis?
Professor Costa Santos - Exactamente, Sr. Dr. Foi o pedido que me fez. Foi que aventasse possíveis explicações. Foi o que eu fiz.
(...)
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Sr. Professor mas se para explicar esta flutuação se é erro se, se é mentira, isso o Sr. Professor não pode dizer se é uma coisa se é outra? Não tem elementos para poder concluir uma coisa ou outra?
Professor Costa Santos - Portanto, elementos científicos não tenho. Portanto, é evidente que não...
(...)
Dr. Ricardo Sá Fernandes - (...) Ora a pergunta que eu lhe coloco é a seguinte, porque isso decorre designadamente deste texto: sucessivos interrogatórios por pessoas que não têm do ponto de vista forense nas, relativamente a abusos, os meios e os conhecimentos para fazer as tais abordagens multidisciplinares, esses sucessivos interrogatórios são ou não são susceptíveis de condicionar, inquinar, diminuir a credibilidade, afectar de alguma forma aquilo que depois estes jovens fazem nos discursos, mesmo que espontâneos, que fazem perante os peritos, ou no tribunal?
Professor Costa Santos - É, bom eu creio ter respondido já a essa questão anteriormente, quer dizer, portanto, a resposta é afirmativa. Portanto, eu disse, e disse-o em tempo, que a repetição de interrogatórios pelos mais diversos técnicos, e fi-lo creio que logo na primeira audiência, portanto, em que participei, portanto, é susceptível de contaminar o discurso, de levar, portanto, as pessoas a preencher, portanto, determinado tipo de lacunas de memória que tenham. Portanto, eu diria que essa contaminação é quase inevitável. (...). Eu diria que isso tem a ver com técnicas de interrogatório.(...)
(...)
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Portanto, a questão é esta: como cientista como especialista nesta matéria se o Sr. Dr., o senhor perito fez uma, uma perícia médica legal de uma determinada natureza, o contexto já descreveu, não o vamos repetir, agora, se como cientista considera ou não, como perito considera ou não, que se tivesse, que não foi aquilo que o senhor fez, mas que se tivesse que avaliar hoje a credibilidade das imputações que estes rapazes fazem a estes homens que estão sentados atrás de si, se o senhor como cientista tivesse que fazer essa avaliação, tinha ou não tinha que ver, designadamente para ver que tipo de inquinações, de contaminações é que tinha havido, a panóplia das inquirições a que eles foram sujeitos desde o princípio? Se isso é ou não é, se isso era ou não era útil para que o senhor pudesse concluir se tinha havido inquinação ou não?
Professor Costa Santos - Bom, se é importante ou não, não sei, não faço ideia porque não sei o, não conheço o processo, como é evidente, não sei se é importante, quer dizer. Que seria porventura útil e até desejável ter acesso a outro tipo de informações, isso mantenho o que disse desde o princípio: com certeza que sim. Quer dizer, portanto, a importância, bom, essa advém do teor naturalmente de peças processuais que ignoro totalmente, portanto, que poderá ter...
Dr. Ricardo Sá Fernandes - Em teoria seria útil e recomendável?
Professor Costa Santos - Portanto, em teoria seria útil e recomendável porque de facto nestas coisas, portanto..."
O IML não teve acesso aos interrogatórios feitos pela PJ. E teria com certeza reparado que essas declarações dos assistentes continham variadíssimas contradições com o que disseram aos peritos. E isso, está nos livros, é um sinal de que, muito provavelmente a testemunha está a mentir.
O Prof. Costa Santos, teimosamente, deu respostas onde se percebe uma certa ambiguidade. Ele não podia negar as conclusões que tinha escrito nas perícias. Ele estava ali para defender os seus próprios erros, o seu trabalho. Mas também não podia fugir ao fundamental que as questões do Dr. Sá Fernandes colocavam.Enfatizo: as perícias físicas efectuadas por Jorge Costa Santos, dando como verdadeiros os relatos e as alegações de abuso sexual das testemunhas, não têm qualquer base científica.
