Autor:         Octavio Lopes
        Data:          07.09.2003
        Publicações:    CORREIO DA MANHA

Pedro Namora já informou o DIAP: RITTO USAVA OPERADORES DE CÂMARA DA RTP 

Jorge Ritto utilizava operadores de câmara da RTP nas filmagens de actos pedófilos com alunos da Casa Pia", disse ontem ao CM o advogado Pedro Namora.

Bagão Félix, ministro da Segurança Social e do Emprego, garante que não tem provas para agir a propósito da alegada reprodução do relatório da sindicância à Casa Pia.

"Essas informações foram-me prestadas por antigos casapianos que além de frequentar os apartamentos do embaixador e de outras pessoas encontravam depois os funcionários da RTP a trabalhar nas touradas do Campo Pequeno, onde serviam de figurantes, como pagens", acrescentou Pedro Namora, frisando já ter relatado ao Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) o que lhe foi dito por antigos alunos da Casa Pia que participaram nas filmagens.

Ainda segundo Pedro Namora, nas décadas de 70 e 80, os alegados pedófilos prometiam aos jovens casapianos - com idades entre os 7/8 e 12/13 anos - que se participassem nos filmes, seriam "famosos". "Diziam-lhes que iriam sair na capa das revistas", observou, sublinhando que além da casa de Jorge Ritto, houve antigos alunos que asseguraram ter participado em filmagens em apartamentos de Lisboa, Campo Pequeno, e Azeitão.

Pedro Namora adiantou, ainda, que tais filmagens podem ter continuado a suceder ao longo dos anos 90 - "Não tenho a certeza disso, mas essa é uma questão que deve ser investigada" - e que os ex-alunos confidenciaram-lhe também que encontraram nas filmagens um repórter que trabalhou quase toda a sua vida na RTP e que já faleceu.
A utilização de meios técnicos e humanos da televisão pública nas filmagens da pedofilia com alunos da Casa Pia, nas décadas de 70 e 80, foi divulgada ontem pelo jornal 'Expresso' (ver outra peça).

RTP PROMETE AGIR
Almerindo Marques, presidente do conselho de administração da RTP, esteve ontem à noite no Telejornal e prometeu que vai investigar a situação. "Em primeiro lugar devo dizer que jamais ouvimos falar disto. Jamais detectámos, identificámos e encontrámos qualquer documento ou referência a este tipo de questões."

Almerindo Marques lembrou, de seguida, que as "ocorrências" relacionadas com a filmagem de actos pedófilos aconteceram há "pelo menos, duas dezenas de anos". "A terem ocorrido quaisquer dos factos, a sua autoria seria de alguns trabalhadores da RTP, com fortíssimas possibilidades de serem pessoas" que já deixaram a empresa.
E acrescentou que "não faz sentido algum associar este tipo de factos com a instituição RTP". "A instituição é autónoma e independente de um comportamento, qualquer que ele seja de errado, de um ou outro dos seus trabalhadores."
A concluir, o presidente do conselho de administração da RTP assegurou que vai tentar "apurar toda a verdade". "Para isso, vamos agir em conformidade e desde logo com completa disponibilização para as entidades judiciais competentes. Em função do que vier a ser apurado, a administração agirá sempre, porque em termos de gestão esses factos não têm prescrição. Se houver lugar a procedimentos disciplinares, seguramente que agiremos."

'NÃO FIQUEI SURPREENDIDA'
Ana Paula Valente, amiga de Carlos Silvino, assegura que o ex-funcionário da Casa Pia nunca lhe falou sobre a utilização de meios técnicos e humanos da RTP "em filmagens da pedofilia". "De qualquer maneira, não fiquei surpreendida com essa notícia, dado que na altura em que foi divulgada a história do sósia do Carlos Cruz - o ex-funconário da RTP, Mário Ruivo - a directora do jornal 'Independente', Inês Serra Lopes falou das filmagens que eram feitas por pessoal e câmaras da RTP. Essa senhora disse-me, até, que algumas filmagens decorriam no Teatro Vasco Santana, na Feira Popular e que era o senhor Mário Ruivo que fazia as filmagens, dado andar sempre com uma câmara de origem soviética".
A amiga de Carlos Silvino, adiantou, ainda, que, mais tarde, voltou a "ouvir falar nos filmes dos pedófilos" num encontro com antigos alunos da Casa Pia.

'NADA TENHO A VER COM ISTO'
Mário Ruivo, ex-funcionário da RTP, assegurou ao CM que nunca tinha ouvido falar na participação de meios técnicos e humanos da televisão estatal nas filmagens de actos pedófilos com alunos da Casa Pia.
"Eu não tenho nada a ver com isto. Não sei de nada. Nunca participei em nada disso", referiu o ex-chefe do sector de imagem da RTP, acrescentando: "Essa notícia está a ser uma grande surpresa para mim." Mas Mário Ruivo, que chegou a ser apontado com sósia de carlos Cruz, lembra que nos 31 anos que trabalhou na televisão pública, entre 1957 e 1988, conheceu alguns casapianos. "Ainda hoje lá trabalham alguns ex-alunos."
A concluir, Mário Ruivo assegura que nunca conheceu um operador de câmara com uma prótese numa perna, que participaria, segundo o 'Expresso', nas filmagens da pedofilia.

CT APONTA O DEDO ACUSADOR A EX-FUNCIONÁRIOS DA RTP
Na sequência do comunicado da Comissão de Trabalhadores (CT) da RTP, que exigem uma investigação imediata e rigorosa, sobre o alegado envolvimento de alguns ex-trabalhadores da televisão de serviço público no processo da Casa Pia, o CM apurou que algumas das pessoas visadas pela CT saíram da empresa com indemnizações de 200 a 300 mil euros (40 a 60 mil contos) e que uma delas chegou a ocupar um cargo directivo.

Segundo três elementos da CT da RTP contactados pelo CM, os ex-funcionários estão devidamente identificados. "Há casos sobre os quais há suspeitas de comportamentos indecorosos a vários níveis. Nós não sabíamos que era pedofilia. Mas é um grupo que identificámos após a notícia publicada pelo semanário "Expresso". Já não trabalham na RTP e saíram com indemnizações elevadas", declarou um dos elementos da CT, sublinhando não poder afirmar que "esses funcionários são pedófilos".

"Apenas podemos dizer que tiveram comportamentos indecorosos e que, no entanto, lhes pagaram altas indemnizações", sustentou a mesma fonte.

Além disso, segundo este elemento da CT, um dos ex-trabalhadores em causa "andou a distribuir cassetes pornográficas a alguns funcionários e não teve qualquer processo disciplinar . "Saiu da RTP com 200 mil euros de indemnização", acrescentou referindo-se ainda ao facto de não se saber quantos ex-funcionários estarão envolvidos. "Por isso pedimos uma investigação, porque temos a certeza que ainda existem ramificações no presente. Mesmo que já não o façam passaram por lá", concluiu.