O Prof. Conchero Carro, professor de Medicina Forense da Universidade de Santiago de Compostela, um dos mais prestigiados professores de Medicina Forense do mundo, é peremptório: «O perito forense não pode valorar a fiabilidade do que paciente diz. Isso nunca se faz. O perito pode quanto muito perguntar sobre os seus hábitos sexuais mas não pode dar fiabilidade ao seu testemunho».
É que trata-se de uma perícia física. O resultado deve ser baseado em factos concretos e físicos. Caso contrário, estamos na presença de uma mistificação
Para terminar, o parecer do Prof. Pinto da Costa.
Em resumo:
1-As perícias foram mal feitas
2-Uma perícia não pode identificar o abusador
3-O perito não pode avaliar a credibilidade (e muito menos a veracidade) de um examinando
4-Uma perícia não permite datar um abuso mais antigo do que (com boa vontade) um ano
5-As perícias foram feitas 3 anos depois dos eventuais abusos
6-As perícias falam em "compatibilidade" com a "prática de sexo anal" mas não referem que outros factores poderão ser a razão do que se encontrou no exame
Nota Final: o Prof. Costa Santos viria a ser promovido posteriormente a Director da Delegação de Lisboa do IML.
Em 28 de Fervereiro de 2008 o Correio da Manhã publicou a seguinte notícia:
Hoje, dia 6 de Junho de 2011, a Revista Única, do jornal Expresso, publica uma longa entrevista feita por Clara Ferreira Alves. Ao lê-la, nada me surpreendeu: o Dr. Sá Fernades revela-se não apenas como Advogado brilhante que é, mas, muito mais do que isso, um cidadão que ainda acredita possível Portugal vir a ser um Estado Direito, em que a Justiça seja um valor primeiro, um alicerce indispensável. Mas também reconhece que a luta não é fácil, num país onde a sociedade civil se entregou nas mãos dos "donos" dos nossos destinos.
Acho que não devo acrscentar nada mais. Compete ao leitor ler, reler, ler novamente e reflectir, questionando-se naturalmente sobre o futuro que, de adiamento em adiamento, vai deixando desfazer-se em pó o tecido social Português.
Estas declarações já aqui estiveram mas em formato Word o que permitiria a qualquer pessoa alterá-las. Assim, resolvi colocá-las de novo mas agora em formato PDF. Basta clicar no nome do ficheiro para o abrir
Finalmente já se pode encomendar o Livro de Richard Webster "Casa Pia - A construção de uma caça às bruxas Europeia moderna".
É uma análise e uma teoria de um autor que já dedicou anos ao estudo deste tipo de fenómenos, tendo mesmo sido o grande responsável pelo desmontrar a inocência de um casal que tinha sido vergonhosamente condenado pela opinião pública e, como consequência da pressão da mesma, pelo tribunal.
Aconselho a visitar o site de Richard Webster para mais e melhor informação
ou
Este segundo site é também o contacto para encomendar o livro. Não tente clicar nas fotos. Use um destes dois sites- As ilustrações só contêm informação, não são interactivas-
Finalmente, uma observação: eu não conhecia Richard Webster. Nem conheço. Ao longo deste processo (publicação do livro) trocamos apenas alguns mails nomeadamente para lhe fornecer documentação para ele conferir com a de outras fontes. Richard Webster, pela sua honestidade e pelo prestígio da sua obra, jamais publicaria qualquer coisa que ele não confirmasse por mais de uma via. A primeira vez que me escreveu foi em 30 de Setembro de 2010. Confessava-se "abismado" com a sentença e afirmava que tinha pronto um artigo de 7.000 palavras para publicar no seu site. Só que, à medida que ia investigando e juntando as peças, o artigo foi crescendo e transformou-se num livro: o que agora está à vossa disposição. E por tudo isso, estou completamente à vontade para recomendar a sua leitura. Ele ajuda muito a entender como se pode ter chegado onde se chegou no Processo Casa Pia.
Esta é uma leitura de alguém intelectualmente sério, que conhece estes fenómenos, e que não alinhou com o clima de histeria colectiva artificialmente construído em Portugal.